Apesar do optimismo manifestado pelos resultados da Maersk na evolução do mercado dos contentores, e não obstante até a evolução positiva geral do comércio mundial, a queda dos graneleiros deixa, no entanto, algumas dúvidas quanto à real justificação de todo esse optimismo.

O resultado registado no primeiro trimestre do grupo A.P. Moller- Maersk, divulgado a 11 de Maio, revelou uma subida de receitas de 16%. Se por um lado a subida do preço do petróleo permitiu à Maersk Oil uma receita de 292 milhões de dólares e salvar o resultado do grupo, em relação à Maersk Line, a subida do preço do barril teve impacto fazendo-a perder 66 milhões de dólares que somado à queda no preço do frete fez disparar as perdas da maior empresa de porta contentores do mundo para os 80 milhões de dólares. Jakob Stausholm, o CFO do Grupo, está contudo optimista pois o aumento do crescimento económico mundial está a ser acompanhado por um incremento do comércio, esperando para 2017 um crescimento de 2 a 4% no mercado global de contentores. Para Stausholm o 1º trimestre do ano é sempre mais difícil para a Maersk Line derivado da paralisação do comércio com a China durante a semana do Ano Novo Lunar.

No que respeita ao sector dos graneleiros a dependência da China é ainda maior. Durante o mês de Abril, o benchmark da indústria, Dry Baltic Index, caiu 13%, sendo que a queda tem persistido nas primeiras semanas de Maio. O crescimento de 11,9% das importações na China em Abril, comparado com os 20,3% de Março e os 8% das exportações, comparado com o crescimento de 16,4% do mês anterior, explicam em parte a queda do DBI. O ponto de 1.338, o mais alto que o índice atingiu em 29 de Março, é para a Allied Shipbroking “the ceiling we can reach for the time being”. O actual valor do índice e a queda acentuada das importações/exportações da China está a surpreender a maior parte dos analistas e a colocar o optimismo em suspenso.

No final de Abril, o relatório mensal do Global Port Tracker divulgado pela National Retail Federation e pela Hackett Associates, que cobre os principais portos de contentores dos EUA – Los Angeles/Long Beach, Oakland, Seattle e Tacoma na costa Oeste e New York/New Jersey, Hampton Roads, Charleston, Savannah, Port Everglades e Miami na costa Este e Houston na costa do Golfo – revelou no mês de Janeiro, os últimos dados disponíveis pela Global Port Tracker, um crescimento das importações em 12.5% comparado com o ano anterior. O total do movimento nos portos no mês de Janeiro foi de 1.67 milhões de TEU , o que corresponde a uma subida de 6.5% em relação a Dezembro sendo que o maior volume derivou de um pico nas fábricas chinesas anterior ao feriado do Novo Ano Lunar. Baseando-se nos dados de Janeiro o presidente da National Retail Federation diz que “consumers are spendig more freely and retailers are stocking up for the spring and summer seasons and merchants are making sure they are prepared to meet growing demand, and imports are essential to providing American families with the products they need at prices they can afford”. Em Abril, os dados relativos a Janeiro permitiam este optimismo do presidente da NRF prevendo um aumento entre 3.7% a 4.2% das vendas a retalho – excluindo automóveis, gasolina e restauração – em relação ao ano de 2016, apesar do volume da carga não estar directamente correlacionado com as vendas visto só se contar com o número de contentores e não com o seu conteúdo. Em relação ao movimento dos portos, a NRF prevê um total de 9.7 milhões de TEU no primeiro semestre de 2017, um crescimento de 7.4% em relação ao ano anterior. A ameaça das tarifas aduaneiras e do cancelamento do TPP, vista como um factor que desencoraja o comércio internacional, está a ter, pelo menos por agora, o efeito oposto, disse por seu lado Ben Hackett, fundador da Hackett Associates, pois o comércio continua a crescer apesar das políticas de Washington.

Outro importante relatório mensal, o World Trade Monitor, mantido pelo Netherlands Bureau for Economic Policy Analysis, mais conhecido como CPB World Trade Monitor, revelou no final de Abril que o volume do comércio mundial em Fevereiro teve uma subida de 4.2% em relação a Julho de 2016. Apesar da ligeira queda em Fevereiro, nos últimos 6 meses até Janeiro, a subida do índice correspondeu ao maior ganho desde 2010.  Para um colunista da Bloomberg, apesar de reconhecer que seis meses não é suficiente para o índice revelar a consolidação de uma tendência, não deixou de criticar os pessimistas que nos últimos anos anunciaram o fim da globalização ou a desmaterialização da economia global, “physical godos being supplanted by data flows”, considerando ainda que a queda do comércio mundial nos últimos anos foi uma consequência da crise financeira e não porque a geração dos “millennials supposedly didn’t want houses or cars”, reconhecendo igualmente que o comércio global dificilmente atingirá os valores da viragem do século e que nos países desenvolvidos a tendência continuará “toward information and services and away from stuff, cyclical factors still matter a lot, too, and right now the cycle may be the global economic friend.

Contudo, em Maio a realidade do valor do Dry Baltic Index e os números das importações/exportações da China parecem terem suspendido, para já, o optimismo que ainda há umas semanas se afigurava contagiante. A recente revelação do excesso de minério de ferro nos portos chineses provocou um volte-face. As políticas de redução do investimento especulativo, sobretudo no sector imobiliário do país, pode refrear o crescimento do comércio global. Relatórios como o Global Port Tracker e o World Trade Monitor parecem ignorar a tendência actual de tratar e correlacionar um maior número de informações em tempo real de forma a permitir a tomada de decisões de forma mais eficiente quer ao nível da gestão dos transportes como da logística. Trabalhar dados históricos como ainda fazem os relatórios acima mencionados, que em Abril fazem previsões a partir de dados de Janeiro, estão a revelar-se obsoletos e consequentemente a prejudicar as decisões dos grandes armadores. É pois preocupante o optimismo do CFO do grupo A.P.Moller-Maersk quando para o analista e director da Clarksons Platou Securities os resultados da Maersk Line desapontaram e já é o segundo trimestre consecutivo que a sua performance em relação à concorrência cai.



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