A conclusão é do próprio José Monteiro Limão, Director da Transportes em Revista, no termo do Debate promovido ontem pela mesma revista no Alto dos Moinhos.

A concluir mais o debate ontem promovido pela Transportes em Revista no Alto dos Moinhos, José Monteiro Limão, o seu Director, afirmou peremptoriamente não haver em Portugal uma verdadeira estratégia para os portos nacionais.

A questão, ressalvou, não respeita ao trabalho realizado pelos respectivos agentes do sector, que considerou excelente, mas à ausência de uma clara determinação do Governo em determinar uma linha de desenvolvimento perfeitamente clara e consequentemente executada, não deixando, porém, de manifestar também a sua esperança de ver tal situação alterada a breve trecho com o novo Executivo.

O Debate, centrado sobre o Estudo da Autoridade da Concorrência sobre a Concorrência no Sector Portuário, teve igualmente como objectivo ouvir a opinião dos respectivos agentes portuários sobre o tema, representados pelas suas principais Associações.

Ao contrário do Seminário promovido pelo Jornal da Economia do Mar em Novembro passado, o primeiro realizado após a publicação do Estudo da Autoridade da Concorrência, dedicado em mais lato âmbito à Competitividade dos Portos Nacionais, este Debate centrou-se essencialmente, de facto, sobre o mesmo Estudo, não deixando porém de surgir, aqui e ali, essa mais largada preocupação com a competitividade, por vezes, de forma mesmo determinante.

O caso mais saliente, nesse domínio, foi Paulo Paiva, em representação da Associação dos Transitários de Portugal, não deixando de dar múltiplos exemplos negativos de concorrência dos portos nacionais com outros portos europeus, incluindo até Roterdão, para demonstrar como os clientes, além de um perfeito conhecimento do mercado, nem sempre consideram o tempo de trânsito como o elemento mais determinante de decisão, podendo aceitar tal facto se, entretanto, como já sucedeu, encontrarem outras vantagens que, para si, compensam largamente essa aparente desvantagem, sejam questões de preço ou outras. Levando a que Portugal possa não só perder real capacidade de prestar serviços directos a partir dos seus portos como, no limite, a perder inclusivamente volume de carga.

A introdução da questão mais alargada da competitividade no Debate não surpreendeu tanto mais quanto, de algum modo, não deixa também de estar subjacente ao próprio Estudo da Autoridade da Concorrência uma vez que, não deixando de ser a principal preocupação da Autoridade a supervisão da existência ou limitações à concorrência de per se, o objectivo último deverá ser sempre que a efectiva existência da mais livres concorrência conduza a um aumento de competitividade, sem o que nada teria sentido. Um ponto crucial, altamente debatido e não menos controverso, de facto.

Em síntese, o que se pode deduzir do Debate é que, talvez numa esmagadora maioria dos casos, não só a questão da concorrência não é uma questão que preocupe particularmente os agentes portuários como até consideram a questão mesmo como um eventual equívoco uma vez entenderem não oferecer uma maior concorrência, sendo possível, por si só, qualquer garantia de aumento de eficiência com consequente reflexo num qualquer aumento de competitividade.

Bem pelo contrário, como sublinhou Miguel Gomes, em representação da Associação dos Armadores da Marinha do Comércio, concentração está longe de significar necessariamente qualquer afirmação de posição dominante ou, pior ainda, de abuso de posição dominante, mas, tendo em atenção os investimentos necessários, bem como a não menor necessidade de criação de efectivas economias de escala, como também destacou Urbano Gomes, em representação do Terminal de Contentores de Leixões, a fragmentação em nome de um aumento da concorrência em abstracto, pode constituir-se mesmo como um erro, tal como, na opinião de Carlos Figueiredo, em representação da Associação Nacional de Empresas Concessionárias de Áreas Portuárias, foi e é exactamente o maior problema e o maior erro de Lisboa.

Por outro lado, Urbano Gomes não deixou igualmente de afirmar considerar um equívoco falar em concentração quando o que se está a falar é de uma soma de posições de determinados grupos ou empresas em vários consórcios em acção nos diversos portos, como se um mesmo e único grupo, ou uma mesma e única empresa se tratasse e os diferentes sócios ou accionistas nada contassem para a distinta e separada identidade e estratégia de cada uma das respectivas organizações individualmente consideradas.

Por outras palavras, o que pareceu ficar assente, independentemente de algumas pequenas divergências de opinião no caso da concorrência, ou talvez mais exactamente dito, da concentração versus fragmentação, foi uma evidente adopção, por quase todos, da primeira opção em relação à segunda possibilidade, não deixando de se considerar a mesma a última como um perigo. Um plano em que se situou, por exemplo, Jaime Vieira dos Santos, em representação da Comunidade Portuária de Leixões, também o mais veemente crítico do Estudo da Autoridade da Concorrência, considerando-o como uma «pequena bomba atómica», quando lembrou os idos de completa fragmentação e extrema concorrência nos portos nacionais, então, por isso mesmo, entre os mais caros e mais ineficientes de toda a Europa, e enaltecendo e louvando todo o esforço entretanto realizado exactamente no sentido inverso. Em suma, para a maioria, concorrência, mesmo quando possa contribuir para uma maior eficiência, não é necessariamente equivalente a competitividade.

A competitividade depende de muitos outros factores, desde logo, de uma maior eficiência, como da qualidade, celeridade e fiabilidade dos serviços, como também dos preços, embora aqui importe ter igualmente em atenção, tal como acentuou Rui d’Orey, em representação dos Agentes de Navegação de Portugal, não se poder confundir preços com soma de custos. Uma questão relevante sobretudo quando tanto se fala igualmente em concessões, prazos, rendas e repercussão de qualquer diminuição nos respectivos custos em toda a cadeia de valor.

Questões abordadas no Estudo mas, apesar de tudo, relativamente pacíficas, ou seja, onde existe uma quase unanimidade contra as propostas da Autoridade da Concorrência, no primeiro caso, quando propões uma diminuição dos prazos das concessões e uma eventual renegociação das mesmas, bem como uma mesma quase unanimidade, desta feita em sintonia com as recomendações expostas pelo Estudo, de diminuição das rendas variáveis.

No caso das concessões, porém, o que suscita alguma apreensão é o facto de o modelo seguido em Portugal e na maioria dos países do Sul da Europa, ser distinto do modelo seguido no Norte da Europa onde tal figura não existe porquanto o que existe é um aluguer de uso de terreno, com todos os benefícios que tal encerra e a agravante da Comissão Europeia estar prestes a publicar a já famosa Directiva das Concessões, eventualmente altamente prejudicial para nós e que, ainda na opinião de Carlos Figueiredo, muio provavelmente, só se aplicará a Portugal uma vez que os franceses já se preparam apara seguirem o Norte e Espanha já fez o que tinha a fazer e queria fazer nesse domínio.

Vitor Caldeirinha, em representação da Associação dos Portos de Portugal, surpreendeu, não porque tivesse chamado a atenção para a necessidade, acima de tudo, da sustentabilidade dos portos, por lembrar tudo nos portos dever ser planeado e executado a longo prazo, por se constituírem os portos como um nó logístico, por não se poder separar a eficiência da escala ou até por trazer ao debate os novos modelos que estão a ser implantados no Brasil onde, ao lado das concessões de serviço público e das concessões de uso privativo, se encontram agora também concessões livres, se assim se pode dizer, mas por ter acentuado a dicotomia da inovação [no sentido de experimentalismo] versus continuidade, defendendo, no caso nacional, dever a segunda prevalecer em relação à primeira, uma vez a dimensão e a liderança serem aí determinantes na probabilidade de êxito ou fracasso dos passos dados.

Para além de múltiplos outros assuntos tratados, desde a importância do tempo de trânsito, da questão elasticidade ou não elasticidade de certas mercadorias em relação a determinados portos, da liberalização dos serviços nos portos, com generalizada concordância, com a excepção da Associação dos Pilotos de Barra e Portos, absolutamente contrários na questões dos reboques, das questões da regulação, ou de João Carvalho, Presidente da Autoridade da Mobilidade e dos Transportes a defender a existência de um modelo contratual único, de Paulo Gonçalves, da Autoridade da Concorrência e principal responsável pelo Estudo da Concorrência nos Portos, rogar que não peçam ao Estudo mais do que pode dar nem lhe atribuam intenções que não são as suas, a questão final, é também a questão do papel do Estado em tudo isto, de que pouco se falou.

Como acentuou ainda Jaime Vieira dos Santos, fizeram-se os PETI3+, mais os respectivos estudos estratégicos mas, até hoje, nada saiu do papel. Qual o papel do Estado? Mas, sobre isso, o Estudo nada diz e Jaime Vieira dos Santos, isso, condena veementemente, justificando assim, talvez, também, as palavras de José Monteiro Simões colocadas em epígrafe.



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