“Em 2050 teremos mais plástico (em peso) que peixe no Oceano!” – World Economic Fórum, Janeiro 2016. Esta frase correu as redes sociais, os jornais e meios de comunicação, fóruns do sector e blogs da especialidade de forma fulminante. E não é razão para menos. A mesma é citada do mais recente relatório do World Economic Forum – The New Plastics Economy: Rethinking the Future of Plastics. (A nova economia dos plásticos – repensar o futuro do plástico) onde um cenário que mais parece ficção científica, mas é de facto verdadeiramente assustador, nos é descrito com minucioso detalhe.
A saber alguns factos verdadeiramente alarmantes, derivados deste e outros estudos:
- Estimativas actuais derivadas da mais recente investigação no tema revelam que existem hoje 150 milhões de toneladas de plástico nos oceanos. Assustador, não?
- Se tudo continuar a decorrer ao ritmo actual o oceano conterá 1 tonelada de plástico para cada 3 toneladas de peixe em 2025 e mais plástico que peixe em 2050! E agora, aterrorizados?
- Estão identificados cerca de 192 países que contribuem para este oceano de plástico, mas o mais alarmante é perceber que os primeiros 20 países da lista contribuem sozinhos com 80% deste lixo de plástico!
- Mas há mais: reciclamos apenas uns surpreendentes 14% deste plástico! Mas porquê? Este plástico até tem valor comercial.
- Hoje em dia, 95% do valor comercial derivado dos plásticos para embalagens (cerca de 80-120 mil milhões de USD anuais) é perdido na economia após uma curta primeira utilização. Porquê? Porque este mesmo plástico escapa do sistema de reciclagem e vai terminar onde? Exacto – no mar!
- Dados recentes sugerem que reduzir para 50% a quantidade de plástico mal reciclado ou perdido nos países top 20 mais poluentes resultaria numa redução de quase 40% do plástico que atinge os oceanos.
- Pior: O custo de recuperar este plástico perdido está avaliado pela UNEP em 40 mil milhões de USD (e este é um número muito conservador). Este valor é maior que todo o lucro conjunto da indústria do plástico!
Outros estudos, como os de Jambeck et al., Science 2015 entre muitos, mostraram conclusões muito semelhantes!
Portanto, ou alteramos a nossa dieta e começamos a aceitar plástico no nosso prato para comer (não me parece) ou temos que AGIR já! Mas como, perguntará o leitor mais atento?
Claro que há medidas que alguns países, como Portugal (é, desta vez até estamos nos top dos bons exemplos!), implementaram recentemente que contribuem e muito para reduzir a quantidade de plástico consumido e incentivam a sua reutilização e reciclagem. No nosso caso, tínhamos até 2015 um consumo de 466 sacos de plástico/consumidor/ano! Com a nova taxa introduzida o ano passado sobre o preço destes sacos, o consumo reduziu drasticamente (estamos perto do objectivo desejado de 50 sacos/consumidor/ano – uma baixa de quase 90%) e a reutilização aumentou imenso – contribuindo para um impacto significativo na quantidade de lixo de plástico produzida pelo país.
Mas não chega. Falta ainda um longo caminho a percorrer para “limpar” o que já danificámos e outro tanto, maior ainda, para evitar a “infestação” total do planeta azul por uma grande “película aderente”!
Há que pensar grande e diferente, fora da caixa, e em novas possibilidades. E é aqui que entra a ciência e a tecnologia. Estamos a entrar numa nova era do Antropoceno– a era do plástico! E esta realidade terá que, inevitavelmente, fazer parte das novas soluções, produtos e inovações que daqui surgirem. Recentes avanços tecnológicos mostram como é possível desenvolver a economia ao mesmo tempo que contribuímos para resolver um dos maiores flagelos da humanidade – poluição plástica nos oceanos. Exemplos fantásticos, entre tantos outros:
– VORTEX PROJECT (projecto associativo de artistas mundiais para utilização de plástico para obras de arte)
– G-STAR RAW/Bionic YARN (calças de ganga feitas de plásticos recuperados do oceano com recurso à biotecnologia)
– THE OCEAN CLEANUP PROJECT (sistema de engenharia para limpeza do oceano desenvolvido por estudante de 19 anos)
– OCEAN SOLE (uma empresa do Quénia que desenvolve chinelos de praia derivados da borracha de toneladas de chinelos flutuantes recolhidos nas praias do Quénia e arredores, e que levou a que a Ipanema® fechasse um negócio com eles para fazerem o mesmo)
Mas e Portugal? Onde estamos neste mapa? Pois então, é aqui que entram também as possibilidades que abrem a contratação de mais 400 novos doutorados previstos no orçamento de estado para a FCT. Como, perguntará novamente?
O Mar é um activo português com um peso ainda pouco significativo na economia nacional. Dos actuais perto de 3% no PIB da economia do mar, a biotecnologia e o uso sustentável dos biorecursos marinhos pouco impacto têm. Mas em termos de investimento nacional em I&DT nas universidades, centros de investigação e recursos humanos altamente qualificados nesta área há muito que tem sido feita uma aposta forte nas ciências marinhas e marítimas nacionais. É agora chegado o momento de converter esse investimento em valor retornado à sociedade. Não é suficiente alocar verbas no orçamento de estado para contratações massivas de doutorados sem que haja uma estratégia clara de rumo e áreas prioritárias para o país, independentes dos ciclos políticos e das equipas de gestão de organismos do estado. O que irão fazer estes 400 doutorados? Que problemas e desafios societais irão eles ajudar a resolver? De que forma e para quem irão ser canalizadas estas verbas para as quais todos nós contribuímos com a fortíssima carga de impostos que pagamos e para as quais todos desejamos dar bom uso? E como garantir a sustentabilidade destes investimentos?
Sendo o mar um desígnio nacional, e existindo actualmente ferramentas e tecnologias poderosas que poderão ser utilizadas não só para gerar valor a partir de um recurso natural tão poderoso como o nosso mar, devemos utilizar estas verbas para potenciar os resultados da ciência nacional e alavancar os nossos cérebros, tão bons e em quem tanto já investimos, para criarem o seu próprio emprego, desenvolverem soluções nacionais de cariz global e gerarem mais emprego e dinâmica na economia. Mas não esqueçamos que o podemos fazer sem descurar a sobrevivência a longo prazo do planeta e de todos nós, apostando em ciência azul, limpa e inovadora. Não será, portanto, pedir demais que dos próximos doutorados e investimentos nacionais em ciência muitos sejam para os novos usos e recursos do mar, pois não?