As três principais alianças entre empresas globais de transporte marítimo (a 2M, a Ocean e a THE Alliance), operacionais desde Abril de 2017, reúnem as oito maiores transportadoras marítimas do mundo, representam cerca de 80% do comércio mundial por contentores e absorvem 95% da capacidade instalada de navios nas rotas marítimas Leste-Oeste, pelas quais circula o maior fluxo internacional de carga contentorizada, revela o mais recente relatório do Fórum Internacional do Transporte (ITF, na sigla inglesa), uma organização intergovernamental com 59 países membros.
Denominado «The Impact of Alliances in Container Shippings», o documento analisa o impacto das alianças no transporte marítimo sobre a própria actividade, especialmente no que respeita ao tráfego de mercadorias em contentores, e mesmo sobre o transporte de mercadorias em geral, e apresenta recomendações para ultrapassar os efeitos negativos da concentração de negócios nesta área.
De acordo com o relatório da ITF, as primeiras grandes alianças nesta actividade remontam aos anos 90 do século passado e nessa época constituíram uma forma de cooperação entre pequenas empresas de transporte, que começaram a fundir-se para gerar economias de escala. Hoje, são instrumentos das grandes linhas de transporte marítimo internacional, o que revela a evolução feita por este meio de organização da actividade.
Considerando que as alianças permitiram às empresas de transporte marítimo construir e explorar os mega-navios, o ITF relaciona directamente as alianças com o excesso de capacidade instalada nesta actividade. As alianças contribuíram igualmente para menor frequência de serviços, menos ligações directas entre portos, declínio da fiabilidade nos calendários dos navios e maiores tempos de espera dos navios. Tudo isto gerou mais tempo de transporte e mais incerteza entre os carregadores, diz o ITF, acrescentando que estas alianças provaram serem instáveis, o que significa que, estando as maiores empresas do sector em alianças, mudanças numa das empresas podem afectar a actividade como um todo.
Outro efeito das alianças foi a concentração de redes portuárias e maiores transferências de carga de um porto para outro, quando as alianças mudam de rede portuária. Diz também o ITF que “nos portos, o poder aquisitivo das empresas das alianças pode criar uma concorrência destrutiva entre outros fornecedores de serviços portuários, como as empresas de reboques”.
Este efeito pode diminuir o retorno dos investimentos feitos nos portos, provocar o declínio de portos mais pequenos de contentores e originar o desaparecimento de operadores portuários independentes de menor dimensão, como as empresas de reboques. As alianças também geram preocupações devido à influência que têm capacidade para exercer junto dos portos, reclamando investimentos em infra-estruturas públicas mais dimensionadas aos seus mega-navios que nem sempre correspondem a soluções económicas racionais.
O ITF lembra também o risco gerado pela concentração das alianças na concorrência. E recorda que as quatro principais empresas de transporte marítimo representam actualmente 60% do mercado internacional do transporte de contentores. Além disso, a quota de mercado da maior empresa (19%), só por si, é maior do que a de qualquer grande aliança do sector existente antes de 2012, o que traduz a natureza diferente das alianças actuais.
Desta concentração decorrem obstáculos à entrada de novas empresas nas rotas marítimas Leste-Oeste (só as maiores podem competir nos serviços Ásia-Europa fora de uma estrutura de alianças). Por outro lado, as alianças podem provocar fenómenos de cartelização de preços em prejuízo dos seus concorrentes. Além disso, graças ao seu elevado poder de influência e negociação, podem provocar a perda de qualidade de portos e a integração vertical das empresas reunidas nas alianças nos serviços portuários. Esta realidade levou a que a quota de mercado de operadores portuários dominada pelas empresas de transporte marítimo tenha passado de 18%, em 2001, para 38% em 2017.
Face a este cenário complexo e de forte concentração de negócio gerado pelas alianças, induziu o ITF a recomendar menos isenções aplicáveis às empresas de transporte marítimo em matéria de regras da concorrência, avaliações mais sólidas relativamente a projectos de investimentos em infra-estruturas portuárias e menos dependentes do interesse das empresas de transporte marítimo, e ainda políticas portuárias mais coerentes destinadas a clarificar papéis e evitar a sobre-capacidade.
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