O Comité para a Protecção do Meio Marinho (MEPC, em inglês) da Organização Marítima Internacional (IMO) decidiu implementar a redução do teor de enxofre nos combustíveis marinhos para 0,5% a partir de 1 de Janeiro de 2020. A decisão foi tomada durante a 70ª sessão do comité, que decorreu de 24 a 28 de Outubro, em Londres, e constitui “um marco para o ambiente e para a saúde humana”, refere o MEPC em comunicado.
O secretário-geral da IMO, Kitack Lim, acolheu a decisão com agrado e considerou que ela reflecte a determinação da organização em garantir que o transporte marítimo internacional continua a ser o modo de transporte ambientalmente mais saudável e que o seu impacto será significativo para o ambiente e a saúde das pessoas, especialmente “das que vivem em cidades portuárias e comunidades costeiras, longe das zonas de emissões controladas”.
Segundo alguns estudos, o limite de enxofre permitido nos combustíveis marinhos é 3.500 vezes mais elevado do que o autorizado para o diesel utilizado em automóveis e camiões na Europa, o que torna a indústria do transporte marítimo a principal emissora de dióxido de enxofre. A implementação da medida em 2020 permitirá reduzir essas emissões em cerca de 85% face aos níveis actuais.
O teor de enxofre autorizado nos combustíveis marinhos em vigor é de 3,5%, desde 2012, excepto nas zonas ECA (Emissions Control Areas) – que actualmente são o Mar do Norte, o Mar Báltico, zonas costeiras dos Estados Unidos e Canadá e zonas costeiras nas Caraíbas (ao largo de Porto Rico e das Ilhas Virgens) -, onde o limite é ainda mais restritivo (0,10%), mas a data de alteração desse limite para 2020 está prevista nas emendas ao Anexo VI da Convenção Internacional para a Prevenção da Poluição por Navios (MARPOL) adoptadas em 2008.
A confirmação da data, no entanto, ficou dependente de uma revisão dos seus pressupostos, a ter lugar em 2018, quando se avaliaria se a disponibilidade de combustível em 2020 seria suficiente para fazer face às exigências de um novo limite ao teor de enxofre, sob pena de adiar a medida para 2025. Como a revisão ficou concluída este ano e não identificou problemas de abastecimento (na sequência e um estudo encomendado pela IMO e publicado em Agosto), a IMO antecipou a decisão em dois anos e no sentido da adopção do novo limite para o teor de enxofre.
Os pressupostos da IMO, no entanto, não são pacíficos. Antes da reunião do MEPC, a BIMCO, uma associação internacional composta por elementos do sector do transporte marítimo, contestou o estudo da IMO em vários aspectos: qualidade do combustível, capacidade de resposta das refinarias para responder às novas exigências já a partir de 2020 e o efeito da medida no mercado. Combustível pouco seguro, insuficiente e potenciador de riscos para o mercado.
Numa reacção à decisão, a BIMCO admitiu respeitá-la, mas registou as preocupações colocadas por vários Estados membros da IMO sobre a disponibilidade de combustível e das refinarias para lhe dar resposta, em algumas regiões do globo. Embora reconheça a importância da medida, a BIMCO não deixa de considerar que o período até 2020 será altamente desafiador para o sector e mantém a sua perspectiva original de que existem riscos. ”Continuamos a sustentar que não vai ser um passeio no parque”, afirmou Lars Robert Pedersen, secretário-geral Adjunto da BIMCO numa declaração sobre o assunto. O mesmo responsável, antes da sessão do MEPC, tinha mesmo considerado que seria irresponsável tomar esta decisão.
Em sentido contrário, a coligação SEA/LNG, criada para acelerar a utilização do gás natural liquefeito (GNL) pronunciara-se sobre a preparação da indústria ligada a este tipo de combustível para acompanhar qualquer decisão da IMO. E na mesma ocasião, foi divulgado que investigadores norte-americanos e finlandeses tinham concluído que o adiamento da implementação da medida para 2025 significaria a morte prematura para cerca de 200 mil pessoas, resultante dos vapores tóxicos nas comunidades costeiras de países em desenvolvimento (134.650 na Ásia, 32.100 em África e 20.800 na América Latina).
Entretanto, grupos ambientalistas, como o Transport & Environment e a Seas At Risk, membros da Coligação Clean Shipping, já saudaram a decisão. Bill Hemmings, da Transport & Environment, declarou que “esta decisão reduzirá a contribuição do shipping para a poluição atmosférica de 5% para 1,5% e salvará milhões de vidas nas próximas décadas”. John Maggs, da Seas At Risk, declarou que “um combustível marinho limpo será uma realidade legal em 2020” e que “milhões de mortes prematuras serão evitadas em todo o mundo, que será literalmente um lugar onde se poderá respirar mais facilmente”.
Por seu lado, o secretário-geral das Associações de Armadores da Comunidade Europeia (European Community Shipowners’ Associations, ou ECSA), Patrick Verhoeven, considerou que a adopção da medida “são boas notícias”, até porque os “armadores precisam de certezas”. No entanto, o mesmo responsável considerou que “2020 é já amanhã, pelo que temos que acelerar a implementação”. E destaca que há que garantir que “existe combustível de qualidade em toda a parte”.
De acordo com a IMO, continuarão os trabalhos no sub-comité para a Prevenção e Resposta à Poluição (Sub-Committee on Pollution Prevention and Response ,ou PPR) para a implementação efectiva da medida. A organização aproveitou o momento para esclarecer que a expressão “combustível usado a bordo”, ao qual se aplica a medida agora em questão, envolve os motores principais e auxiliares e as caldeiras. São admitidas excepções em casos que envolvam a segurança dos navios ou o salvamento de vidas no mar, ou ainda se um equipamento estiver danificado.
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