A fecharmos este número de Julho, lemos no Expresso a extraordinária notícia da possibilidade de se vir a constituir no COMAR um Centro de Monitorização do Atlântico, referido também como Centro de Segurança Marítima. Embora sem muito mais pormenores, a não ser o grande e muito compreensível interesse nos Estados Unidos no projecto, por si só, esta é uma notícia a merecer o maior destaque e que deve ser seguida com a maior atenção pela sua possível decisiva importância estratégia.
Muito mais não nos foi ainda possível averiguar e apurar mas, além do reconhecimento e dos parabéns ao Expresso pela cacha, este é, na verdade, um daqueles projectos de capital importância para Portugal em que o Governo, qualquer Governo que seja, deve empenhar sua máxima força e máxima capacidade para garantir o seu pleno êxito.
Conceptualmente, como sabemos, não se trata de nada de nada radicalmente novo mas o facto é que, ao longo da última década, os sucessivos governos em Portugal nunca quiseram olhar para este projecto com olhos de ver, compreendendo a sua decisiva importância geoestratégicas para Portugal, para a CPLP, para a Europa e até mesmo para os Estados Unidos.
Não, não exageramos o interesse dos Estados Unidos. De facto, não edificaram num ápice o COSMAR, na Praia, em Cabo Verde, assim que lhes foi dado saber dessa oportunidade? Evidentemente que sim, sobretudo numa época em que estavam a substituir as importações de petróleo do Golfo da Arábia para o Golfo da Guiné. Hoje, depois do desenvolvimento da tecnologia do chamado gás de xisto, a situação é ligeiramente diferente, menos premente, mas a ninguém interessa, evidentemente, um crescendo de instabilidade no Golfo da Guiné e no Atlântico Médio como tem vindo a suceder um pouco ao longo dos últimos anos.
Independentemente da questão dos Estados Unidos, quer pensando um pouco no que une a CPLP, quer olhando para um mapa, logo percebemos a importância crucial do mar _ tão mais evidente quando olhamos para o Atlântico e tão evidente que o mesmo projecto foi inclusive apresentado por cabo Verde, há anos, numa das reuniões regulares de defesa da CPLP, tendo sido recebido com o máximo interesse por todos salvo o Brasil que, também por razões compreensíveis, se terá manifestado menos entusiasmado. De qualquer modo, se o entusiasmo na reunião foi grande, as consequências de tanto entusiasmo foram escassas ou, infelizmente, praticamente nulas, tanto mais quanto tinha Portugal ficado de dar sequência ao assunto. E assim se tem vivido desde então.
Agora, porém, algo parece estar a mudar, uma nova perspectiva estratégica e geoestratégica parece rasgar os mais sombrios horizontes portugueses, deixando transparecer já aquele azul que nos revigora a alma.
Apesar de tudo, não podendo deixar de enaltecer o projecto e a decisão, continuamos no entanto a pensar que um projecto como referido deveria ser primordialmente realizado no âmbito da CPLP e montado em Cabo Verde, pelas razões que iremos tentar sintetizar.
Em primeiro lugar porque, num momento em que o Atlântico começa a voltar a ser olhado na sua mais verdadeira dimensão e importância e a tendência cada vez mais acentuada é para a formação e acção em blocos político-económicos, a importância de Portugal no mesmo Atlântico poderá ser tão mais decisiva quanto maior e mais decisiva for a importância e peso da própria CPLP. E tanto mais quanto, se voltarmos a olhar para um mapa do Atlântico também vemos com facilidade a importância de Cabo Verde como vértice de dois t triângulos invertidos, sendo o primeiro formado pela linha que vai do Continente aos Açores, dos Açores a Cabo Verve, regressando ao Continente pela Madeira, e um segundo formado essencialmente pela linha que vai de Cabo Verde ao Brasil, do Brasil a Angola e de Angola a Cabo Verde, sem esquecer S. Tomé e Príncipe nem a Guiné-Bissau _ e agora até a Guiné-Equatorial.
Em segundo lugar, um Centro como o referido, uma Agência Lusófona de Monitorização do Atlântico, congregando os vários Centros congéneres do COMAR, deverá ter um carácter algo supranacional e, nesse sentido, Cabo Verde, quer pela sua posição geográfica e geoestratégica como até pela sua dimensão e equilíbrio diplomático, afigura-se, de facto, como a localização, aparentemente, mais adequada.
Finalmente, tendo em atenção a sua Parceria Estratégica com a União Europeia, por um lado, bem como a seu interesse no plano de uma NATO, não sendo nunca de esquecer o Exercício Steadfast Jaguar aí realizado em 2006, não deixam de ser igualmente factores a ter em conta e a ser devidamente capitalizados.
Uma grande notícia a abrir este nobre, muito nobre, mês de Julho, mês em que o Jornal da Economia do Mar cumpre o seu primeiro aniversário, tendo no seu primeiro número editado, exactamente uma grande entrevista com o Primeiro-Ministro de Cabo Verde, José Maria Neves, e agora, um ano passado, inicia uma Coluna, Do Outro Lado do Mar, com o Comandante André Panno Beirão, Capitão-de-Mar-e-Guerra da Marinha do Brasil, PHd em Direito e Coordenador do Mestrado em Estudos Marítimos da Escola de Guerra Naval do Brasil. Ou seja, garantido o triângulo superior, começa agora o Jornal da Economia do Mar, como era seu propósito, a formar paulatinamente o triângulo inferior.
Auspicioso, no mínimo, neste radioso Julho Azul.