Sabe Portugal dar a devida importância à sua dimensão Atlântica? Essa a pergunta de partida do painel «Porque Importa o Atlântico» da II Grande Conferência do Jornal da Economia do Mar, com Orientação de Duarte Lynce de Faria e a contra-argumentação de Filipe Porteiro e Ara de Oliveira.

Porque só se pode reivindicar o que se conhece, não importa, antes de mais, mapear o Atlântico que ainda não se conhece?

E reivindicar apenas por reivindicar ou para maior coesão territorial, para saber quanto importa preservar, preservando-o efectivamente, também para maior e mais completa afirmação de soberania nacional?

Aprovado em 2006 o Anexo V da Convenção OSPAR, impondo significativo ênfase na necessidade essencial de preservação dos recursos marinhos, mesmo para além das 200 mn, não tem Portugal, perspectivando uma área sob jurisdição nacional de 4 milhões de Km2, deslocando tão decisiva quanto definitivamente o seu centro de gravidade bem para dentro do Atlântico, por maior obrigação saber preservar, proteger e explorar tal situação, até em nome de uma nação tão mais forte quanto mais coesa?

Desenhas as linhas de orientação, não sem o quê de provocação, por Duarte Lynce de Faria, não deixaria Filipe Porteiro, Director Regional do Mar do Governo Regional da região Autónoma dos Açores, falando lá do Centro Geopolítico e Geoestratégico do Atlântico, ponto crucial, ao longo da história,  de múltiplos ciclos de migração, de rotas comerciais muitos sucessivos ciclos de desenvolvimento, colocar toda a ênfase na resposta actual da Região a essas exactas questões, transpostas e assumidas, de facto, também como os seus grandes desafios da actualidade.

Nesse enquadramento e antes de mais, sim, a primordial importância do Ambiente que se expressa e se projecta em múltiplas dimensões, não deixando de respeitar, uma primeira e mais imediata, quase se diria, naturalmente, à preservação dos recursos, de todos os recursos, não apenas também numa visão algo estática, fechada e circunscrita, mas aberta e alargada no espaço, na substância e no tempo.

Aberta e alargada no espaço porquanto não há, na natureza, e mais ainda no mundo do mar, com o seu perpétuo e até paroxístico movimento, da mais patente superfície até às mais abissais profundidades, não há nunca separação efectiva mas sempre continuidade de acção e não sem a mais vasta e talvez nem sempre previsível ou determinável consequência.

Aberta e alargada na substância porquanto, estando sempre a falar de seres por definição vivos, sempre impossível também tudo fixar numa perfeita imutabilidade eventualmente sem sentido nem talvez razão.

Aberta e largada no tempo porquanto quanto se herda não é apenas de ontem nem quanto se pretende deixar será apenas para amanhã.

Tradução prática?

Visão e consequente acção para determinar a primeira Área Marinha Protegida além das 200 mn, como o campo hidrotermal do Rainbow, bem como o envolvimento num projecto  como o Midas para estudo dos potenciais impactos de uma previsivelmente futura actividade de mineração dos fundos marinhos, antecipando, ao contrário do que é habitual, problemas e consequências, podendo assim prevenir-se adequadamente situações negativas, conduzindo, por exemplo, a perceber a necessidade de aumentar a dimensão das Áreas Marinhas Protegidas uma vez o actual desenho e respectiva dimensão não garantirem a preservação das mais vastos efeitos negativos dessa futura actividade, evitando assim também estar sempre «a correr atrás do prejuízo», como soe dizer-se, tal como é habitual, pouco mais se podendo fazer então senão tentar mitigar quanto surge já como facto consumado, ou ainda para investir, mesmo no âmbito da União Europeia, no transição para combustíveis mais limpos, como o gás natural, investindo no projecto de colocar a Região como uma novo entreposto oceânico no fornecimento de GNL Marítimo.

Sim, os Açores têm também sido algo esquecidos, bastando talvez lembrar que, estando englobada numa área em que são aplicados múltiplos modelos genéricos para estudo dos oceanos, não há ainda um modelo específico para a Região, mas também por isso, o que agora importa não lamentar o passado mas avançar para uma novo ciclo de Observação da Terra e dos Oceanos, investindo na investigação para uma maior conhecimento do Atlântico, uma vez mais, nas suas múltiplas dimensões.

O Atlântico que, na expressão de Ara de Oliveira, Sub-Director do Mar do Governo Regional da região Autónoma da Madeira, não deixa de ter sempre uma certa carga mística, imposta desde os mais imemoriais dias de Platão quando falava das Ilhas Afortunadas para além das Colunas de Hércules, ou mesmo mais recentemente, Darwin, sempre mais expansivo em relação à Madeira do que em relação aos Galápagos, para já não falar das evocações da velha Atlântida na ficção de Júlio Verne, dando assim uma aura de mistério e fascínio à macaronésia que a Macaronésia nunca perdeu e nunca haverá, espera-se, de perder.

Para Ara de Oliveira, a designada Economia Azul, não é propriamente nada de muito novo, não deixando os meios tecnológicos de serem, porém, outros, bem como as dotações financeiras, como bem espelhado na Políticas Comum, inclusive, algo bem distinto do passado também.

De qualquer modo, importa não esquecer nunca também a realidade. E a realidade é a demografia: 5 biliões em 1990, 7 biliões hoje, 7 biliões em 2050.

Com novos desafios também: alimentação, energia, economia e, evidentemente, Ambiente _ que importa, acima de tudo, saber preservar, como a Madeira sempre o soube fazer também.

Qual a primeira área Protegida de Portugal’

As Selvagens, naturalmente, embora pouco pareçam ter ado ou darem, ainda hoje, por isso.

Portugal olha pouco para o Atlântico, de facto, esquecendo mesmo que, sem Ilhas, sem Açores e sem Madeira, a actual área de ZEE, próxima dos 2 milhões de Km2 se transformava rapidamente numa área de apenas 300 mil Km2. E não é apenas uma questão de área, é também uma questão de economia, de soberania.

Mas Portugal tem também tendência a autoconfinar-se. Diz-se agora que Portugal é Mar quando Portugal não é mar, é Oceano, cousa muito diferente.

E tem também uma certa tendência para menosprezar as Ilhas esquecendo, por exemplo, que as Canárias, só as Canárias, têm mais camas que Portugal inteiro, 400 mil, 12 milhões de turistas por ano, com o Porto de ls Palmas a rivalizar com Leixões.

Não, a Madeira não são as Canárias. Felizmente. Mas sempre tiveram um papel determinante na expansão de Portugal e sempre souberam aproveitar todas as oportunidades, desde saberem ter sido um importantíssimo entreposto comercial a terem sabido também transformar-se no maior produtor de açúcar da Europa, como sabendo também, mais tarde a transplantar  a mesma tecnologia e o respectivo conhecimento para o Brasil e mesmo para África, como, não sendo hoje as Canárias, não deixaram de saber ser igualmente o primeiro destino turístico organizado da Europa, como souberam desenvolver a cultura do Vinho da Madeira, ligado até à independência dos Estados Unidos por ter sido com o mesmo que o respectivo brinde de celebração do acto foi feito, até à criação única dos Bordados da Madeira, para já não se referir a arte de receber, levando a milhares de Portuguese, de todas as regiões a acolherem-se aí para sempre, como muitos estrangeiros, não sendo somenos, no caso, evidentemente, os serviços de excelência que a Madeira soube igualmente desenvolver.

Tem um problema de limitação de espaço?

Tem, mas tem muitas outras virtudes também, como a sabedoria para desenvolver indústrias como a das comunicações, redes, de cabos submarinos e até de monitorização de satélites, existindo mesmo um Centro de Comando que controla 27 satélites e que poucos conhecem ou sabem sequer da existência, como hoje tem vindo a desenvolver um novo ciclo ligado ao mar e à designada Economia Azul, inovando e impondo um ritmo que poucos ter-se-ão já apercebido também, sem esquecer igualmente a primordial preocupação com o Ambiente que tem sido, de facto, um dos elementos chave do novo ciclo.

Porque quando se fala da Madeira sempre, de um modo ou outro, vamos dar ás Selvagens, comecemos, uma vez mais por aí.

Ao contrário do que, por vezes se fala, no que respeita às disputas com Espanha, está tudo sereno mas importa, também aqui, na primeira Área Protegida de Portugal, nunca esquecer as questões relativas ao Ambiente, até por uma questão de soberania.

Ainda recentemente, uma equipa do National Geographic Magazine este a filmar nas Selvagens, referindo-as como um lugar pristino. Algum exagero, sem dúvida, como se hoje houvesse algum lugar pristino na terra mas, independentemente disso, importa, sem dúvida, preservar, tão imaculadamente quanto possível essa área única, mas sem esquecer outros valores também, como, naturalmente, até os económicos.

Por isso mesmo, desde a recente instalação de um Posto da Polícia Marítima para trabalhar em conjunto com os Guardas das Conservação da Natureza, na vigilância da área, há agora projectos de circunscritas iniciativas de turismo científico, extensíveis às Desertas, bem como da possível instalação de um Centro de Observação das Correntes do Atlântico, uma vez encontrarem-se as Selvagens no ponto de conjugação de das águas do Mediterrâneo, Atlântico Norte e Atlântico Médio.

Nesse mesmo sentido, não esquecendo também nunca como é o Atlântico um dos mais ricos ecossistemas do planeta, a Madeira tem vindo a dar igualmente um particular atenção ao ordenamento do espaço marítimo, sem esquecer, uma vez mais, os aspectos económicos, existindo já aprovadas para o domínio público marítimo, o que não significa licenciamento, um número de candidaturas que ultrapassa em 450% a capacidade instalada actualmente, esperando-se chegar ao fim do processo com um aumento mesmo na casa dos 1 000%.

Por outro lado, em termos de licenciamento, um pedido, desde que devidamente instruído, é passível de obter uma aprovação em cerca de 4 meses, havendo já múltiplos projectos de Portugueses, Canadianos e Noruegueses aprovados, sobretudo na área da aquacultura, afirmando a já a Madeira neste domínio também como campeã nacional na produção de pescado.

A questão agora, uma vez escasseando o espaço na costa, reside na possibilidade de desenvolver mais a aquacultura em mar aberto, um desafio tanto de ordenamento quanto tecnológico.

A par disso, áreas que se têm vindo desenvolver-se particularmente, respeitam também à biotecnologia, sobretudo em projectos de produção de micro e macroalgas, bem como se começa também a dar início a outros projectos de desenvolvimento de processos e produção de produtos de origem marinha, sendo legítimo começar a ambicionar mesmo a constituição na Região de um verdadeiro complexo na área da biotecnologia marinha.

No domínio da energia, para além do projecto exemplar da Gaslink relativo ao Gás Natural, há também novos projectos em desenvolvimento no Norte da Ilha da Madeira e Norte de Porto Santo, de energia eólica em mar aberto, bem como energia das correntes.

Tudo isto sem esquecer o continuado desenvolvimento de novas Áreas Marinhas Protegidas que exigem muito trabalho, muita investigação e significam também economia.

Mas há também uma questão que não é possível esquecer, ou seja, que tudo quanto tem sido feito não seria possível sem uma perfeita articulação e cooperação com os privados, o que levou igualmente Ara de Oliveira a deixar também um pedido á Administração Central em particular e a toda a Administração Pública em geral, ou seja, a de não obstruir essa mesma sã cooperação sob pena de se estar a colocar em casa não apenas este ou aquele projecto mas toda a nação, comprometendo-se mesmo o futuro uma vez alguns desses processos serem irreversíveis, constituindo-se, nesse caso, eventualmente, mesmo como crimes de lesa-pátria.



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