Algas

Em Dezembro foi anunciado o resultado das 50 candidaturas ao programa da União Europeia (UE) Blue Labs destinado a apoiar soluções inovadoras para desafios marítimos e entre os quatro projectos aprovados está o AMALIA (Algae-to-MArket Lab IdeAs), orientado para o desenvolvimento de produtos inovadores com recurso a algas invasoras, e que é liderado pela unidade de I&D do Instituto Politécnico de Leiria (IPL), o MARE-IPLeiria.

O projecto arrancou no dia 1 de Fevereiro e tem a duração inicial de 2 anos, “contemplando o desenvolvimento de produtos para o mercado a 2 e a 4 anos”, conforme referiu ao nosso jornal Marco Lemos, investigador coordenador do AMALIA. O financiamento global é de 582 mil euros, tendo co-financiamento da Comissão Europeia (CE) no valor de 465 mil euros. O remanescente é investimento a realizar pelos parceiros envolvidos.

Além do IPL, participam no projecto, que tem âmbito europeu, o INEGI – Instituto de Ciência e Inovação em Engenharia Mecânica e Gestão Industrial da Universidade do Porto, a Universidade de Coimbra, a empresa Algaplus, a Associação para o Desenvolvimento de Peniche, a Universidade de Vigo, a empresa austríaca Biomin e a empresa holandesa Quest-Innovation.

 

A equipa e o projecto

 

No total, a equipa tem 37 elementos, dos quais 28 investigadores e 9 estudantes em pós graduação. O IPL “contribui com 7 investigadores doutorados e 6 estudantes”, esclareceu-nos Marco Lemos. Segundo o investigador, foi o IPL que definiu os parceiros, optando por envolver instituições de ensino superior, associações de desenvolvimento e empresas, em função da natureza do projecto.

Marco Lemos explicou-nos que “neste consórcio estão envolvidos diversos investigadores e tutores seniores que irão colaborar com jovens investigadores numa tipologia de investigação aprendizagem com base na investigação e que gerará produtos com alto potencial de mercado nas áreas alimentar, aquacultura, farmacêutica e cosmética”.

O investigador admitiu que “muitos destes casos irão ser transpostos para os programas curriculares de licenciaturas e mestrados dos parceiros, envolvendo centenas de alunos com o objectivo de contribuir para uma economia cada vez mais azul e com grandes preocupações na sustentabilidade e conservação dos oceanos”.

“Nesse sentido, será feito um exaustivo mapeamento das espécies de algas não nativas na costa noroeste da Península Ibérica (desde Peniche e cobrindo toda a Galiza) e o desenvolvimento de avançados sistemas de monitorização dos oceanos para o aparecimento destas algas”, explicou-nos.

Além das acções viradas para a identificação das espécies invasoras, será realizado “um grande esforço para a sua valorização biotecnológica”, visando transformar estas ameaças em verdadeiras oportunidades de negócio,  promovendo produtos inovadores dentro dos parceiros do AMALIA com foco no mercado europeu e asiático”, afirmou Marco Lemos ao nosso jornal.

Na prática, o projecto procurará “valorizar as algas do noroeste da Península Ibérica e criar produtos alimentares inovadores, rações com potencial para estimular o sistema imunitário de peixes e camarões em aquacultura, extractos para a indústria cosmética e novos medicamentos (com acção anti-tumoral, por exemplo)”, refere o IPL em comunicado.

“Para promover a monitorização do aparecimento destas algas invasoras, avançados sistemas e soluções de engenharia e recolha de imagem serão integrados num sistema subaquático, que dará informações em tempo real sobre o aparecimento e quantidades de alga – permitindo assim despoletar mecanismos de recolha das algas para a indústria, antes que imponham danos no ambiente marinho”, refere o IPL.

De acordo com Marco Lemos, este projecto “é sustentado no extenso trabalho que tem vindo a ser desenvolvido no MARE-IPLeiria em alguns projectos europeus, nacionais e com empresas, no âmbito da aplicação dos recursos marinhos em biotecnologia, em aquacultura e na área alimentar (já com diversos produtos no mercado: pão d’algas, gin de algas, azeite com algas, gelado com algas, etc)”.

Segundo o coordenador do AMALIA, surgiu no âmbito de “uma aplicação dos recursos marinhos – contribuindo para um efectivo crescimento azul – e da investigação efetuada sob o slogan do MAR para a SOCIEDADE,” em paralelo com o estudo da ecologia das algas e de riscos ambientais associados a alterações globais, gerando uma fusão natural entre o estudo dos processos de invasão e presença de algas não-nativas com a aplicação destas no sentido de criar um modelo de gestão dos recursos marinhos e da sua sustentabilidade.

 

O interesse global

 

Dados da CE indicam que “a ameaça das espécies invasoras provoca perdas de 12 mil milhões de euros na Europa (estimando perdas de 1 trilião de euros por ano no mundo)”, refere Marco Lemos, sendo que a “costa atlântica ibérica tem mais de 20 espécies de carácter invasivo com graves implicações económicas – além de potenciais graves impactos na biodiversidade e saúde pública”, acrescenta.

Para o investigador, “aproveitar estes recursos permitirá reduzir a sua quantidade no ambiente ao mesmo tempo que se geram produtos que aproveitam as diversas características e propriedades importantes que possuem”, como antibacterianas, foto-protectoras, antioxidantes, anti-tumorais, entre outras, num “mercado das macroalgas em crescimento e estimado, actualmente, em 5,5 mil milhões de euros”.

Estes 5,5 mil milhões de euros incluem cerca de 5 mil milhões “para a área alimentar e o restante para a extracção de compostos”, adianta o coordenador do AMALIA. O projecto será inserido neste “mercado alimentar de valor acrescentado” e gerará “novos nichos de mercado e valor” a partir da “valorização biotecnológica e exploração das suas bioactividades em rações, alimentos e novos fármacos/cosméticos”, explica Marco Lemos.

Neste contexto, o programa Blue Labs desempenha um papel importante, promovendo “laboratórios de inovação para desenvolver soluções viáveis que abordem desafios para o meio marinho e oportunidades para a economia azul”, refere Marco Lemos. O foco desta iniciativa é “a promoção de um novo modo de trabalhar, onde jovens cientistas com o apoio de investigadores seniores, a indústria e agentes locais, juntam esforços para desenvolver soluções inovadoras”, destinadas a “suportar o desenvolvimento de uma economia azul sustentável” enquanto “promovem a conservação dos recursos marinhos e dos ecossistemas.

“O conceito Blue Labs trabalhará no interface investigação – exploração comercial de modo a que os resultados da investigação sejam alavancados para o mercado – gerando deste modo emprego e oportunidades de negócio na economia azul”, sublinha o investigador.



Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

«Foi Portugal que deu ao Mar a dimensão que tem hoje.»
António E. Cançado
«Num sentimento de febre de ser para além doutro Oceano»
Fernando Pessoa
Da minha língua vê-se o mar. Da minha língua ouve-se o seu rumor, como da de outros se ouvirá o da floresta ou o silêncio do deserto.
Vergílio Ferreira
Só a alma sabe falar com o mar
Fiama Hasse Pais Brandão
Há mar e mar, há ir e voltar ... e é exactamente no voltar que está o génio.
Paráfrase a Alexandre O’Neill