Os Tribunais não conseguem responder a processos de pescadores por falta de legislação.
Totais admissíveis de captura

Uma avaliação de Alberto Leite, biólogo com especialização em Tecnologia da Pesca pelo Instituto Francês de Investigação para a Exploração do Mar, e com um percurso profissional que inclui funções em várias entidades públicas relacionadas com a pesca e a aquacultura, conclui que o grande problema actual da política das pescas em Portugal é a falta de legislação sobre a matéria. Um problema que vem desde 2008, como o próprio afirma.

Publicada em 2008, a última legislação já tem 10 anos, o que só por si pode ilustrar quão desactualizada está, referiu Alberto Leite num seminário sobre a Política Comum de Pescas que ocorreu ontem na Escola Superior Náutica Infante D. Henrique (ENIDH). Foram publicadas Políticas Comuns de Pesca, Regulamentos de pesca, no entanto, o nosso regulamento base continua a ser o Regulamento CE 278/87, ainda que com alterações e baseado no Decreto-Lei que deve sair todos os anos em Janeiro. Muitas são as directivas, os regulamentos sobre regulamentos, no entanto, não há um devidamente actualizado e que contenha toda a matéria necessária.

A Regulamentação comunitária é nova, nomeadamente nas medidas das novas infracções e na distribuição dos vários tipos de infracções como graves, muito graves e leves, que o antigo regulamento já continha, no entanto não com a mesma qualificação. Contudo, “há infracções leves na nossa legislação que passaram as ser infracções muito graves na legislação comunitária”, afirmou Alberto Leite, o que demonstra falta de coerência e só dificulta o trabalho das autoridades que fazem cumprir a lei.

Quando se recorre a tribunal, por exemplo, em casos de pesca ilegal em Portugal, o sistema de fiscalização enfrenta situações que não consegue ultrapassar. O que acontece em Portugal? Tenta estabelecer-se uma defesa ou acusação, não com base num artigo concreto, mas com base em alíneas não ligadas directamente à questão da pesca. Os tribunais, na generalidade, arquivam os processos porque não encontram na legislação nada que permita a interpretação que se tenta dar. Isto, porque a legislação está ultrapassada e não foi adaptada consciente e objectivamente à legislação comunitária, considerou Alberto Leite.

O orador afirmou ainda que não foi por falta de propostas, pois o próprio, em 2004, fez e apresentou uma proposta de legislação que não foi aceite. E há quem ganhe com esta situação? Talvez, a começar pelos próprios pescadores, que estando ao corrente da legislação, ou da falta dela, continuam a praticar pesca ilegal, entre outras ilicitudes, pois sabem que o tribunal não os poderá punir, por falta de legislação.

Pelo que, considerou Alberto Leite, há muito caminho a percorrer na questão das pescas, tanto para crescer quanto para seguir a União Europeia, que está a par das necessidades nesta realidade, nomeadamente a gestão sustentável a par com a preservação das espécies.



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