A Iniciativa Gulbenkian Oceanos, um estudo de 5 anos sobre questões ligadas à economia do mar, foi agora divulgado e apresentado num seminário que decorreu ontem, no Auditório da Gulbenkian
Universidade de Aveiro

Em 2050 poderá haver no mar mais plásticos do que peixes e no final deste século o Terreiro do Paço, em Lisboa, poderá ficar submerso. E das 201 organizações inquiridas pela Iniciativa Oceanos, 75% responderam que o Capital Natural Azul é essencial ou muito importante para a sua actividade, sendo que o mar aberto é o que tem mais destaque. Por outro lado, 80% das organizações considera urgente ou muito urgente tomar medidas na defesa dos oceanos, no entanto apenas 36% pensa fazê-lo nos próximos dois anos.

As conclusões são do estudo Iniciativa Oceanos, da Fundação Calouste Gulbenkian, que nos últimos cinco anos se dedicou à economia do mar para estudar os benefícios dos oceanos em termos de bem-estar humano e de desenvolvimento económico, e que foram apresentados ontem na Conferência – O Valor dos Oceanos.

Na ocasião, a ministra do Mar, Ana Paula Vitorino, exprimiu quão significante é o tema, numa intervenção quase filosófica sobre o valor dos oceanos. A “importância que o oceano tem para as nossas vidas, falar no valor do oceanos, é a mesma coisa que falar, para mim, numa primeira análise, no valor da vida”, pois muito se discute sobre todos os temas ambientais, no entanto rara é a vez em que se discute o valor dos oceanos, que é tão fundamental.

Ana Paula Vitorino alertou para a importância deste tipo de projectos na criação de conhecimento para podermos evoluir do ponto de vista social e económico. E deixou um desafio: “trabalharmos todos em conjunto, não é só através da rede dos centros de investigação, é alargar esta parceria”.

A ministra referiu que “a prioridade na matéria, naturalmente que é tornar mais sustentáveis todas as actividades tradicionais, mas nós temos de apostar em actividades emergentes, que são a biotecnologia azul, e também nas energias renováveis oceânicas”.

Emanuel Gonçalves, Professor do Instituto Superior de Psicologia Aplicada (ISPA), considera que a investigação interdisciplinar pode ser útil para dar resposta a problemas de policy concretos, na medida em que “pode criar inovação a nível do cruzamento de conhecimento”, apesar da dificuldade quando entidades da sociedade civil se juntam para criar esse conhecimento acrescentado e interdisciplinar.

Antonieta Cunha-e-Sá, Professora da Nova School of Business & Economics, defendeu que hoje em dia é difícil trabalhar separadamente, pois as questões têm várias perspectivas que se interligam. Há aspectos importantes nesta questão da gestão dos recursos se o nosso objectivo “é uma gestão sustentável”, sendo que “esta resulta sempre de um interface e de uma relação que se estabelece entre a natureza e a acção humana e, portanto, os agentes económicos”.

Henrique Queiroga, Professor do Centro para o Ambiente e Estudos Marinhos (CESAM), considera importante conseguir explicar às pessoas os problemas principais com que lidamos para evoluirmos no conhecimento dos oceanos. E muitas vezes os cientistas não estão habituados a falar com as sociedades, e a mensagem não passa. No que passa pelo acesso a dados públicos, considera que ainda não estamos capacitados para interagir a esse nível, de modo a que tal seja proveitoso.

No contexto de capacitar para proteger, Aniol Esteban, Director da Fundação Marilles, conhecendo, pelo menos, três realidades distintas – Espanha, Reino Unido e Portugal – entende que o desafio de Portugal passa por “sair da roda do hamster” e com isto quer dizer que Portugal tem de romper o círculo e ter uma base sólida nas empresas, não podendo um trabalhador andar também à procura de fundos, por exemplo. “Em Portugal há uma boa comunicação entre ONGs, o desafio é conseguir mais fundos”, para o que é necessário ter “uma boa estratégia, uma boa história e um bom projecto”.

Gonçalo Carvalho, Presidente da Organização Não Governamental PONG-Pesca, afirmou que não se pode pensar só na sustentabilidade, ainda que seja o foco, pois há toda uma panóplia de importâncias, e mesmo uma ONG tem de estar inserida num sistema económico e social.

Já Ângela Morgado, Coordenadora da organização ambientalista WWF em Portugal, reconheceu como importante uma co-gestão da Fundação Gulbenkian com a sua organização, defendendo que influência, participação, contactos com stakeholders, e angariação de fundos, são importantes, e que com planeamento tudo se consegue.

Humberto Rosa, Director para o Capital Natural da DG Ambiente da Comissão Europeia, defendeu que “em poucas décadas nada ficará mais fácil, seremos mais. E, por isso o conceito de sustentabilidade precisa de uma reconfiguração, pois afinal não tem três pilares, mas três camadas, e umas sustentam as outras, não se pode inverter a ordem das camadas, o capital natural da biosfera ou ambiente é a de baixo, e depois a sociedade e a economia, sendo esta última que faz com que suba a importância das políticas que ajudam estas camadas”.

No entanto, para Sofia Santos, do Business Council for Sustainable Development – Portugal, são essenciais “accionistas que tenham um conjunto de actividades a médio e longo prazo, na sustentabilidade”, pois “a maioria dos investidores não segue ainda esse caminho e portanto, em termos de estímulos, temos um problema. E prosseguiu dizendo que “o protocolo do capital natural veio enfatizar e chamar atenção para essa abordagem dos sectores das empresas que por vezes são desconhecidas, para a necessidade de uma empresa perceber uma coisa tão simples: de que forma é que se consomem matérias-primas, e daí percebermos o que e pode fazer para que essas matérias nos continuem a servir durante muito tempo”.

Durante um ano, o grupo Jerónimo Martins avaliou e percebeu que a área do pescado é importante e que aplicando todos os passos necessários, obtém-se um resultado que ajuda a definir os “três cenários alternativos, que explicam precisamente aquilo que são os custos sociais para a sociedade e os impactos ambientais relacionados com PVC e com as alternativas que estudámos”, segundo Fernando Ventura, que representou o grupo na conferência.



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