O Prémio do País Azul

Lisboa volta a ser classificada como a cidade mais cool da Europa, pela actividade e criatividade borbulhante que aqui se vive e que muito tem crescido assente na  cena tecnológica e empreendedora daquela que ser quer afirmar como The next big thing, mas diferente de qualquer outra (Revista Conde Naste Traveller, Maio 2016)! A este novo galardão somam-se tantos outros, que são tão seguidos e frequentes que parecem um dominó de cartas a cair em cima deste pequeno país à beira mar plantado, que distinguem ora Lisboa, ora Porto, ora o Algarve, ora a Nazaré ora os Açores ou mesmo até Portugal como um todo, como sendo os novos spots de qualquer coisa digna de se ser e de ser alvo de tão orgulhosos galardões.

Não me interpretem mal, acho óptimo cada um dos prémios, e mais do que merecido, todos eles e mais aqueles que ainda não nos foram atribuídos apenas porque são desconhecidos da esfera mais comercial mas nem por isso menos merecedores! O poder que cada um destes prémios nos dá, como cidadãos destas cidades e país é imenso, compete-nos a nós saber gerar valor em torno de cada um deles e conquistar sempre mais e melhor!

Mas confesso que ambiciono pelo dia em que recebamos um prémio que nos distinga verdadeiramente, que nos coloque onde mais nenhum país ainda conseguiu ir, que nos transporte de novo para uma era onde podemos ser grandiosos como já soubemos ser e, acima de tudo, onde possamos fazer a diferença para melhor – para melhorar a saúde deste planeta, para criar uma economia mais azul, mais limpa e sustentável, para criar mais emprego e dinâmica no nosso tecido empresarial, para oferecer um futuro próspero às gerações futuras deste país, e para o qual teremos sempre algo que os outros não têm tão facilmente – o mar imenso de que é feito este nosso vasto território Português!

E se Portugal recebesse o prémio para o País Mais Azul do Planeta?

E se em Portugal soubéssemos desenvolver o Mar com os mesmos princípios com que estamos a desenvolver as novas tecnologias? Assente nos mesmos modelos de estimulo à inovação e empreendedorismo, imbuídos de pilares formativos fortes, mas focados naquele que é, por favor abram os olhos, o nosso maior activo como nação marítima gigante no mundo – o MAR PORTUGUÊS?

E se criássemos modelos de incubadoras e aceleradores só focadas em mar e nas suas intersecções (e não só em apps e TICs) e tudo o que do mar pode derivar ou nele actuar? Ou até mesmo em barcos no rio e nos estuários? Porque não?

E se introduzíssemos nos curricula escolares o mar como elemento central – meio de experimentação, de desenvolvimento de competências, de fonte de exemplos para exercícios de matemática, de ciências, de Português, de música, de economia e negócios, e de Educação Física? E se o Surf, o Kitesurf, o Bodyboard o Windsurf, o Paddle, o Remo e a Vela fossem desportos escolares? Para todos, não para as elites apenas? E se a criatividade estivesse intimamente ligada ao nosso mar? Já tanta tinta se gastou nele e tanta mais há ainda para escrever e pintar…. Já temos excelentes exemplos de algumas destas iniciativas mas são poucos e pequenos! Tem que ganhar escala e massa!

E se estimulássemos o turismo marítimo e náutico a ir mais longe ainda? Restaurantes submersos, hotéis no mar, nos rios, casas barco a povoar as margens dos nossos belos rios e costas selvagens?

E se surgirem mais e mais prémios que fomentem a ligação ao mar e actividades marítimo-lúdicas para a sociedade em geral, como o barco aberto, passeios nos rios e estuários para todos, aquatáxis, aquaUber (porque não?), regatas públicas (sim, sociedade geral, e não para uma elite financeira com capacidade para ter os seus veleiros e barcos e praticar regatas competitivas e estimulantes com cocktails chiquérrimos no final!)?

E se dinamizarmos o orgulho que é a nossa marinha, a nossa capacidade naval e a nossa ciência marinha? E se mostrarmos ao leigo cidadão que deste mar, que é tão nosso, poderá surgir a nova cura para doenças do século XXI ou terapias biológicas que podem substituir os nossos órgãos e tecidos como que num filme futurista mas não tanto assim? Que deste mar tão azul e belo em que nos banhamos poderão surgir tantas novas soluções mais ecológicas para o nosso dia a dia, como novos detergentes menos poluentes, novos bioplásticos biodegradáveis, cosmética inovadora e diferenciada, biomateriais mais resistentes e elásticos, novos alimentos para uma população em crescimento acelerado, ou aquelas que serão as commodities do próximo século?

Não achamos nós que assim passaríamos a ver o mar como fonte de sustento, alimento, mas também de inovação, tecnologia, ciência, empregos qualificados e diferenciados e um motor da economia nacional com derrames para a economia internacional? Será que nos passaríamos a ver como realmente somos – um país geo-estrategicamente colocado na centralidade deste novo mundo com um poder imenso aos nossos pés?

Porque razão não conseguimos ainda desbloquear este potencial? Porque razão andamos há mais de 20 anos a apregoar o mar e as suas potencialidades e ainda não passámos daí? Porque razão, após um breve instante de histeria marítima colectiva, onde no seguimento de algumas grandes e excelentes medidas políticas, tudo parece cair no esquecimento, perder o fôlego, desinteressar-nos como cidadãos e actores deste sector? Porque razão nos desligamos daquela que deve ser a nossa missão enquanto cidadãos Portugueses, cientistas e engenheiros marinhos e marítimos, economistas, advogados e actores do mar, de promover, participar e apregoar cada vez mais alto e mais longe que é aqui, no mar nacional, que devemos apostar?

E se Portugal passasse a fomentar fiscalmente negócios ligados ao mar – às novas formas de aqualcultura multitrófica integrada, ou para os mais leigos, aquacultura biológica; às indústrias que inovam na transformação do pescado; às novas conserveiras que desafiam o status quo; às jovens empresas de biotecnologia inovadoras no panorama global; às empresas de turismo náutico que ousam ir mais longe, aos novos portos e TICs no mar; àquelas indústrias navais que souberem diferenciar-se e tornarem-se competitivas; e a todos aqueles que, no fundo,  ousam olhar para o mar e ver nele algo de novo, que ousam pensar no mar out of the box?

O que nos falta é ter mais destes! Muitos mais destes! Porque são esses visionários que sabem que ali, naquele azul profundo e nos recônditos deste nosso mar, jaz o futuro daquele que pode e deve ser o País Azul do Planeta Terra. Quando será que recebemos este prémio?…

 



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