Estranha a reticência em se falar abertamente da questão da Taxa de Tonelagem, como se assunto tabu, melindroso, difícil fora

Fala-se de Taxa de Tonelagem, ou Imposto de Tonelagem, e de algum modo, parece estarmos a falar de algo tão estranho como exótico, novo, pouco estudado, menos ainda experimentado e raramente implantado. E, não obstante, nascida lá para os idos de 1996, senão mesmo tão recuado como 1957, aceite pela União Europeia e em vigor em quase todos os Estados-Membro, salvo em dois ou três, entre os quais Portugal. E não obstante, fala-se em Taxa de Tonelagem e, não raramente, é como se de Unicórnios se falasse. Realmente surpreendente, profunda e extensamente.

Evidentemente, a questão interessa sobretudo a Armadores. Avis Rara em Portugal os Armadores e cada vez mais? De certo modo, sim, com certeza. Mas se aos Armadores interessa, acima de tudo, deverá a Taxa de Tonelagem interessar, nem só e exclusivamente aos Armadores interessa.

Num documento da Maritime UK sobre O Sucesso da Taxa de Tonelagem, publicado há já algum tempo, atesta-se, com base num estudo de 2011 da Oxford Economics, ter a sobredita Taxa de Tonelagem permitido reverter, de forma drástica, o aparente inexorável declínio da Marinha Mercante britânica e sextuplicar, em dez anos, os números da respectiva frota, aumentando, no mesmo período, naturalmente, o número de empregos a o valor global de contribuição para a economia. Mais ainda, segundo as mesmas estimativas, sem a sobredita Taxa de Tonelagem, o valor da contribuição económica da Marinha Mercante para o Reino Unido seria entre duas a três vezes inferior e os de postos de trabalho complementares entretanto criados, na ordem dos 70 mil, nunca teriam, pura e simplesmente, conhecido a luz do dia.

Não parece coisa pouca.

E porque se preocupa tanto a Maritime UK com a Taxa de Tonelagem? Por puras razões de ordem académica?

Longe disso. A preocupação, compreensível, advém do facto de, entretanto, encontrando-se o mundo globalizado, Singapura estar a reagir e, naturalmente, os britânicos não quererem ser apanhados desprevenidos e, muito menos, ultrapassados.

Coisas do mundo.

Entretanto, o que é a sobredita Taxa de Tonelagem? Aparentemente, nada de extraordinário a não ser substituir o tradicional IRC, relativo aos lucros da operação da empresa, por taxas fixas estipuladas relativamente à capacidade de transporte (tonelagem) das respectivas frotas por um determinado período. Embora os respectivos regimes possam variar de estado para Estado, na essência é apenas isto.

Qual a vantagem? Por um lado, o valor do imposto é francamente inferior e, por outro, fixado o regime e as respectivas taxas para longos períodos, como, por exemplo, no Reino Unido, para dez anos, há, cumulativamente, uma estabilidade fiscal e possibilidade de planeamento também, aparentemente, muitíssimo superior.

Aparentemente também, Portugal parece, contudo, estar a leste de tudo isto. É certo que o Presidente da República abordou a questão no 30º aniversário da Transinsular mas os jornalistas estavam mais preocupados com as questões relativas ao BES. É certo que Luís Nagy, na entrevista publicada no número anterior do nosso Jornal da Economia do Mar, o referiu também mas, se hoje queremos uma reflexão, como no mês passado, para complementar, opor, rebater ou seja lá o que for, a par da reflexão do comandante Joaquim Coelho, bem podemos andar entre Seca e Meca e a sorte sempre será madrasta. Porquê, não se entende. A sobredita Taxa de Tonelagem, por definição, nunca será obrigatória mas cada Armador terá é a possibilidade, se assim entender, de opção. Poder-se-á até entender que algum ou alguns não queiram mas, não deveríamos estar hoje a discutir seriamente o assunto em Portugal?

Sim, muitos afirmam que sem Marinha Mercante nacional nunca haverá verdadeira economia do mar e mesmo que os portos dificilmente se desenvolverão a partir de determinado patamar sem a mesma. Também sabemos que a Política do Mar nada tem a ver com a Política Fiscal, como a Política Fiscal nada tem a ver com a Política do Mar. Estranho, mas é assim. Agora, fazer deste caso uma espécie de caso tabu, não é quase absurdo, uma incógnita incompreensível, um enigma estranhíssimo?

Assim parece.



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