Crescimento da Algaplus dependerá da estratégia

Nos últimos três anos, a Algaplus conseguiu provar que, em Portugal, é possível produzir algas em aquacultura multi-trófica integrada, com qualidade e aceitação no mercado.

De acordo com Helena Abreu, co-fundadora e responsável pela inovação e componente comercial da empresa, trata-se de um “método de aquacultura sustentável em que se integram diferentes níveis tróficos de produção animal e vegetal para diversificação de produtos, por um lado, e com menos pegada ecológica, por outro”.

No caso da Algaplus, as algas usam os nutrientes inorgânicos dissolvidos na água libertados pela produção de peixe ou mexilhão, que são os nitratos e a amónia, absorvem esses nutrientes e transformam-nos em biomassa. “É o que acontece na praia”, esclarece Helena Abreu.

O papel de Helena Abreu e do seu colega e co-fundador da empresa Rui Pereira, biólogos que sempre trabalharam com algas, foi procurar compreender a função das algas neste sistema, “que tem vantagens para quem quer produzir algas, porque gera muita biomassa”, refere a bióloga, e não recorre a fertilizantes.

“Isto é o conceito; acreditámos e acreditamos que isto, em Portugal, tem todas as possibilidades de ser feito de forma diferenciada face ao que se faz noutros países, pois temos conhecimento técnico e científico, bem como condições infra-estruturais e ambientais ideais para este tipo de produção”, refere a mesma responsável.

Ao falar de infra-estruturas, Helena Abreu refere-se a pisciculturas abandonadas nas zonas de estuários, em Aveiro, no Sado, no Tejo, na Ria Formosa. São pisciculturas chamadas “de esteiro”, com áreas que não são utilizadas e estão disponíveis para produção de algas.

Quanto à diferenciação, a bióloga refere que os projectos empresariais e de investigação neste tipo de cultivo de macroalgas que estão a surgir na Europa encontram-se nos países nórdicos, “onde se produzem espécies diferentes das nossas”, ou seja, “não há concorrência directa e temos complementaridade”.

 

Negócio precisa de crescer

Para desenvolver a sua actividade, a empresa dispõe de uma licença de produção de algas até 2028 e optimiza uma infra-estrutura pré-existente numa aquacultura de robalo e dourada, em Ílhavo, na Ria de Aveiro, com 600 metros quadrados, que “neste momento já é de processamento de macroalgas”, refere Helena Abreu. Conforme nos dizia esta responsável já em 2014, a Algaplus tinha uma parceria (que se mantém) com a Materáqua Lda, uma empresa de produção de peixe, com o objectivo de promover uma aquacultura sustentável, quer no plano económico, quer no ambiental.

São sete colaboradores e têm uma capacidade de produção instalada de duas toneladas de algas frescas por mês, o que equivale a 24 toneladas por ano. “É uma produtividade elevada, embora em pequena escala, que ainda não nos permite ser sustentáveis”, admite. Em 2015, o volume de negócios foi cerca de 50 mil euros, “mas temos que crescer”, refere a bióloga, que ainda não pode adiantar perspectivas para 2016. “Tudo dependerá da estratégia”, refere.

Cerca de 99 por cento da produção destina-se a sector alimentar, “que é o que tem maior mercado”. Em volume, “produzimos cerca de 60 a 70 por cento para o exterior, especialmente para França e Holanda, sob a marca Algaplus”. Em produto acabado, que é o que rende mais, “vendemos mais em Portugal”. Mas em “termos globais, a exportação pesa mais no nosso negócio”, reconhece Helena Abreu. Em 2015, o maior volume de clientes era no retalho, seguido da restauração e empresas alimentares. A prestação de serviços, “que é bem paga”, também ocupava um segmento da actividade da empresa.

“O nosso core business é sabermos produzir algas com características específicas, ao gosto do mercado”, para o que “temos um sistema modelar de produção”, refere a responsável da Algaplus. E o que mais ninguém tem, segundo a bióloga, “é o nosso sistema de produção, em terra, de aquacultura multi-trófica integrada”. Nesse aspecto, a empresa é inovadora, embora não tenha o sistema patenteado.

Não admitindo fazer manipulação genética de algas, Helena Abreu esclarece que “o que se faz, tal como na agricultura e na pecuária, é o breeding, ou seja, a selecção das melhores espécies para reprodução, e aí os asiáticos estão mais adiantados”.

Mais recentemente, a Algaplus tem trabalhado com empresas de rações (nutracêutica animal), cosméticos e materiais (bioplásticos, têxteis). No caso dos bioplásticos, “verifica-se um cenário semelhante ao dos biocombustíveis”, considera, referindo-se aos projectos que procuram tornar os plásticos em produtos biodegradáveis. “Nessa área, já fomos abordados por empresas do sector”, admite Helena Abreu, esclarecendo que a Algaplus “não produz bioplásticos, mas define protocolos para obter uma matéria-prima que é optimizada para aquele sector”.

 

As marcas

O negócio está repartido por marcas. Uma é a Algaplus, sob a qual são vendidas macroalgas a granel e prestados serviços de desenvolvimento de cultivo de espécies novas ou optimização a empresas. “No caso destas empresas, que não são produtoras, apenas utilizadoras de algas, sobretudo na área da cosmética, podemos depois vir a ser seus fornecedores preferenciais”, refere Helena Abreu. No caso da venda, trata-se de comercializar algas frescas ou desidratadas, produzidas todo o ano ou de forma sazonal.

Outra das marcas é a Tok de Mar, com a qual chegam ao consumidor final e também está presente na Alemanha, Suiça, França, Polónia e Reino Unido. Sob essa marca, são vendidos produtos de outras empresas “que incorporam macroalgas produzidas por nós” e “produtos alimentares acabados nossos à base de algas”, como uma conserva (produzida pela Comur, uma conserveira da Murtosa), refere a responsável. São produtos disponíveis em lojas de todo o país. A empresa também incorpora as suas algas (alface do mar) numa conserva de sardinha e em conservas de sardinha da empresa Nero, além de incorporar sal marinho e flor de sal com algas num condimento. Brevemente, vão chegar ao mercado pacotes de algas preservadas em sal, “em que a alga está fresca, em vez de estar seca, misturada com sal, bastando depois apenas passar por água e utilizar”, explica a bióloga.

O Pão de Algas é outra marca, partilhada. É um produto desenvolvido pela Confeitaria Calé (onde se vende o Pão de Algas, somente em Peniche e Marinha Grande, por enquanto) e pelo Instituto Politécnico de Leiria, com farinhas de algas, “sendo que as algas são as nossas”, esclarece Helena Abreu.

Finalmente, a marca SeaOriginals, vocacionada para o segmento do bem-estar. Neste caso, os alvos principais são os SPAs, as farmácias e as lojas de produtos naturais. Actualmente, está disponível o produto Kit thalasso (sal marítimo para exfoliação e esponja de algas para hidratação da pele).

 

Projectos

Alguns dos projectos emblemáticos que contaram ou contam com a participação da Algaplus, como o Seabioplas, o Seacolours e o SHARP.

O Seabioplas foi um projecto comunitário europeu no âmbito do 7º Programa Quadro, concebido para produzir bioplásticos biodegradáveis, de forma sustentada, a partir de algas. Actualmente, já se obtêm a partir de milho, açúcar e trigo, mas com as algas o propósito era a produção de um ácido (PLA) que tem diversas vantagens, incluindo menos concorrência dos recursos alimentares, redução do uso de água fresca e menos emissões de CO2. Daqui resultou um protótipo, faltando optimizar algumas questões e introduzi-lo no mercado.

O Seacolors é um projecto Life (instrumento financeiro da União Europeia que apoia projetos de conservação ambiental e da natureza), destinado a demonstrar e validar um processo inovador de obter pigmentos naturais para tintas a partir de uma fonte sustentável e renovável, que é a alga. Visa igualmente verificar a possibilidade de usar essas tintas naturais para substituir as tintas sintéticas utilizadas na indústria têxtil.

Está em vigor até ao final de 2016, é coordenado pela Associação Industrial de Têxteis de Espanha, e o envolvimento da Algaplus faz-se ao nível da produção de macroalgas e da optimização dos extractos de algas para obtenção de pigmentos. O valor da participação da empresa, que está integrada num consórcio, é de 160 mil euros, dos quais 50 por cento são co-financiados pelo Life.

Os benefícios deste projecto são óbvios, face às ambições internacionais de salvaguarda do ambiente, na medida em que poderão gerar soluções capazes de reduzir os vastos volumes de tintas sintéticas usadas pela indústria têxtil e os efeitos dos abundantes produtos químicos poluentes que lhes andam associados. De acordo com o Banco Mundial, a indústria tintureira produz 20 por cento da água industrial poluída, sendo que tingir um quilo de algodão requer cerca de 100 litros de água.

O SHARP (Seaweed For Healthier and Traditional Food Products) é um projecto Portugal 2020 e visa desenvolver uma linha de produtos alimentares à base de algas, com benefícios comprovados. Envolve uma equipa multidisciplinar, com chefs e nutricionistas, e tem financiamento assegurado, segundo Helena Abreu. O valor do projecto correspondente à Algaplus é de cerca de 243 mil euros, financiado em 70 por cento (cerca de 170 mil euros) pelo Portugal 2020.



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