Opiniões não faltaram, discussão também não, neste fim-de-semana, no Surf Out, cujo objectivo era “debater o estado do surf em Portugal” num evento que “celebra a indústria” e que acolheu muitos surfistas e amantes do desporto para visitar, conhecer marcas e “catrapiscar” este mundo, num evento cujo investimento foi de cerca de 50 mil euros.
E antes do evento, na passada Quinta-feira, os irmãos ofereceram um workshop de inovação a todos os expositores para estimular os agentes económicos a pensar numa forma mais criativa no seu dia-dia, numa tentativa de levar o sector a ficar “mais forte, mais profissional e mais unido”, que explicam a sua grande ambição.
“A Música encaixa mais no surf do que o futebol”
E se o desafio for publicitar o surf? As marcas entram nos campeonatos para investir, pelo que, quer sejam marcas de surf ou não, o seu investimento no desporto é bem-vindo, explica Ivo Purvis, Vice-Presidente do Clube Criativos de Portugal, presente na organização da campanha de sucesso da onda da Nazaré que passou no grande ecrã de Times Square, em Nova Iorque. Mas para isso, as marcas têm de entender “como a comunidade vive e o que a move”, explica, concluindo que também é uma questão de oportunidade.
Portugal está a viver um dos melhores momentos no que respeita à ligação das marcas com o surf. E hoje em dia, com a alta tecnologia que se desenvolveu, Miguel Guerra, do gabinete de Marketing e Comunicação da MEO, exemplifica com a Altice Portugal, uma das maiores marcas fora do surf a investir na modalidade, demonstrando que as marcas acabam por ser um grande contributo no desporto, pois permitem, entre outras coisas, melhores condições para os surfistas treinarem e promoverem-se, não só em Portugal.
A imagem dos atletas, o investimento nos demais eventos em Portugal, são mais valias que não podem ser esquecidas, pois são quem constrói a imagem do “Portugal do surf”. O que, no entanto, pode por vezes romper com a imagem inicial do surf – mais pura, mais apaixonante. Na opinião de Álvaro Costa, Manager da Polen Surfboards, há uma grande mudança, e não é muitas vezes para melhor, pois as crianças, que há anos surfavam simplesmente pelo prazer de surfar, hoje surfam a pensar em competição, ou, na pior das hipóteses, é uma escolha dos pais como forma de entretenimento que os deixa mais “livres”.
No entanto, o surfista mais experiente do painel afirmou que os valores do desporto não se podem perder – a liberdade, a irreverência, a ligação com a natureza do mar, naquele que se pode considerar um estilo de vida mais simples, um “estilo de vida e uma forma de estar que respeitam a energia do planeta”, conclui.
Várias são as opiniões que asseguram que não está tudo a mudar, há naturalmente espaço para todos – para os que simplesmente fazem surf e para os que querem competir – e portanto, na opinião de Miguel Guerra, o surf tem de ter conteúdo, tem de contar uma história, e neste contexto, o Surf Out é irreverente, pois é mais uma forma de viver o surf, porém diferente.
Nesta que é a que Frederico Teixeira, da Ocean Events, considera a “fase de maturação do surf”, pois o país virou-se para o mar num ápice e de repente a praia de Carcavelos está cheia de surfistas, há que começar a trabalhar na “mentalização e consciencialização da utilização das praias e até de parques de estacionamento”, conclui.
“O surf faz parte da nossa vida”
Os irmãos que organizaram o evento começaram a fazer bodyboard muito cedo, depois passaram para o surf e desde então “o surf faz parte da nossa vida, molda quem nós somos, as nossas relações”, como conta ao Jornal da Economia do Mar Salvador Stilwell.
Naquele que foi o percurso habitual de um jovem surfista, os irmãos competiram e desde cedo sonharam fazer algo que fosse profissionalmente ligado ao surf. Como “infelizmente não conseguimos ser surfistas profissionais”, explica, decidiram enveredar pelo “outro lado do surf”, aquele que se tem vindo a emancipar em Portugal – o lado comercial.
Com bases de comunicação, pois o Patrick Stilwell trabalha como estratega publicitário numa das maiores agências publicitárias do país, Partners, e de feiras, Salvador trabalhava na exportação de vinho português. Como isso implicava andar sempre a vender do lado do expositor, acabaram por se inspirar na criação desta feira que pode agregar todo o sector do surf em Portugal.
“O surf já percorreu um longo caminho nos últimos anos, pelo que merece que se celebre a indústria e quem está por trás dela”, explica Salvador que, considerando este o ano “zero”, gostaria de caminhar no sentido de tornar o evento internacional, trazendo expositores de outros países para se reunirem com os vários produtores e retalhistas.
Quando questionado sobre a irreverência do surf, para alguns perdida nestas “ondas” de comercialização, Patrick expõe a sua visão: “a irreverência pode ser conotada com rebeldia ou com pensamento inovador”, e avança que não especificamente neste caso, mas o facto é que “vivemos numa indústria que vive um contrassenso de usar produtos à base de petróleo para quase todo o material acessório que existe à volta do surf” e por isso o surfista vê na profissionalização um passo para inovar, e portanto “para criar valor para o sector” e evoluir a todos os níveis, nomeadamente o sustentável.
Sendo que acredita igualmente que “temos espaço para abrir a base a mais participantes”, e o que está a acontecer é que também temos cada vez melhores condições para iniciados, portanto a “plataforma disponível para um surfista mediano está mais facilitada, o que faz com que haja mais interpretações, opiniões e naturalmente mais riqueza, pelo que o nicho que tinha um determinado imaginário à volta do surf, que era de rebeldia e radicalidade, hoje em dia há quem o tenha, mas também há aqueles que procuram um life-style saudável, há os que praticam só como desporto”. Assim, na sua opinião, estas várias “interpretações do surf” só trazem riqueza ao desporto.
Os turistas? Há os que vêm à procura de boas ondas e os que se vêm iniciar. Os que vêm à procura de ondas, preferem o “país selvagem” que, na sua opinião, ainda temos, e confessa surfar todos os fins-de-semana sozinho. Os outros, esperam a tal estrutura e organização, que começa agora a existir.
Em termos de regras, a legislação permite que a conduta de todos seja a mais pacífica possível, mesmo dentro do mar, o que, podendo ajudar a uma melhor convivência, faz todo o sentido.
Já a palavra-chave, sustentabilidade, na opinião dos irmãos, gira à volta de inovação e de profissionalização, pelo que estas são fundamentais para o sector. A aliar a uma maior comunicação entre as marcas portuguesas, em primeira instância, para que possamos “caminhar para o mesmo lado” e fazer crescer o surf em Portugal de uma forma inteligente e sustentável.
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