AVARIAS MARITÍMAS III Regras Iorque-Antuérpia

Hoje iremos continuar a falar das Regras de Iorque-Antuérpia, vamos analisar alguns dos aspectos mais importantes e falaremos apenas das Regras na versão 1994 que são as mais utilizadas até hoje, apesar de não serem as mais recentes.

Conforme já dito na edição anterior do Jornal as Regras Iorque-Antuérpia não são obrigatórias, não é uma Convenção. Por conseguinte apenas são aplicáveis se forem incorporadas no ordenamento interno ou por acordo das partes nos contratos. Aplicam-se também enquanto usus do comércio internacional.

Regulam as avarias grossas prevalecendo sobre qualquer lei ou pratica quando aplicadas.

As Regras são compostas por regras numeradas e alfabéticas, sendo que as regras numeradas prevalecem sobre as alfabéticas. Existem 7 regras alfabéticas e 22 numeradas. As primeiras, as alfabéticas, formam a base das regras das avarias grossas e as numeradas funcionam como notas explicativas de como as regras alfabéticas devem funcionar.

Começaremos portanto por analisar as regras alfabéticas, por serem regras base que regem as avarias grossas.

Regra A- define como acto de avaria grossa o sacrifício ou despesa extraordinária, razoável e intencional feita para a segurança comum com o objectivo de proteger de um perigo de mar a propriedade envolvida na aventura marítima comum.

Nesta noção constam os requisitos para que um acto seja considerado avaria grossa. Tem de ser sacrifício ou despesa, tem de ser extraordinário, voluntário e intencional; ser feito em prol da segurança comum do navio e da carga e na aventura marítima comum. Caso contrário não é avaria grossa.

De referir apesar de não constar na noção, o sacrifício e as despesas têm de ser razoáveis, caso não sejam o excesso não integra a avaria grossa, ficará de fora, não havendo contribuição das partes.

Regra B- Existe uma aventura marítima comum quando um ou mais navios estão a rebocar outro ou outros e desde que estejam todos envolvidos em comum em actividades comerciais e não numa operação de salvação.

Quando são tomadas medidas para preservar os navios e a sua carga de um risco comum de mar as regras aplicam-se.

Um navio não está em risco comum de mar com outro ou outros navios se pelo mero acto de se desligar deste passar a estar em segurança. Mas se o acto de se separar do outro navio for em si uma avaria grossa a aventura comum continuará.

 Esta regra distingue a avaria grossa da salvação marítima que durante muitos anos esteve integrada na própria avaria grossa. Hoje estão à parte uma da outra embora os valores pagos na operação de salvação são muitas vezes integrados na avaria grossa.

Regra C- Apenas as perdas, danos e despesas que sejam consequência do acto de avaria grossa serão admitidos como avaria grossa.

Excluem-se: as perdas, danos ou despesas incorridas em consequência da libertação de substâncias poluentes da propriedade (danos ao ambiente) envolvida na expedição marítima comum; os danos decorrentes de atraso ou perda de mercado.

Fica muito claro nesta regra que os danos ao ambiente estão excluídos da avaria grossa. Os atrasos na chegada da carga ao destino também, bem como a perda de preço de mercado da carga transportada ocorrida entretanto.

 Regra D- o direito à contribuição em avarias grossas não poderá ser afectado, mesmo que o evento que deu origem ao sacrifício ou despesa tenha sido devido a culpa de uma das partes da aventura marítima, mas não pode prejudicar qualquer compensação ou defesa que podem ser apresentadas contra aquela parte no que se refere à culpa.

Isto significa que mesmo que uma das partes tenha originado o risco de mar e consequente sacrifício extraordinário este acto não deixa de se considerar avaria grossa e todos os participantes (donos dos navios e donos das cargas) terão de contribuir para esta. Contudo podem pedir compensação à parte culposa.

O objectivo desta regra é primeiro acelerar e dar um grau de certeza de que os interesses que sofreram a perda poderão dentro de um tempo razoável recuperar as suas perdas. O outro objectivo é colocar fora do cálculo de contribuição todas as questões de alegada culpa ou mau comportamento.

Regra E- O ónus da prova dos danos e perdas recai sobre a parte que os sofreu e que os reclama como devendo ser incluídos na avaria grossa.

 Esta regra não trás qualquer novidade uma vez que é a parte que sofre os prejuízos que tem de os provar e reclamar como avaria grossa.

Regra F- Qualquer despesa adicional ocorrida na decorrência de outra que seria permitida como avaria grossa será considerada como tal em prejuízo de outros interesses mas apenas até ao montante da despesa evitada.

Se houver uma despesa adicional feita para evitar outra que seria considerada avaria grossa será considerada como tal mas só até ao montante que evitou. Se ultrapassar a despesa que substituiu o seu excesso não será pago. Tem de ser razoável a despesa.

Regra G- A avaria grossa será ajustada quanto a perdas e contribuições de acordo com o valor no tempo e lugar onde a aventura termina. Esta regra não afecta o lugar onde a declaração de avaria grossa for feita.

Esta regra lida com o onde e como as avarias grossas são avaliadas e os valores das contribuições são definidos.

São estas as 7 regras alfabéticas, as regras de base das avarias grossas.

Na próxima edição falaremos das regras numeradas, também na versão de 1994 pelas razões já supra indicadas.



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