Revela estudo da Allianz Global Corporate & Specialty
Allianz

Em 2015 perderam-se 85 navios em incidentes marítimos, menos 3% do que em 2014, o que representou o valor mais baixo na última década e, pela primeira em dez anos, a segunda vez consecutiva em que se verificou um valor abaixo das 100, revela um estudo da Allianz Global Corporate & Specialty (AGCS) intitulado “Safety and Shipping Review 2016”, divulgado há poucos dias.

Cerca de 60% dos navios perdidos foram cargueiros (36) e pesqueiros (16), números ligeiramente acima dos verificados em 2014, com aumento do volume de carga perdida, que se regista pela primeira vez em três anos e constitui um motivo de preocupação entre o sector.

O estudo destaca o facto de mais de ¼ das perdas se ter verificado numa zona que abrange o Sul da China, a Indochina e as Filipinas (22, ou seja, mais 3 do que em 2014 nesta zona do globo). A segunda zona com mais perdas foi a do Mediterrâneo Oriental e Mar Negro (11, ou seja, menos uma do que em 2014) e a terceira foi a de Japão, Coreia e Norte da China (8, menos 4 do que no ano anterior). Uma hierarquia geográfica que se tem mantido constante ao longo da última década.

Quanto às causas, o estudo revela que o naufrágio tem sido a mais comum, “frequentemente devido a mau tempo”, responsável por 75% das perdas (63), o que significa um aumento de 25% face a 2014, e tem sido o principal motivo nos últimos dez anos. Os navios perdidos por encalhamento constituíram o segundo maior grupo neste contexto (12, menos 6 do que em 2014). Refere-se também que não se registam perdas por motivos de pirataria pelo quarto ano consecutivo.

Nem todos os incidentes marítimos, contudo, terminam em perda de navios e de mercadoria. No total, o estudo indica 2.687 incidentes registados em 2015, dos quais 484 no Mediterrâneo Oriental (a zona de mais incidentes pelo quarto ano consecutivo), 341 nas Ilhas Britânicas, Mar do Norte, Canal da Mancha e Golfo da Biscaia e 284 no Sul da China, Indochina, Indonésia e Filipinas. No total, ocorreram menos 4% de incidentes do que em 2014, sendo que a principal causa (36%, ou 973 vezes) foi avaria mecânica.

 

Outras causas de agravamento dos riscos

 

O que pode ser considerada uma tendência para a diminuição de incidentes e do volume de perdas, porém, não basta para diminuir as preocupações no sector. O estudo refere que o abrandamento da economia global e o seu reflexo na redução do preço das commodities e no excesso de oferta de navios provocam menos investimento na manutenção e reparação de navios e nas condições de trabalho e formação das tripulações. O fenómeno reflecte-se depois na diminuição da segurança de navios, passageiros e mercadorias, de que decorre um aumento dos riscos associados ao transporte marítimo.

A esta sequência de factores, que resultam em navios menos cuidados, tripulações menos preparadas e aumento do número de horas de serviço de tripulantes, o estudo acrescenta outras, como o aumento de intensidade dos fenómenos climatéricos adversos, como tempestades, o impacto negativo das bem intencionadas medidas para reduzir as emissões de poluentes, o apetite por navios cada vez maiores ou as ameaças de pirataria informática sobre os mecanismos electrónicos de navegação.

O clima sempre foi um factor de risco para a navegação marítima, mas o estudo destaca que os “fenómenos climatéricos excepcionais estão a tornar-se mais comuns, com eles trazendo riscos de segurança”, cada vez maiores, para o transporte marítimo, quer no plano dos navios, quer nos portos.

Outro agravamento dos riscos parece surgir de onde menos se esperava. Apesar de existirem orientações no sentido de os navios utilizarem combustíveis com menor teor de enxofre por questões de preservação ambiental, e que a AGCS aplaude, surgiram implicações inesperadas de segurança relacionadas com o combustível de baixos índices de enxofre que devem ser consideradas.

De acordo com o estudo, têm sido relatados problemas de motores e potência pelos pilotos, como perdas de potência durante manobras críticas ou problemas eléctricos durante mudanças de velocidade, relacionados com a utilização de combustíveis de baixo teor de enxofre, e que tendem a aumentar à medida que se reforçam as exigências associadas à implementação de combustíveis mais leves.

A dimensão cada vez maior dos navios também constitui um risco acrescido para a navegação, segundo o estudo da AGCS. Os problemas levantam-se ao nível da capacidade que os portos têm (ou não) para fazer face a navios de porte cada vez maior, designadamente numa situação de emergência. Tais meios requerem investimento, o que não é propriamente fácil de realizar num momento de crise no sector. Por outro lado, a maioria dos portos não está preparada para receber tão grandes navios, reduzindo as hipóteses de atracagem. Finalmente, subsistem dúvidas sobre a capacidade de recuperação ou resgate de um navio destes em caso de necessidade. Em Fevereiro, o Indian Ocean, da China Shipping Container Lines, de 19 mil TEU, ficou encalhado no rio Elba, na Alemanha, durante cinco dias, tendo sido necessário deslocá-lo com uma frota de 12 rebocadores.

Se a pirataria marítima já era um fenómeno problemático, mais complexo se tornou de ultrapassar a partir do momento em que os navios passaram a ficar sujeitos a ataques informáticos. Falhas nos sistemas de segurança, a este nível, podem comprometer a navegação marítima, por exemplo, permitindo aos piratas informáticos conhecer determinada carga ou rota por antecipação e preparar um ataque com mais detalhe, ou provocar danos numa plataforma offshore.

O estudo também antecipa os principais riscos para os negócios do transporte marítimo. O principal consiste na evolução do mercado (volatilidade, intensificação da concorrência e estagnação), seguido do roubo, fraude e corrupção (segundo lugar), das disrupções na própria actividade (terceiro lugar), das catástrofes naturais (quarto) e dos riscos políticos (guerras, terrorismo, etc.).



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