A maioria das actividades relacionadas com a economia do mar em Portugal (83%) evoluíram favoravelmente entre 2014 e 2015, de acordo com a mais recente análise «LEME – Barómetro PwC da Economia do Mar», que será divulgada publicamente no próximo dia 19 de Janeiro. A evolução foi tal que Miguel Marques, um dos responsáveis pela análise, admite que a economia do mar possa atingir um ritmo de crescimento superior ao da economia nacional.
De acordo com a análise, que a PwC realiza pela sétima vez, os indicadores que mais cresceram neste período foram o registo de navios, a actividade de cruzeiros, a carga em portos e as exportações da fileira alimentar do mar.
Dos 42 indicadores avaliados a partir de 13 sub-sectores, apenas seis evoluíram negativamente (produção nacional de aquacultura, número de embarcações pesqueiras nacionais que descarregam peixe em Portugal, número de processos de emissão de cartas ou equiparadas na náutica de recreio, pessoal militar ao serviço da Marinha, valor dos capitais seguros no ramo não vida em marítimo e transportes e ainda valor dos empréstimos de entidades financeiras monetárias a sociedades não financeiras na pesca, aquacultura e transportes por água).
Num sétimo caso, a diminuição do número absoluto representa uma evolução positiva: o das vítimas mortais ou desaparecidos registados pelas Acções Save and Rescue (SAR), pela Direcção-Geral da Autoridade Marítima (DGAM) e pelo Instituto de Socorros a Náufragos (ISN).
No caso do registo de navios, a análise da PwC identificou um crescimento no número de navios em ambos os registos nacionais (convencional e Registo Internacional de Navios da Madeira – MAR) e na tonelagem de arqueação bruta dos navios de comércio do MAR. Já a tonelagem de porte bruto das embarcações do registo convencional não teve alteração.
O documento da PwC também inclui resultados de um inquérito realizado a 50 personalidades relacionadas com a economia do mar em Portugal, de acordo com o qual 85% dos inquiridos consideraram que o nosso país, sendo costeiro, “rentabiliza de forma insuficiente todos os recursos que o mar pode dar”. E 97% consideraram que, no nosso país, “a economia do mar tem potencial para melhorar a balança comercial portuguesa”.
Características e desafios
A análise explora ainda, de forma sucinta, a situação de alguns dos sub-sectores analisados, como a construção e reparação naval, os transportes marítimos, portos, logística e expedição, a pesca, aquacultura e indústria do pescado, a acção do Estado no mar, o entretenimento, desporto, turismo e cultura, os seguros e o financiamento marítimos e a formação, conhecimento e emprego no mar.
Na construção e reparação naval, a PwC destaca a crise vivida nos países desenvolvidos e a vantagem competitiva de Portugal devido à sua localização, condições climatéricas e mão-de-obra especializada. Países com mão-de-obra barata ou com tecnologia mais evoluída, no entanto, constituem forte concorrência.
Entre os desafios apontados a este sector da economia do mar portuguesa estão o reforço do investimento, a inovação e especialização em nichos de mercado, a sustentabilidade como factor diferenciador, o desenvolvimento de parcerias (em particular com países de língua oficial portuguesa) e a diversificação do catálogo de produtos.
No transporte marítimo, portos, logística e expedição, os principais desafios são o melhoramento das condições técnicas dos portos, que devem passar a ser vistos como plataformas logísticas integradas em cadeias internacionais, a redução da carga fiscal e da burocracia nas transacções portuárias e a refundação da marinha mercante, entre outros.
Na pesca, aquacultura e indústria do pescado, Portugal conhece uma importação elevada, queda no número das embarcações pesqueiras e uma falta de dimensão nas empresas de aquacultura que lhes confira economias de escala. Mas o volume de exportações de produtos de pesca regista crescimento (entre 2014 e 2015).
Mais valor para o produto base primário, ou seja, o peixe e o marisco, reforço da captura sustentável com certificação de processos e comunicação adequada ao consumidor, substituição de importações por produtos nacionais, reforço da marca nos produtos transformados, novas tecnologias e processos capazes de reduzir custos de combustível, entre outros, são desafios adiantados pela PwC neste sub-sector.
A consultora também destaca o papel do Estado na defesa e segurança no mar, designadamente, através do aumento do número de horas de patrulhamento marítimo da GNR, do aumento de número de praias com bandeira azul e da diminuição de vítimas mortais ou desaparecidos. Aqui, os desafios são a coordenação e interligação das políticas de defesa nacional com o reforço da economia do mar e a salvaguarda do meio marinho.
No sub-sector do entretenimento, desporto, turismo e cultura, entre 2014 e 2015, a PwC registou o aumento do movimento de passageiros de cruzeiros e do número de escalas, bem como do número de hóspedes de hotelaria costeira (considerando aqui os casos em que as vistas para o mar constituem um factor essencial do alojamento hoteleiro, designadamente, nas Regiões Autónomas e na costa algarvia).
Entre os desafios, a análise salienta a dinamização da náutica de recreio através de desportos aquáticos, o aproveitamento do branding Madeira e Algarve e o desenvolvimento do branding Açores, a capitalização do branding Douro e o desenvolvimento da náutica de recreio, das marinas e das actividades marítimo turísticas para níveis internacionais.
No segmento financeiro (seguros e financiamentos), a análise admite que os seguros continuarão a ser estruturantes “no apoio à cobertura de riscos inerentes a todas as actividades da economia do mar”, mas que uma evolução positiva dependerá do crescimento na construção/reparação naval, nos transportes marítimos, nos portos, na logística e expedição, na pesca e aquacultura, na indústria do pescado e no turismo.
Relativamente ao financiamento, a PwC admite que “a turbulência nos mercados financeiros” tem dificultado o acesso ao capital por parte de sectores novos na economia do mar, como os ligados à alta tecnologia e inovação que, “por serem novos, não têm histórico, logo, esbarram na aprovação de produtos tradicionais”. Uma dificuldade que se estende aos sectores tradicionais, que apesar de um histórico, têm “dificuldades estruturais, afastando as mesmas fontes tradicionais de financiamento”.
No plano da formação, conhecimento e emprego marítimo, os desafios identificados são, essencialmente, a qualificação dos recursos humanos, a dinamização da economia do mar para gerar um impacto positivo no emprego e o aumento do conhecimento e na investigação científica do mar português.
Uma visão integrada
Em termos gerais, os autores da análise, que foi concebida para apoiar “Governos, indústrias, decisores políticos e comunidades costeiras”, consideram que uma abordagem integrada das actividades da economia do mar pode gerar benefícios a longo prazo.
E Miguel Marques comparou um eventual papel de Portugal, na sua zona geográfica, com o papel desempenhado por Singapura na sua área de influência. Além da estar na Ásia, que é hoje uma zona de enorme dinamismo comercial, Singapura complementou os seus serviços portuários com serviços financeiros, de seguros e de logística orientados para essa actividade e adaptou a sua estrutura de governance no mesmo sentido, com os resultados que hoje se conhecem.
Actualmente, segundo o documento da PwC, Singapura tem uma frota marítima que ocupa o 5º lugar mundial em porte bruto (dwt), depois da Grécia, Japão, China e Alemanha, e o mesmo posto em número de navios (2.356), depois da China, da Grécia, do Japão e da Alemanha, por esta ordem. Além disso, em 2014 tinha um porto entre os 20 principais do mundo em movimento de contentores e que detinha o segundo lugar mundial em quota de mercado nessa matéria.
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