Um planeta, um oceano e Portugal no meio das contaminadas ilhas de plásticos que se estão a formar. Será este o destino ou há uma saída?
Plásticos

No dia Internacional sem Sacos de Plástico, o Jornal da Economia do Mar faz uma recolha do que se tem feito para erradicar este problema. A questão coloca-se quando percebemos que cerca de 70% da superfície do planeta é coberta por oceanos e que cerca de mais de 50% do oxigénio que respiramos vem dos oceanos, nomeadamente das algas. Ora, poderão os plásticos estar a ameaçar toda a vida marinha e para além desta, a nossa também?

O plástico, como componente orgânico de polímeros sintéticos produzido com petróleo para os mais variados fins, geralmente com durabilidade elevada, é o material responsável por muitos desastres que temos assistido ultimamente. Recorde-se a baleia que morreu recentemente na Tailândia por ter ingerido mais de 80 sacos de plástico ou o branqueamento da maior barreira de coral do mundo na Austrália.

Vários estudos apontam para oito milhões de toneladas por ano de lixo plástico e derivados lançados aos oceanos. Estima-se que apenas 30% desses plásticos se encontrem à superfície, estando a maior parte na coluna de água e no fundo dos oceanos.

Desde cotonetes, palhinhas a sacos de plástico descartáveis, vão parar aos oceanos e deterioram-se, dando origem a pequenas partículas – microplásticos (até 5 milímetros) – que são ingeridas pelos animais marinhos e podem levar à sua morte. Através de peixes, os microplásticos chegam à cadeia alimentar humana.

Por ano, a Europa produz cerca de 58 milhões de toneladas de plástico, sendo que Portugal contribui com cerca de 370 toneladas, segundo dados da Eurostat, ou seja, uma média de 31kg por pessoa, valor que se encontra acima da média europeia. Sendo que 40% são embalagens, 22,5% são bens de uso doméstico, 20% estão em edifícios e construção, 9% estão nos automóveis e camiões, 6% estão no equipamento eletrónico e 3% na agricultura.

O grande problema é que há plásticos que não são facilmente recicláveis. Há plásticos “misturados com metal, e com outros componentes, o que significa que para reciclar a dificuldade é tanta que não há indústria que o faça, e quando o faz, muitas vezes é para fazer canos, ou objectos de jardim, mobiliário urbano. Mas infelizmente não há mercado”, refere Ana Loureiro, Directora de Comunicação da EGF (Environmental Global Facilities). De modo que o grande objectivo é “conseguir que os fabricantes, quando colocam os objectos no mercado já tenham em atenção que estes objectos têm de ser reciclados ou reutilizados melhora ainda antes de ser lixo”, explica.

 

Portugal toma consciência…

 

Os portugueses produzem muito lixo – 1,29kg por habitante/dia. A meta que temos para atingir é uma redução de 10% até 2020, sendo que ainda só reciclamos 38% do lixo que produzimos, apesar dos 50% que se ambicionam para 2020.

Segundo a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), a primeira grande Estratégia sobre os Plásticos foi apenas adoptada este ano, a 16 de Janeiro, pela Comissão Europeia, fazendo parte do intuito da Europa de se adaptar à economia circular, também como forma de seguir os Objectivos de Desenvolvimento Sustentável da União Europeia.

Mas Portugal, neste sentido, implementou a primeira grande iniciativa em Fevereiro de 2015, quando introduziu a taxa sobre os sacos de plástico. No entanto, após essa medida, o consumo de sacos de lixo em Portugal aumentou 40%. Ainda que houvesse indicações de que o uso dos sacos leves, antes gratuitos, tenha diminuído substancialmente. A preocupação dos cidadãos que antes utilizavam os recipientes gratuitos dos supermercados para levar garrafas, papéis e embalagens para o ecoponto, começou a existir – ao ponto de se depositar o lixo directamente no contentor, o que aumenta o problema das escorrências, mas é benéfico para o ambiente.

 

Mas afinal de onde vêm os plásticos?

 

Estes são problemas que ultrapassam em muito a dimensão geográfica de cada país, pelo que a participação de todos é crucial. E se em Portugal e na Europa há uma grande estratégia neste sentido, noutras latitudes, como em África ou América Latina, não é tão visível. Com explica Ana Loureiro, o lixo num país menos desenvolvido, que ainda tem lixeiras públicas, entra no solo e contamina os lençóis freáticos e acaba no mar.

Segundo o Marine Litter Solutions, chegam ao oceano, da terra, todos os anos, 4,8 milhões de toneladas de plástico. Muitos dos plásticos não vêm dos barcos, dos pescadores ou do lixo da praia, como se pode pensar, mas das cheias. Um estudo recente da Universidade de Manchester, no Reino Unido, recolheu sedimentos em 40 locais no leito de dez rios no Noroeste de Inglaterra, cuja água segue até ao estuário Mersey, e verificou que as cheias tinham arrastado cerca de 70% dos microplásticos acumulados no leito dos rios, o que equivale a 0,85 toneladas ou 43 mil milhões de partículas arrastadas para o mar da Irlanda.

Também os rios de Portugal estão poluídos por plásticos. Existem factores determinantes na abundância das partículas, nomeadamente as ETARs e a densidade de população nos locais. Só na água do rio Antuã, onde está a maioria dos microplásticos em Portugal, segundo um estudo do MARE (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente), foram encontradas 306 partículas por metro cúbico.

 

Associações solidárias com a causa

 

A Quercus, Associação Nacional de Conservação da Natureza, é uma das associações em Portugal que está a desenvolver estratégias para este problema. “Repensar o Plástico” é um dos tópicos presentes na sua página, onde tratam de economia circular e explicam a estratégia europeia para os plásticos, definida pelo Ministério do Ambiente, que visa contribuir para uma mudança no paradigma.

Neste sentido, presente num comunicado, estão as conclusões da reunião da Comissão Europeia no mês passado, que incluem objectivos muito concretos, como um sistema de depósito para recuperar 90% das garrafas, uma aposta em sacos mono materiais e de espessura mais fina, de modo a garantir a reciclagem dos mesmos, uma redução nas tintas usadas para diminuir o impacto ambiental, a optimização das instalações de reciclagem existentes para certificar que há uma redução de contaminação, incentivos fiscais para promover soluções alternativas, bem como sensibilização para estas questões.

“Existem ainda muitas dúvidas sobre os pequenos gestos que em muito vão melhorar o desempenho ambiental dos portugueses. Por outro lado, mesmo que os portugueses queiram reduzir o uso de plástico descartável, ainda não são oferecidas muitas soluções alternativas reutilizáveis, ou quando querem separar, por vezes não existem recipientes que permitam essa triagem dos materiais para aproveitamento para reciclagem”, defende a associação Quercus em comunicado.

Também a Zero, Associação Sistema Terrestre Sustentável, a propósito do dia Mundial sem Sacos de Plástico, propôs ontem, em comunicado, que se faça algo concreto sobre esta questão. Uma avaliação da aplicação da medida da taxa sobre os sacos de plástico, desconhecida até hoje, mas crucial para entender a quantidade de sacos consumidos per capita, para que, se for necessário, estender-se a aplicação da lei. O alargamento da tipologia de sacos abrangidos, pois para a Zero não faz sentido restringir o tipo de sacos de plástico abrangidos pela taxa, todos deveriam ser taxados, na medida em que só assim poderá haver uma coerência na mensagem e uma maior facilidade na fiscalização e aplicação da eficácia da lei. E o alargamento do tipo de materiais abrangidos, pois um saco descartável sê-lo-á sempre, pelo que se apresenta fundamental reduzir o consumo de recursos. Substituir um material por outro não é o ideal.

 

Mas há soluções?

 

As soluções são várias. A Biome Bioplastics desenvolveu um copo completamente biodegradável e reciclável, utilizando materiais naturais à base de plantas. Composto de amido de batata, amido de milho e celulose, o principal constituinte das paredes celulares da planta, este “plástico”, denominado bioplástico, pode ser deixado num contentor de reciclagem de papel ou no lixo comum onde se colocam os restos de alimentos.

Em Portugal, as grandes cadeias alimentares também estão a trabalhar neste sentido. O Lidl, por exemplo, definiu uma meta: reduzir o consumo de plástico em pelo menos 20% até 2025. Para tal, a cadeia de supermercados irá implementar várias medidas associadas às embalagens dos seus produtos de marca própria, que representam cerca de 80% dos produtos, bem como as embalagens de marcas de fabricante.

Em comunicado, anunciou igualmente que “até 2025, 100% das embalagens plásticas de marca própria incorporam materiais recicláveis, apoiando assim parte da estratégia europeia para os plásticos apresentada recentemente pela Comissão Europeia”.

 

E o que posso eu fazer em concreto?

 

Cada vez mais há consciência destas questões e os outros países, atentos a estes problemas, estão a reagir. O Reino Unido, por exemplo, comprometeu-se a eliminar todos os resíduos de plástico evitáveis até 2042, e França introduziu a proibição de sacos de plástico de uso único. A Noruega implementou um depósito para as garrafas de plástico – ao depositar uma garrafa de plástico no local correcto e comprar outra, recebe-se uma moeda equivalente ao depósito.

O objectivo de assinalar esta data é chamar a atenção para a produção e consumo excessivo de sacos e mostrar algumas alternativas benéficas para o ambiente. A associação ambientalista Zero alerta para o facto de que, se nada for feito, em 2050 haverá mais plástico que peixe nos oceanos. A ONU lembra na sua página que oito milhões de toneladas de plástico acabam nos oceanos em cada ano. E que a poluição por plásticos custa a vida a um milhão de aves marinhas e a 100 mil mamíferos por ano.

O que se pode fazer para reverter a situação? Uma estratégia de limpeza dos oceanos, é importante. “Limpar é bom, mas limpar poderíamos limpar a vida inteira, é preciso reduzir na fonte”, explica Paula Sobral, do MARE. “As limpezas são boas e devem manter-se, são projectos interessantes, sobretudo porque sensibilizam as pessoas para esta causa”. Mas acima de tudo é preciso consumir menos. “Consumindo menos, também se produzirá menos. Porque os padrões de consumo é que são insustentáveis. As pessoas têm de pensar que têm de acabar com os hábitos que mantêm de uma forma automática. Deitar as beatas para o chão, usar materiais descartáveis, são gestos automáticos, muito difíceis de mudar, porque são comportamentos muito enraizados culturalmente nas pessoas”, mas é o que considera essencial e urgente.

Na internet está a decorrer neste mês um movimento vindo da Austrália, o «Plastic Free July», com o intuito de levar as pessoas a evitar o plástico durante o mês de Julho, alterando os seus hábitos diários. Este desafio tem compromissos concretos: evitar os sacos de plástico, evitar garrafas de plástico, palhinhas, assim como copos de café. Sendo que é dado à escolha se se aplicará durante um dia, uma semana ou o mês, na iniciativa que tem também como mote Protect the ocean.

 

Notícia actualizada às 11h36



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