Portos

Deverá arrancar a curto prazo o projecto do novo terminal de contentores do porto de Leixões, permitindo aumentar a capacidade instalada da infra-estrutura em cerca de 25 por cento, afirmou ontem o presidente da Administração dos Portos de Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL), Brogueira Dias.

A referência foi feita durante uma conferência dedicada à Evolução das Operações Portuárias, a segunda do ciclo «Atlântico Mais», organizada pela sociedade de advogados António Vilar & Associados.

Actualmente, o porto de Leixões tem 90 por cento da sua capacidade instalada. Tem uma capacidade próxima do milhão de TEU, que deverá passar para perto do milhão e 200 mil TEU com a concretização do projecto, que contempla ainda “um terminal ferro-portuário que liga directamente a ferrovia aos contentores”, referiu Brogueira Dias.

O projecto enquadra-se na adaptação dos portos à construção dos navios. ”Um processo de que os portos não se podem alhear”, afirmou o presidente da APDL. ”Já assistimos a isto, há 30 anos, com o aparecimento dos superpetroleiros”, acrescentou. Tal como então, estes grandes navios não fazem certas rotas porque excedem todas as capacidades. “Já não passam no novo Canal do Panamá e é por isso que surge a rota do Árctico como alternativa”, referiu. Mas o fenómeno cria situações que obrigam o bom senso a imperar, crê Brogueira Dias.

Embora o Plano Estratégico para o porto de Leixões deva ser apresentado até ao final do ano, segundo apurámos, o presidente da APDL adiantou estimativas relativamente ao terminal de cruzeiros, que “já tem 92 reservas de escalas para 2017, ano em que deverá receber cerca de 100 mil passageiros”.

Igualmente presente no painel de oradores, Álvaro Costa, da Trenmo e um dos autores do estudo de Junho deste ano encomendado pela Associação Comercial do Porto sobre «Terminais Portuários e Infra-estruturas Logísticas em Portugal», referiu que “o mercado do transporte marítimo está instável, vai continuar instável e há companhias que vão falir”.

Nesse contexto, recordou que as taxas de crescimento do tráfego de contentores são elevadas em Sines, que já é o terceiro da Península Ibérica nessa matéria. Para o especialista, o que colocou Sines no mapa, há cerca de 10 anos, depois de ignorado durante décadas, foi a consolidação do mercado do transporte marítimo e a consequente alteração de rotas. Isso fez com que passasse a fazer sentido ter um porto nessa zona.

No estudo de que Álvaro Costa foi co-autor, diz-se que “na estruturação da rede de transporte marítimo existem portos dominados por operações de transhipment, e que reflectem as estratégias de agregação e redistribuição de cargas entre rotas adoptadas pelas companhias de navegação”.

Diz-se também que “a posição na fachada Atlântica permite que Sines possa reforçar o seu papel enquanto porto para centralizar as operações de transhipment em Portugal; a proximidade face ao cruzamento de rotas favorece o aparecimento de um nó de agregação e distribuição de cargas” e que “é possível reforçar a integração de Sines no sistema portuário nacional, melhorando a conectividade com os restantes portos, por via marítima e terrestre”.

Refere-se igualmente no estudo que “assistindo-se a um aprofundamento das estratégias das companhias de navegação que escolhem Portugal como plataforma central para organização das suas operações”, ou seja, transhipment, deve o Estado responder com a disponibilização de Sines, por ser a alternativa economicamente mais vantajosa”.

Recorda o estudo que “o transhipment é uma estratégia de optimização logística perseguida pelas companhias de navegação, tendo em vista a redução dos custos (unitários) de transporte e a manutenção de frequência nas interligações marítimas entre portos distantes, elementos centrais de competitividade”. E acrescenta que “não obstante a natureza privada da decisão de transhipment – sobretudo, a ligação com o posicionamento e a estratégia da companhia de navegação – alguns factores explicam a emergência de alguns portos vocacionados para estas funções”. Como o porto de Sines.

Outro dos oradores, Vieira dos Santos, da TCL, destacou a evolução dos portos no plano económico. Para este especialista, hoje, o importante é o tempo de transporte, a qualidade do produto e o preço ao consumidor.

Depois de traçar a evolução económica dos portos, identificando momentos chave, como a introdução da máquina a vapor nas operações portuárias, do motor diesel, da electricidade e do contentor, apontou os novos rumos para a eficiência e eficácia portuária.

De acordo com Vieira dos Santos, “a operação portuária está a desmaritimizar-se e a voltar-se para terra”. A crescente personalização dos produtos induz a que se venda antes e produza depois. “É por isso que na cadeia logística surgem pontos nos quais se faz o ajustamento de produtos standard ao gosto do consumidor”, referiu.

Paralelamente, a era digital também caracteriza o rumo seguido pelas operações portuárias, colocando o desafio laboral na ordem do dia. Com menos carência de recursos humanos, os portos assistem à reacção dos trabalhadores portuários em defesa de postos de trabalho cada vez menos necessários, como resultado da mecanização e digitalização crescentes.

Vieira dos Santos comparou as recentes exigências dos trabalhadores do porto de Lisboa (contratos sem termo em vez de contratos a termo certo, promoções automáticas e garantia de que determinadas funções sejam definitivamente feitas por trabalhadores portuários), que situou ao nível do século XIX, com as dos trabalhadores do porto de Roterdão (adiamento por seis anos da entrada em vigor das novas tecnologias para evitar perdas de empregos), que situou ao nível do século XXI.

Outro orador, Moreira da Rocha, especialista em Direito Marítimo, recordou experiências vividas durante as crises dos portos portugueses na primeira metade da década de 80 do século passado. Segundo considerou, “o grande problema dos portos de todo o mundo, não só o de Lisboa ou o de Leixões, está nas exigências dos trabalhadores portuários”, que podem encerrar um porto.

Um encontro sobre evolução portuária não ficaria completo sem uma perspectiva histórico-arqueológica. Foi o que fez o historiador e arqueólogo Gonçalves Guimarães, a partir do exemplo do porto de Leixões e do papel que este foi desempenhando na economia local, regional e nacional ao longo dos tempos (Antiguidade, Idade Média, Expansão Marítima, época dos veleiros, navegação a vapor e actualidade).



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