Até ao final do ano, Miguel Subtil espera concluir a construção do primeiro trimaran hidrofoil em série para alta competição integralmente português. Trata-se de uma embarcação inspirada nos trimarans hidrofoil da Classe Ultime, mas reduzido a um terço da dimensão – 25 pés (7,5 metros) – e assim inserido na Classe C, com que o velejador pretende lançar a Portugal Vortex 25, uma classe de vela portuguesa em série, “que não existe desde há 70 anos”, segundo referiu ao nosso jornal.
“Há muitas embarcações portuguesas conhecidas, mas não em série e não a representar uma classe, e é isso que vamos fazer, do princípio e de forma que seja acessível para a nossa economia”, referiu Miguel Subtil, acrescentando que o preço de venda será 50 mil euros.
A concepção do protótipo, até agora totalmente financiada por Miguel Subtil, é dinamizada pela Multiocean – Associação de Multicascos Oceânicos, que também é um clube náutico. Um projecto que leva quatro anos de maturação, entre concepção, estudo, reunião de materiais e preparação do estaleiro. Neste momento existem todas as condições para começar a construir a embarcação, que demorará cerca de três meses.
O velejador revelou-nos que tem os meios necessários para assegurar a construção do protótipo. “A garantia de que chegamos ao fim é não dependermos de ninguém”, disse-nos, acrescentando que o estaleiro está a ser finalizado “e é específico para construir esta embarcação”.
Embora baseada no Côte d’Or II, o antecessor do veloz Hydroptère, a concepção do navio de Miguel Subtil tem uma dimensão mais reduzida, reproduzindo aquele veleiro a um custo viável, com uma escolha de materiais diversificada, “desde os mais exóticos aos mais convencionais”, explicou-nos o velejador. “Não queremos inviabilizar o projecto por causa dos materiais, interessando mais o desempenho final, o funcionamento e a acessibilidade da embarcação”, referiu-nos.
Conforme escreveu recentemente o velejador em artigo na Revista de Marinha, trata-se de um projecto “à nossa medida em termos de custo, com design e construção portuguesa, utilizando fornecedores nacionais na medida do possível, mas sem deixar de ser um projecto moderno, inovador e de categoria internacional”.
Concebido essencialmente por Miguel Subtil, o projecto da embarcação beneficiou também de outros contributos, como os da Almadesign, uma empresa portuguesa de design e consultoria, muito envolvida em soluções para as indústrias aeronáutica e aeroespacial, que o valorizou com a sua experiência. É uma colaboração de interesse mútuo, pois esta intervenção pode contribuir para diversificar os mercados alvo da empresa (que é parceira na construção, como fornecedora), neste caso, abrindo-lhe portas para a náutica.
Um sonho maior do que um barco
O sonho de Miguel Subtil, no entanto, é maior do que esta embarcação. O projecto global é a vários anos e envolve a construção de cerca de 12 embarcações, um número determinado pela capacidade para gerir a nova classe e mantê-la em regatas. O ritmo deste projecto dependerá bastante da obtenção de financiamento, que os seus responsáveis procuram por várias vias. Num documento a que tivemos acesso, fala-se em construir quatro embarcações por ano, visando promover “um circuito de competição com chancela inteiramente portuguesa”.
Uma das vias a seguir será a dos financiamentos públicos ou comunitários. Segundo apurámos, responsáveis pelo projecto reuniram recentemente com o júri da MARE STARTUP, o programa de empreendedorismo e inovação empresarial de base científica e tecnológica na área do mar. Está em curso uma candidatura do projecto a fundos comunitários, para o que a MARE STARTUP poderá contribuir apoiando na elaboração de um modelo de negócio.
Segundo os promotores do projecto, a MARE STARTUP terá considerado a ideia com características únicas e inovadoras, razão pela qual o melhor caminho para o financiamento será pela via da componente inovação. E poderá ser mesmo a primeira vez que a MARE STARTUP se interessa por um projecto relacionado com a náutica. Um interesse que pode credibilizar o projecto junto de potenciais investidores, a outra via pela qual Miguel Subtil procura financiamento para lhe dar continuidade.
No horizonte dos promotores está a ideia de democratização da náutica, “em linha com a Estratégia Nacional para o Mar”, e que significa “aproximar as populações do mar e criar massa crítica, porque sem massa crítica não há economia”. E aqui, “a náutica tem um papel importante”, no qual se integra este projecto, “que corresponde a uma necessidade do país que está a ser criada de forma consistente através do trabalho desenvolvido no desporto escolar, por via da formação desportiva”, consideram os promotores.
Os promotores recordam a este propósito que “no ano escolar que agora terminou, o desporto escolar movimentou em todo o país, no surf, no remo, na canoagem e na vela cerca de 80 mil jovens”. E sublinham que nesse contexto, está a ser criado um plano a quatro anos que visa duplicar o número de centros de formação desportiva, para cerca de uma centena, o que representará aproximadamente 100 mil jovens nesta área.
Isso pode revelar-se determinante para o futuro de um projecto de que o Portugal Vortex 25 é apenas o embrião e a que não são alheias a presença do boatyard da Volvo Ocean Race em Lisboa, manifestações de vontade de criar um pólo náutico em Portugal ou mesmo a existência de velejadores nacionais profissionais altamente qualificados. “Construir uma embarcação nova é o primeiro passo para colocar em funcionamento uma economia circular que é auto-regenerativa e que não existe em Portugal”, envolvendo construção naval e vela profissionalizada, refere Miguel Subtil.
Como o próprio escreveu na Revista da Marinha, “a ideia é colocar em marcha, a uma pequena escala, um ciclo que se realimenta a si próprio; a este certamente que se sucederão outros projectos similares que podem desfrutar e reforçar esse ciclo”. Como nos disse, “a semente é o barco”, mas para que a vela seja rentável “é preciso envolver vários serviços”. E nessa matéria, “o aspecto lúdico da competição é essencial e impulsionador das indústrias e serviços associados”, conforme se lê no documento a que tivemos acesso.
Além dos arquitectos navais e dos estaleiros, as empresas, os clubes e as associações de náutica, as seguradoras, os tripulantes, a imprensa especializada, os gabinetes de relações públicas, as agências de turismo, entre outros agentes, são importantes para fazer avançar o processo . E os poderes públicos, nas matérias que lhes competem, ao nível do ordenamento territorial e das decisões políticas envolvidas, também.
Características
Segundo os promotores do projecto, a investigação e a implementação da configuração já foi demonstrada pelas embarcações Paul Ricard, Côte d’Or II e Hydroptére. Segundo explicam, três foils submersos permitem uma segurança e estabilidade acrescidas “em relação aos modernos catamarãs foilers”. Com uma pequena cabine no casco central, permite acolher dois a três tripulantes em “condições adversas”.
Deslocamento
Vazio: 333Kg
Total: 550 Kg
Dimensões
Comprimento: 7,5m
Boca: 0,81m
Envergadura: 8,5m
Calado: 0,5 – 1,6m
Guinda de mastro: 11,5m
Propulsão
À vela: armação em cutter
Área vélica: 25m2 à bolina, 45m2 à popa
A motor: Eléctrico de 1 cv
Equipamentos
Sistema de navegação: PC, GPS, Cartas electrónicas
Sonda
Odómetro
Rádio VHF
Nota: Foto de AlmaDesign
Um comentário em “Um trimaran até ao final do ano”
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Parece ser muito interessante. Desejo boa sorte e espero ver vários desses trimarans a “voar” no Tejo.