Angola tem uma costa marítima significativa de 1.650 km,  uma superfície marítima de 162.000 M, e uma configuração terrestre  de bloco maciço de forma sensivelmente quadrangular entre elas o enclave de Cabinda situado na costa do rio Zaire, ocupado  uma área de cerca de 1.246.700 Km2 na região da África Central Ocidental, com uma fronteira […]

Angola tem uma costa marítima significativa de 1.650 km,  uma superfície marítima de 162.000 M, e uma configuração terrestre  de bloco maciço de forma sensivelmente quadrangular entre elas o enclave de Cabinda situado na costa do rio Zaire, ocupado  uma área de cerca de 1.246.700 Km2 na região da África Central Ocidental, com uma fronteira terreste de 4.837 Km2, o que faz que seja considerado o quinto país  com maior dimensão na África subsariana, sendo o mar a espinha dorsal da sua economia e daí esta oportunidade para prestar algum tributo em torno da reflexão sobre os atuais desafios sobre a segurança da costa marítima.

 Em 6 de Dezembro de 2013 e em 24 de Agosto de 2015, respetivamente, Angola submeteu no plenário da Comissão de Limites da Plataforma Continental a extensão da sua Plataforma Continental, contudo, a não delimitação da fronteira marítima ao norte pode dificultar a apreciação da submissão, nos termos da alínea a) do n.º 5 do Anexo I do Regimento da CLCS, que recusa o respetivo exame quando haja controvérsias sobre a delimitação de áreas marítimas sobrepostas.

 Contra provável recusa há possibilidade de acordos provisórios como meio pacífico, tendo em conta as dificuldades de se concluir acordos definitivos sempre que há áreas sobrepostas campos petrolíferos em produção. Uma solução pacífica a controvérsia poderá ser a simples troca de notas diplomáticas nas quais, Angola, República Democrática do Congo, Congo Brazzaville e Gabão, reciprocamente, dão o seu assentimento ao exame das respetivas propostas de extensão da plataforma continental, sem prejuízo do futuro estabelecimento dos limites fronteiriços. São os comumente chamados “acordos de não objeção”[1].

 Na região da SADC, recorreu- se por diversas vezes ao uso de arranjos provisórios com troca de notas, entre outros: África do Sul e Namíbia; África do Sul e Moçambique; Madagáscar e Moçambique. Ilustrando o “modus faciendi” da África do Sul que tem um limite marítimo não resolvido com Moçambique no Índico e outro no Atlântico com a Namíbia, transmitiu o seguinte, às Nações Unidas:

“No espírito do n.º 10 do Artigo 76.º da UNCLOS e na aplicação do n.º 2 do Artigo 46º do Regimento da CLCS e do Anexo I do Regimento, a África do Sul concordou com Moçambique, através de uma Troca de Cartas, que as suas submissões respetivas podem ser consideradas pela CLCS, entendendo que isso não deve prejudicar a delimitação futura. Ao mesmo tempo, a África do Sul transmitiu uma nota verbal à Namíbia informando esta última que pretende apresentar uma submissão para uma extensão da plataforma continental e que tal submissão será sem prejuízo dos direitos dos dois países em relação a qualquer futura decisão ou delimitação da fronteira entre os dois países”[2].

 Regressando à sobreposição na bacia do Congo, uma recíproca troca de notas de conteúdo semelhante levaria a ineficácia da submissão depositada na Comissão de Limites, designadamente; por Angola (7/6/2012 contra Gabão), RDC (30/8/2013 contra Gabão), RDC (11/4/2014 e 7/10/2015 contra Angola) e Gabão (30/5/2014 contra Angola). As trocas de notas significa (va) o consenso provisório que permitia a apreciação das submissões de Angola e do Gabão, por parte da CLCS, tendo em conta que RDC e Congo Brazzaville não apresentaram submissões.

 A possibilidade de um acordo definitivo, está muito dependente da cooperação necessária para os países acordarem na georreferenciação dos pontos de início herdados do colonialismo para posterior projeção para o mar, com respeito da equidistância previsto no direito internacional (Artigo 15º da CNUDM) e pelo direito interno (Artigo 12º da Lei 14/10 de 14 de Julho). Por outro lado, os títulos históricos conhecidos exigem uma abordagem da geografia costeira, tecnicamente complexa, na foz de Massabi, na região da Ponta Padrão e no talvegue do rio Congo.

 Em torno das desinteligências está o interesse de Angola, em benefício das suas populações, em alargar ao máximo a sua margem continental dentro das regras internacionais. E, em contrapartida, está um interesse da CLCS em resguardar ao máximo a área de afetação do património comum da humanidade, em benefício de todos os Estados, conforme reza o Artigo 136º da CNUDM.

 Contudo, Angola pretende reivindicar uma área de 379.443,84 km2, contra os 60.000 km2 da proposta elaborada em 2009. A diferença de território entre as duas propostas é substancial e por isso é de antever fortes argumentos.

 Assim, sob o tema em questão, primeiramente abordaremos sobre o Contexto Histórico das Fronteiras de Angola, aqui narraremos sobre o percurso da delimitação das Fronteira Norte e Nordeste, Fronteira Leste e Sudeste, Fronteira Sul; e seguidamente, Proteção da Costa Marítima Sul e Norte, a articulação de uma estratégia angolana para o Mar e a Criação de condições de segurança que garantam proteger o mar.

    2. O contexto histórico das fronteiras de Angola

 As fronteiras africanas foram, na sua grande maioria, definida entre 1885 e 1900, pelas potências europeias que partilharam o continente, e a carta geográfica atual foi sendo moldada por força de acordos estabelecidos entre essas potências que ignoraram os direitos dos povos africanos e até mesmo a importância de bem visíveis acidentes geográficos[3].

 É completamente expectável que a atual delimitação de fronteiras terrestre e marítima, sobretudo, a pretensão de alguns Estados Africano de estenderem a sua plataforma continental suscita conflitos, fruto do legado colonialismo que ficou estatuído na Conferência de Berlim (15 de Novembro de 1984 a 26 de Fevereiro de 1985) convocado pelo Chanceler alemão Bismark, no qual as potências colonias, repartiram o continente Africano velando (saciando) os interesses pessoas.

  • A delimitação da fronteira Norte e Nordeste

  A problemática das fronteiras de Angola coloca-se desde meados do século XIX. As primeiras dificuldades surgem desde 1846, quando a Inglaterra contestou a soberania de Portugal nos territórios da costa ocidental de África, situados entre os paralelos 5º 12´e 8º de latitude S., isto é, entre a margem direita do Zaire e a sul do Ambriz. Tal objeção veio a constituir a Questão do Ambriz, posteriormente, a Questão do Zaire[4].

 Neste contexto, foi celebrado, em 28 de Julho de 1817, o tratado entre Portugal e a Inglaterra, em que foi proposto fixar matematicamente os limites fixados àquele regime de exceção, declarando que os territórios em que os súbditos portugueses continuariam a ter liberdade de tráfico, pelo facto de, esses territórios pertencerem a coroa portuguesa, eram;

   1º Todos os efetivamente possuídos por essa coroa entre o paralelo 18º e o 8º latitude S.

   2º Aqueles em que Portugal declara que reserva o seu direito, chamados Malembo e Cabinda, na costa oriental de África, desde o paralelo 5º 12´, ao paralelo 8º latitude S.

 Neste tratado foi cometido um erro verbal, por terem lançado na costa oriental os territórios de Malembo e Cabinda, sendo corrigido esse erro dois anos depois pela convenção adicional de 30 de abril de 1819. Se este erro não tivesse sido cometido, supostamente nunca se teria levantado a Questão do Ambriz e a Questão do Zaire[5].

 Surpreendentemente, foi a explicação dada, em 9 de Novembro de 1950, pelo Embaixador Inglês em Lisboa que Lorde Palmerston apenas soubera em 1847 pelos comissários britânicos de Luanda, que Ambriz ficava ao norte do paralelo 8º latitude Sul. Independentemente, ainda que tenha reconhecido o equivoco, o Governo Inglês não desistiu da contestação ao direito português de ocupação do Ambriz, fundamentando que um erro não prevaleceria sobre o texto e a interpretação dos tratados. Na sequência desta controvérsia, foi emitido uma nota de 26 de Novembro de 1853, que vem deduzir que é certo que Portugal adquiriu no século XV o direito à soberania da região compreendida entre o 5º 12´e o 8º latitude S., mas que esse direito se acha prejudicado pelo abandono, “suffered to lapse”, porque não ocupara[6].

 Verificando que efetivamente não havia nesse lugar autoridade permanentes que afirmasse a sua soberania e se opusessem ao tráfico (limitando-se a polícia à visitas de cruzadores), o Governo português ordenou a ocupação em 20 de Janeiro de 1855, sendo que, apenas em 6 de Junho deste ano a ocupação se efetivou mediante uma expedição militar chefiada por José Baptista de Andrade, a fim de pôr termo à Questão do Ambriz. Resolvida a questão de ocupação, Portugal decidiu ao mesmo tempo mantê-la fossem quais fossem as consequências.

 Em resposta a contestação inglesa, Portugal replicava os seus direitos pelo seguinte: 1º na prioridade do descobrimento; 2º na posse conservada durante séculos; 3º na introdução da civilização pelo cristianismo; 4º na conquista pelas armas; 5º no reconhecimento do seu domínio pelos indígenas[7]. Por sua vez, pela nota de 26 de Novembro de 1853, o Governo inglês insinuou que Portugal “havia deixado cair o direito que pela prioridade da descoberta tinha a essa parte da costa porque não havia ocupação”, todavia, o Governo português resolveu “fazer uma ocupação efetiva que permitisse acabar com o tráfico da escravatura, proteger e promover o comércio lícito e exercer o seu direito de soberania”[8]. Nem com isso a Inglaterra desarmou e opôs-se tenazmente a que Portugal estendesse a ocupação para o norte. Em 1860, o Governo inglês endereçou uma nota ao Embaixador de Portugal em Londres avisando que “qualquer tentativa para estender a ocupação encontrará a oposição das forças navais inglesas”, neste sentido foram dadas instruções aos comandantes dos cruzadores ingleses da costa ocidental de África. As autoridades portuguesas de Ambriz e de Angola foram por mais de uma vez informadas destas instruções.

 Perante a ameaça inglesa, Portugal teve de submeter-se e para evitar que o conflito se agravasse, desistiu da ocupação de Cabinda, limitando-se a lembrar o fundamento dos seus direitos e propor uma solução do caso em aberto[9]

 Depois de longos anos de negociações, finalmente, a Inglaterra reconhecia a soberania portuguesa em toda a costa compreendida entre os paralelos de 5º 12´e 8º de latitude Sul, fixava-se Nóqui como limite no rio Zaire, e a fronteira interior ocidental coincidiria com os limites das atuais possessões das tribos da costa e marginais[10]. Porém, a França, a Associação Internacional Africana, a Alemanha e uma grande parte da opinião pública inglesa levantaram sérias objeções contra o tratado de 26 de fevereiro de 1884, que terminou por não ser ratificado.   

 A Associação Internacional do Congo exigia a posse de toda margem direita e esquerda do Zaire, por sua vez, Portugal opôs-se terminantemente e reivindicou pelo contrário Banana, Lândana, Cabinda e Molembo, na margem direita, e toda margem navegável do Zaire até Nóqui. Em 14 de fevereiro de 1885 em Berlim, foi assinada a convenção entre Portugal e a Associação Internacional do Congo na qual Portugal ficava tendo tratamento de “nação mais favorecida”, assim, fazia-se a delimitação de fronteiras, reconhecendo Portugal a bandeira da Associação, prometendo atacar-lhe neutralidade[11]. Aumentando o limite fronteiriço do nordeste cerca de 150.00 Km. 

 Destarte, o Congo histórico escapava á exclusividade portuguesa, ficando S. Salvador a distância de 60 km da fronteira internacional. Da delimitação convencionada conclui-se que Portugal fica-se com os territórios consideráveis do Congo.

 A proposta portuguesa no sentido de delimitar os domínios franceses e portugueses no Congo foi renovada em 1884, tratando simultaneamente as fronteiras da Guiné. Portugal pretendia o reconhecimento dos territórios situados entre o rio Chiloango e Massabi, por sua vez, a França insistia que a fronteira seguisse o curso do Chiloango, desde a sua confluência com o Lucula até à sua foz[12]. Assim, Portugal cedeu territórios na Guiné, e em troca obteve a posse de Massabi. Destarte, Portugal e França assinaram, em 12 de Maio de 1886, em Lisboa a Convenção de limites, sendo ratificado a 31 de Agosto de 1887.

 Em 12 de Janeiro de 1901, em Paris, assinou-se o Protocolo relativo ao traçado de fronteiras que interpreta e completa a Convenção de 1887. Para Marques de Oliveira o Enclave de Cabinda nasce neste cenário, confinando na sua parte norte com o Congo Francês e a restante parte com o Estado Livre do Congo, obteve-se o cuidado de se instalar o seu limite sul e o rio Zaire, de forma a desalojar Portugal de margem norte[13].           

 A fronteira nordeste de Angola levantou enormes dificuldades. Segundo a Bélgica, a fronteira nordeste de Angola fixava-se no Cuango, identificando-se o seu traçado na direção sul com todo o curso do Cuango. Por sua vez, Portugal defendeu que ela ia para além deste rio, seguindo o curso do Cuango apenas na região compreendida entre o paralelo de Nóqui e o de 6º de latitude Sul, sendo, a linha divisória das águas que pertencem a bacia do Cassai entre os paralelos 6º e 12º de latitude Sul. Os Governos português e belga adotaram em Bruxelas, a 5 de Julho de 1913 o Protocolo aprovando a demarcação da fronteira Luso-Belga de Cabinda e do paralelo do Nóqui ao Cuango.     

 A questão das fronteiras ma região do Dilolo teve origem nos termos da Convenção de Lisboa de 25 de Maio de 1891, que fixou geograficamente a fronteira no alto Cassai e lago Dilolo, situando este último na linha divisória das águas do Zaire e do Zambeze, e definindo por limite um afluente do Cassai que nascia no lago Dilolo.

 Situado em pleno coração do continente africano, o Congo Belga enfrentava um obstáculo vital ao seu desenvolvimento económico: o acesso ao mar. O rio Zaire revelou-se não navegável em todo o seu curso, nomeadamente na região das cataratas entre Matadi e Kinshasa. Neste sentido, o Governo belga desenvolveu uma intensa atividade junto do Governo português, de forma a obter a cedência de margem esquerda do rio Zaire, para aí construir um porto suficientemente capaz de responder melhor que Matadi, posteriormente, para permitir a modificação do traçado da linha férrea nos primeiros 30 km.   

 Esta questão foi resolvida, em 22 de Julho de 1927, com a assinatura da convenção sobre a troca dos territórios, cedendo Portugal à Bélgica 3 km2 entre o rio M´pozo e o rio Duizi, no norte de Angola, próximo de Matadi, recebendo em troca um território de 3500 km2 situado entre o rio Cassai e o rio Luao, no extremo Sudoeste da colónia Belga.

  • A delimitação da fronteira Leste e Sudeste

 A fronteira leste e sudeste de Angola com a Rodésia manifestou-se de extrema complicação. A questão foi resolvida por meio de arbitragem, em que ficaram reconhecidas a Portugal quatro quintas partes deste território contestado pela Inglaterra, compreendida cerca de mais ou menos de 30.000 km2, tendo Portugal perdido territórios consideráveis na África Central, ficando para sempre desfeita a ambição secular da ligação entre Angola e Moçambique[14]. Deste modo, Angola viu assegurada a área que lhe assinalava a carta de 1900.

 Só em 18 de Agosto de 1931 forem assinalados a ata final e um acordo em que ficou descrita a fronteira desde Andara até Katima, ao Sudoeste africano e à Rodésia[15]. Desta forma se regularizou definitivamente a questão do Barotze, e concomitantemente os limites da fronteira Sudoeste de Angola.

  • A delimitação da fronteira Sul

 As negociações sobre a delimitação das fronteiras do Sul de Angola com o Sudoeste Africano Alemão duraram cerca de um ano, Portugal afirmava que o limite sul de Angola era o paralelo do Cabo frio, situado em 18º 24´de latitude sul, por sua vez, Alemanha nas suas cartas fixava em 18º S.

 Em 23 de Setembro de 1928, assinou-se o ato de Kakeri (ponto de longitude 18º 25´06,2´´E), registando o fim das atividades de demarcação da fronteira entre o Sudoeste Africano e Angola. A linha de fronteira foi completamente limpa de mato e árvores, numa largura de 10 metros, até ao marco 28, e a partir deste, numa largura de 4 metros até ao marco 47[16].

 Assim, encerrou-se a série de controvérsias que envolveram a demarcação da fronteira sul de Angola, ficando definitivamente resolvida a questão da zona neutra, e assegurando-se a Angola a posse de retângulo de 4950 Km2 entre os rios Cunene e Cubango. Com a demarcação da fronteira sul, concluíram-se os trâmites para a fixação das fronteiras terrestres de Angola.   

 Contudo, delimitação e a demarcação da fronteira marítima sul vieram a ser firmadas entre os Governos da República de Angola e da Namíbia, através da Resolução n.º 3/03 de 3 de Fevereiro.     

  • Proteção da costa marítima Sul e Norte

 A proteção marítima é essencial para o exercício da soberania do Estado ribeirinho. A região naval norte angolana partilha 524 km de fronteira com às Repúblicas do Congo Brazaville e Democrática do Congo, repartindo 304 com o primeiro e 220 com o segundo, controladas por 16 postos fronteiriço, terreste, fluvial, marítimo e aéreo, sendo que, os postos de Massabi e do Yema são os mais sensíveis onde se tem registado maior invasão dos imigrantes ilegais que atravessam a fronteira por via marítima. Mediante a vulnerabilidade desta região urge a necessidade estratégica de um poder naval mais operacional, com meios navais e aeronavais que permitam o melhor controlo de fiscalização de patrulhamento constante na orla costeira marítima desta zona.  

Porém, enquanto não se celebrar o tratado de delimitação e demarcação com a RDC e este país não alcançar a paz ao conflito armado, então a fronteira marítima norte continuará a vislumbrar sérias ameaças.

 Tendo em conta o cenário atual da geopolítica da África Austral, e a necessidade de ter uma nova perspetiva e acautelar as potências ameaças que possa surgir, exigisse da Marinha de Guerra Angolana recursos humanos com formação e treno adequados, recursos materiais que se traduza numa elevada operacionalidade dos meios navais que possa dar resposta pronta e eficaz ao conjunto de missões que lhe são atribuídas e aos desafios de defesa e segurança que se lhe depara.

 Caso seja deferido o pedido o pedido de extensão da plataforma continental, este espaço aumentará substancialmente para 350 milhas náuticas e que para isso será necessário adquirir ou construir navios e patrulhas marítimas, neste contexto Sachipengo Nunda reconhece que “as forças navais são incipientes e quase estéreis para patrulhar e defender a costa marítima bem como as frotas petrolíferas até ao Golfo da Guiné”[17].

 Os meios que compõem o dipositivo naval encontram-se assim entregues a vários organismos, designadamente: 3 navios de vigilância e investigação pesqueira da classe Ngola Kiluange (Ministério das Pescas); 2 aeronaves de patrulha marítima, nomeadamente, Fokker E-27-200 MPA e C-212 Aviocar (Força Aérea); 1 Sistema de defesa costeira (defesa antimíssil) SS-C-1B Sepal; 4 navios patrulha da classe Rei Madume; 5 navios patrulha Imperial Santana; 5 lanchas rápidas PCV-170 e 5 navios patrulha costeira da classe Bula Matadi. Para Eugénio Costa Almeida sustenta que se todos materiais navais tivessem sob total jurisdição da Marinha de Guerra não se verificaria uma situação de abandono de proteção na orla costeira, bem como, as obrigações internacionais[18].

 Discordamos desta opinião, visto que, compete a MG proteger o espaço marítimo do território nacional, não é o facto de outros órgãos estatais adquirirem matérias marítimo próprio que lhe retira essa competência. Entendemos que a incapacidade e a ineficácia da MG em dar resposta aos novos desafios prende-se na falta de recursos financeiros e humanos capacitados.

 Na costa fronteiriça sul a marinha Namibiana tem feito vigilância nas águas de jurisdição angolana. Organizada do zero após conquista da sua independência em 1990, através do acordo de cooperação naval com o Brasil e do programa de formação de pessoal decorrente numa diversidade com outros países como Africa do Sul, Estados Unidos da América, Índia, Alemanha e Noruega, bem como, missões combinadas de fiscalização das suas águas jurisdicionais em colaboração com a Espanha, Dinamarca, Noruega e África do Sul, desde 1994, a marinha Namibiana tem alertado a MG sobre as embarcações que escapam da vigilância namibiana para pescar milhares de tonelada de pescado nas águas angolana.

 Estabelece o n.º 1 do artigo 3.º da Resolução 3/03 de 3 de Fevereiro, que “ O ponto de partida para a determinação do Mar Territorial, Zona Económica Exclusiva e Plataforma Continental entre a República de Angola e a República da Namíbia, será a intercepção da linha de base e do paralelo de 17º 15′, Latitude Sul.

A partir desse ponto, sobre a linha de base a fronteira marítima estender-se-á ao longo do paralelo 17º 15′ latitude Sul em direcção Oeste, por uma distância de 200 milhas náuticas”.

  Por sua vez, o ponto 25 do Anexo B estatui que “Colocar pelo menos uma bóia luminosa e visível de dia e de noite na intercepção do paralelo 17º 15′ de latitude Sul com a linha de base no sentido Oeste”.

 Importa referir que, durante anos, isto é, após a independência e durante a guerra civil, Angola contava com o apoio da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas para o patrulhamento da sua orla marítima. Segundo Thomashausen este acto se traduziu numa maior invasão territorial, quer no âmbito de exploração do mar quer m termos da transposição das fronteiras[19].   

 A caminho de duas décadas de paz, é tempo suficiente de Angola afirmar o seu papel com o mar com homens equipados e treinados capazes de protegerem a soberania marinha contra as eventuais ameaças.  

  • A articulação de uma estratégia angolana para o mar

 Sendo Angola um país gratificado por uma extensa fronteira marítima, e um espaço marinho rico em recursos vivos e não vivos, em verdade o cidadão angolano não tem cultura marítima. Segundo os argumentos de Damião Fernando Capitango Ginga de que “a falta de cultura marítima do povo angolano resulta na fraca atitude e sensibilidade psicológica como um todo em relação ao Mar”[20], de igual modo, deve-se pelo passado histórico colonial «do mar veio o colono com a opressão, do mar foi levado o meu filho para escravidão».

 Todavia, tal como qualquer princípio ou motivação histórica surge do investimento dos povos a dada altura, com o mar não poderá ser diferente, pelo que o carácter nacional perante o mar, de hoje até às gerações futuras, irá ditar este pensamento e cultura marítima, numa perspetiva em que a propensão para privilegiar os assuntos do mar não é uma característica genética, mas sim adquirida e consolidada ao longo dos anos[21]. Contudo, o pensamento estratégico não está só condicionado pelo seu passado histórico, bem como, basado nos fatores de identidade nacional e do espírito de nação, de acordo com A. C. Ponte, áreas onde vai buscar as suas raízes mais profundas[22]. Daí que, a inserção estratégica resulte da conjugação entre os valores, os interesses, a geografia e a história.     

 A vocação marítima é uma orientação Política e Estratégica do Estado Angolano, assumindo a sua condição geoestratégica de ser um País com uma extensa orla costeira, em que uma parte muito significativa dos seus recursos naturais em reservas de hidrocarbonetos, estão situadas no mar ou muito próximo da costa, este desígnio nacional e opção estratégica fará todo o sentido. A somar aos recursos energéticos no mar, podemos ainda citar os interesses relacionados com a pesca, as vias de comunicação marítima, os meios de transporte marítimo, a gestão do ambiente marítimo e dos recursos marinhos, a segurança e defesa do mar, a investigação científica, para vir reforçar aquela opção.

 Tendo em conta a dimensão estratégica do Mar e o valor que este representa para Angola, como vector estratégico da sua política externa e como instrumento de poder e de influência no seio das Organizações Internacionais e Organizações Regionais Africanas em que está inserido, é importante que Angola desenvolva estratégias marítimas complementares para a consecução de metas e objetivos, incluindo a proteção do espaço marítimo, a prevenção de riscos, a identificação de ameaças, respostas coordenadas, responsabilização legal, a cooperação efetiva, a partilha de informações com os países da região do Golfo da Guiné, da região da África Central e Austral e no Atlântico Sul, e uma distribuição adequada e pragmática de recursos. De acordo com Damião Fernandes Capitão Ginga, “o maior envolvimento de Angola com o mar dependerá essencialmente da execução política, contanto que a estratégia depende exclusivamente da ação política”[23].

 Tal como opina Sacchetti “Angola deverá incluir a preocupação de desenvolver as capacidades para conhecer o Mar e para fazer conhecer a competência para bem gerir e defender a área oceânica da sua responsabilidade, bem como, para desenvolver uma cultura marítima que seja herdade pelas gerações vindouras”[24].

 A União Africana tem em vista o programa Estratégica Marítima Integrada de África 2050, que consiste em planos de longo prazo abrangentes, concertados e coerentes, com múltiplas ações que permite alcançar os objetivos da União Africana para melhorar viabilidade marítima para uma África próspera. Para a região do Golfo da Guiné essa estratégica constitui a conjugação de paz, segurança marítima e estabilidade, sendo que, o posicionamento de Angola nessa região é notório sobretudo pelas relações mantidas com São Tomé e Príncipe[25] que lhe confere uma vantagem estratégica em todo continente, servido de uma plataforma de controlo de toda a região e de base logística para a prestação de serviços à indústria petrolífera[26].

 É importante para Angola mantém o acordo com o Brasil no âmbito da Segurança e Defesa, numa perspetiva de dispor de um aliado forte no Atlântico Sul e reforçar a cooperação no Atlântico Norte, neste caso, com Cabo-Verde de formar a traçar um triângulo, isto é, Angola, Brasil, Cabo-Verde.

 No Domínio Marítimo Africano, a grande variedade de atividades relacionadas com os oceanos estão inter-relacionadas e todas têm um impacto potencial sobre a prosperidade através da contribuição na paz e segurança das populações.

  • Criação de Condições de Segurança que Garantam Proteger o Mar

 Como via indispensável para enfrentar os novos desafios, tem-se vindo a desenvolver um conceito alargado de segurança e o Estado angolano têm vindo a adotar novas estratégias e a ajustar a Marinha de Guerra em função daquelas. A nova ordem obriga a que a Marinha consiga garantir a segurança e defesa dos interesses da comunidade internacional, muito para além do tradicional conceito de segurança das fronteiras centradas no Estado.

 Face à realidade deste cenário, pode-se dizer que a resposta as novas ameaças conduziu a que a Estratégia Naval se voltasse para o litoral, onde se concentram a maioria dos riscos e ameaças, evoluindo no sentido da crescente utilização do mar como meio de projeção de poder sobre terra e do crescente envolvimento das Marinhas em tarefas de caracter securitário, o que implica grande sentido de cooperação entre a comunidade marítima internacional.

 Fazendo uma análise comparativa com as Marinhas da África do Sul, da Namíbia e da Nigéria podemos verificar que Angola, em termos de meios navais e poder naval, é dos quatro Países o que está mais limitado na realidade presente. Esperamos que esta situação possa inverter no médio prazo ao concretizar-se os planos de reedificação da MGA.

 Angola tem limites com os espaços marítimos da República Democrática do Congo e da R.D. Congo Brazzaville a norte e com a República da Namíbia a sul, a extensão da costa atinge cerca de 810 milhas náuticas e ao longo dela passam diversas rotas nacionais e internacionais, dispondo de portos comerciais de grande importância, como o de Cabinda, Soyo, Luanda, Lobito, Namibe e os de cabotagem de Noki, Ambriz, Porto Amboim e o do Tômbua.

 Nesta perspetiva tem a necessidade de garantir a vigilância e o controlo do seu espaço marítimo dispondo de uma Força naval bem equipada, treinada e determinada que seja capaz de, no mar, se impor pela dissuasão a qualquer tipo de ameaças externas.

 As principais prioridades de Angola, no seu contexto de Segurança e Defesa Nacional, em que é expectável e relevante a participação do seu poder naval e da componente naval do Sistema de Força Nacional, estão diretamente associadas às seguintes funções e tarefas[27]:

– Preservar a soberania e integridade territorial, sendo capaz de a restaurar em caso de agressão;

– Dissuadir qualquer tentativa de agressão externa;

– Ser capaz de garantir o funcionamento dos sistemas vitais do Estado, contribuindo na sua parte para as comunicações, transportes logísticos e de tropas;

– Controlar, patrulhar e verificar a sua área de interesse (MT, ZEE e Plataforma Continental);

– Proteger e evacuar cidadãos angolanos, em áreas de crise ou tensão;

Cooperar com outros países e organizações, como a UA, SADC, CEDEAO e CPLP, ONU, ou em parceria, conforme os requisitos do Estado Angolano;

– Dissuadir e combater, em articulação com o Ministério do Interior, o crime organizado, o tráfico de droga, a imigração ilegal para preservar a segurança do Estado no mar;

– Controlar o tráfico marítimo e o combate à poluição no mar, nas áreas de soberania e de interesse estratégico do Estado Angolano;

– Proteger os recursos naturais de Angola no mar;

– Participar em missões humanitárias e de apoio à paz da União Africana, da ONU e da CPLP;

– Participar e conduzir, de modo eficaz e articulado, com os outros Ramos das Forças Armadas Angolanas, operações para apoiar o governo em caso de crise ou em estado de sítio;

– Levar a cabo operações de busca e salvamento (SAR) nas áreas de responsabilidade do Estado Angolano;

– Controlar as operações de investigação e desenvolvimento autorizadas nas diferentes áreas de soberania do Estado Angolano;

– Proteger os santuários e reservas naturais marítimas do mar sob responsabilidade angolana

O Oceano Atlântico, na sua vertente mais a sul passou a ser uma área de interesse estratégico para os Estados ribeirinhos, e não só, levando estes a associarem-se em organizações multinacionais de âmbito regional alargado, com vista a colmatar as suas necessidades de segurança e defesa. Exemplo deste paradigma atual é a criação, relativamente recente, da “Zona de Paz e Cooperação do Atlântico Sul” (ZOPACAS) e da “Comissão do Golfo da Guiné” (CGG) que têm em vista contribuir para uma maior Cooperação entre os Países costeiros do Atlântico Sul, em ambas as margens.

 Até então, o Atlântico Sul era considerado tradicionalmente como uma zona secundária com reduzida densidade estratégica em que os estados costeiros dos dois lados viveram durante muitos anos de costas voltadas para o oceano e com os atores externos pouco interessados e ausentes, o que determinou a existência de um espaço pouco estruturado, flexível e sem posições de domínio consolidadas.

6. Conclusão

 Em suma Angola deve continuar a definir os seus objetivos, defender os seus interesses, orientar a sua estratégia e projetar a sua imagem para o mar, dentro do quadro geopolítico onde se insere, cuja valências devem ser complementares. Cabendo a ação da Marinha de Guerra orientada no desempenho das funções de defesa Militar e apoio política externa, segurança e autoridade do Estado e do desenvolvimento económico, científico e cultural, elementos essências à afirmação e proteção dos interesses nacionais no mar, o que implica capacidade de intervenção em todos os espaços marítimos, sendo que só a presença ininterrupto e o desenvolvimento eficaz destas três funções poderão reforçar a condição da Marinha como parceiro indispensável para a ação do Estado no mar, e ao mesmo tempo funcionar como fator de dissuasão e força de paz dentro dos marços das águas oceânicas nacionais, onde se torna importante controlar a ZEE do país, controlar a exploração dos recursos marinhos nacionais, proteger a base de intervenção da MGA, bem como, portos e golgos, impedir todas as atividades ilícitas no mar e águas internas na área de jurisdição angolana.   


[1] www.jornalangolaexpress.gov.com

[2] Idem.

[3] Joaquim Dias Marques de Oliveira, Os Caminhos Históricos das Fronteiras de Angola, p. 89.

[4][4] Joaquim Dias Marques de Oliveira, ob. cit., p. 17

[5] Joaquim Dias Marques de Oliveira, ob. cit., p. 18.

[6] Luciano Cordeiro, A Questão do Zaire, in Revista de Estudos Livre – I 1883, p. 82-262.    

[7] Visconde de Santarém, Demostração dos direitos que tem a coroa de Portugal sobre os territórios situados na costa ocidental de África entre o 5º e 8º de latitude meridional e por conseguinte aos territórios de Molembo, Cabinda, Zaire e Ambriz, Lisboa, 1885.
 

[8] Visconde de Sá da Bandeira, Faits et considérations relatifs aux droits du Portugal sur les territoires de Malembo, de Cabinda et d´Ambriz et autres lieux de la côte occidentale d´Afrique située entre le 5º degré 12º minutes et le 8º degré de latitude australe, Lisbonne, Imp. Nacionale, 1855, p. 43 ss.  

[9] Memorando do Ministro dos Negócios Estrangeiros ao Ministro de Portugal em Londres, de 8 de Novembro de 1882, no Volume dos Negócios Externos, 1884 (Questão do Zaire), p. 5. 

[10] Tratado de 26 de Fevereiro de 1885, in Negócios Externos 1884, Questão do Zaire, p. 185. 

[11] Idem p. 128.

[12]  Joaquim Dias Marques de Oliveira, Fronteiras de Angola e a Evolução Histórica, Coimbra, Novembro 2009.

[13] Joaquim Dias Marques de Oliveira, Os Caminhos Históricos das Fronteiras de Angola, p. 25.

[14] Joaquim Dias Marques de Oliveira, ob. cit., p. 75.

[15] Eduardo dos Santos, A Questão do Barotze, IICT, Lisboa, 1986.

[16] Diário do Governo 1ª série, n.º 222, de 25 de setembro de 1931.

[17]  Eugénio Costa Almeida, Angola e (Incipiente) protecção marítima nacional, Outubro, 2017, https://blog.cei.iscte-iul.pt/angola-e-a-incipiente-proteccao-maritima-nacional.

[18] Idem.

[19] A. Thomashausen, Angolan Maritime Security, in Revista de Ciências Sociais e Políticas, 2008, pp. 21-22.

[20] Damião Fernandes Capitão Ginga, Angola e a Complementaridade do Mar: O Mar Enquanto Factor Geostratégico de Segurança, Defesa e de Afirmação, Lisboa, 2014, p.124.

[21] A. E. F. Sacchetti, O Pensamento Estratégico e o Mar, in Nação & Defesa n.º 4 (122), 2009, p. 121.

[22] A. C. F. Ponte, Valorizar a componente marítima na defesa nacional, in Estratégia, 8/9, 1992, p. 72.

[23] Damião Fernandes Capitão Ginga, ob. cit., p. 183.

[24] A. E. F. Sacchetti, ob. cit. p.124.

[25] Armando Marques Guedes, As constantes emergentes e a atipicidade das linhas de força na política externa de Angola 1975-2002, in J. F. Paiva (Coord.), A Política Externa de Angola no novo contexto Internacional, Lisboa, Quidjuris, 2011, p. 62. 

[26] Foi assinado um cordo entre o Estado São-tomense e a Sonangol E.P, com vista a criar uma zona franca de fornecimento de combustível e prestação de serviço nesta região, num investimento de 20 milhões de euros que conferiu para o Angola uma concessão por 20 anos.

[27] Luís dos Santos, A Marinha de Guerra Angolana: Presente, Passado e Perspectiva para o Século XXI, Maio 2014, pp. 36 e 37, in https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/10093/1/TII-CMG%20LS%20%2819MAI%20QFinal%29%20vers%C3%A3o%20entregue.pdf



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