Do Comissário Europeu do Mar

Por tudo quanto o Presidente da República tem escrito e proferido em louvor, exaltação e incentivo à economia do mar, dúvida não há da sua acção, por certo discreta, mas sem de deixar de usar todas as prorrogativas de quanto usualmente designa como «magistratura de influência», em prol da atribuição da pasta do Mar ao nosso futuro Comissário Europeu.

Por tudo quanto o nosso Primeiro-Ministro tem escrito e ordenado em louvor, exaltação e incentivo da economia do mar, dúvida não há da sua acção, por certo discreta, mas sem deixar de usar todas as prorrogativas de quanto usualmente se designa como «poder», em prol da atribuição da pasta do Mar ao nosso futuro Comissário Europeu.

Por tudo quanto a nossa Ministra da Agricultura tem afirmado e viajado em louvor, promoção e incentivo da economia do mar, dúvida não há da sua acção, por certo discreta, mas sem deixar de usar todas as prorrogativas de quanto usualmente se designa como «delegação de poderes», em prol da atribuição da pasta do Mar ao nosso futuro Comissário Europeu do Mar.

Tem todo o sentido que assim seja porque o mar, a última fronteira, com todas as potencialidades que encerra, será, como todos bem sabemos, o elemento político e geoestratégico decisivo dos próximos anos. Termos um português no lugar de Comissário Europeu, verdadeiramente determinado, a orientar, definir e desenhar a política e o futuro da Europa nesse domínio, com consciência disso, não é questão de somenos importância.

Na verdade, um Comissário Europeu do Mar português poderá, como mais nenhum outro, articular Ambiente, Mar, Transportes, Atlântico, Defesa e Segurança e Estratégia Energética como só nós, portugueses, com consciência disso, sabemos e poderemos alguma vez fazer.

Na verdade, um Comissário Europeu do Mar português poderá, como mais nenhum outro, articular Ambiente, Mar, Transportes, Atlântico, Defesa e Segurança, Estratégia Energética e tudo quanto ao mar respeita como fazer valer a regra de atribuir a cada Estado Membro o peso correspondente à sua extensão marítima nas questões relativas ao mar, como nós, portugueses, com consciência disso, mais do que ninguém, temos autoridade para o fazer.

Por tudo isto, dúvida não há, não poder haver, de o Presidente da República, o Primeiro-Ministro e a Ministra da Agricultura e do Mar, tudo terem feito e estrem a fazer para que a pasta do Mar seja atribuída, de facto e de direito, ao nosso futuro Comissário Europeu.

Diz-se que o Mar não tem importância por se considerar uma pasta de somenos importância no âmbito da Comissão Europeia? Engano. Fábula de quem o diz ou assim o faz crer para melhor distrair os incautos e mais facilmente atingir os fins que, na realidade, são os seus: dominar, determinando, o futuro da Europa porque o futuro da Europa, hoje, como sucedeu connosco há 500 anos, dominado e determinado será pela estratégia que souber delinear e, tanto ou mais que delinear, executar, primordialmente, no que aos assuntos do mar respeita. Tudo quanto hoje importa, de um modo ou outro, ao mar sempre respeita porque ao mar sempre interligado se encontra quase tudo, do Ambiente à Política de Transportes, da Geopolítica de Defesa e Segurança à Política Energética, da Estratégia para o Atlântico às Relação Internacionais, para se ficar por aqui e pelo mais evidente.

Não tem o indigitado candidato de Portugal a Comissário o perfil necessário, como alguns dizem? Mas que virtudes, afinal, se lhe exigem para que bom candidato para tal considerado possa ser?

– Inteligência: para saber bem relacionar meios a fins;

– Sentido estratégico: para bem saber dispor os recursos, o tempo e as oportunidades que sempre se abrem em ordem à aquisição de vantagem própria;

– Capacidade negocial: para bem saber usar a vantagem conseguida de forma a conduzir interlocutores e adversários a realizarem ou aceitarem quanto interessa e importa que realizem ou aceitem;

– Capacidade de congregar uma equipa dos melhores para o apoiarem, de um ponto de vista técnico específico, nas múltiplas matérias que terá de tratar.

Não manifestou Carlos Moedas essas virtudes enquanto principal responsável governamental pelas negociações com o triunvirato formado pela Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI na questão do resgate da dívida nacional ao longo dos últimos três anos?

Assim se afigura.

Mas se assim é, não são os esforços muito discretos, muito pouco visíveis?

São-no, com certeza, como à boa, sábia e grande diplomacia não raras vezes importa.

Sem ironia tal se afirma porque, ironia sendo, então tudo muito mais grave seria porque, sendo-o, o mesmo seria admitir tudo não passar afinal de uma farsa, de uma grande e trágica farsa, ou seja, admitir as palavras do Senhor Presidente da República, do Primeiro-Ministro e da Ministra da Agricultura e Mar, consciente e plenamente divergirem do consequente acto, o que significaria também admitir mais não estarem senão a troçar de todos nós, portugueses, quando repetidamente afirmam e proclamam o Mar como Grande Desígnio Nacional. E isso, evidentemente, não podemos aceitar nem admitir que assim seja porque seria realmente trágico que assim fosse.



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