Documentário produzido em Cabo Verde ilustra os efeitos do acordo entre a UE e Cabo Verde nas comunidades locais

O documentário intitulado “Sandgrains” foi dirigido por Jordie Montevecchi e Gabriel Manrique e pretende ilustrar os efeitos do acordo de pesca estabelecido entre Cabo Verde e a União Europeia numa pequena comunidade em Cabo Verde.

O acordo celebrado entre a União Europeia e Cabo Verde permite a captura de cinco mil toneladas de atuns e «afins», sem que estes estejam definidos, tendo a União Europeia de pagar 550 mil euros por ano. O acordo prevê que as frotas europeias possam pescar o excesso de pescado que as frotas locais não têm capacidade de pescar. Todavia, a quantidade capturada ultrapassa largamente o acordado: em 2009 foi registada a captura de 6400 toneladas, que aumentaram em 2011 para 12 mil toneladas, apenas de tubarão.

A própria multa prevista no âmbito do acordo entre Cabo Verde e a União Europeia (65 euros por tonelada capturada em excesso apenas de atum) cria incentivos para pescar em demasia, já que cada tonelada pescada a mais é mais barata que as toneladas iniciais. Depois de três acordos, nada mudou.

As águas de Cabo Verde são habitats para muitas espécies como os atuns e os tubarões. Mas a crescente procura de barbatana de tubarão (um quilo de barbatana de tubarão pode chegar aos 300 euros por quilo) cria incentivos para a sua captura ilegal nas águas de Cabo Verde. A quebra das populações de tubarão provoca alterações no resto das populações de peixes, que deixam de migrar ao largo da costa onde os pescadores locais têm capacidade de pescar.

Por estarem mais modernizadas, as frotas europeias, em especial as portuguesas, apanham o peixe em alto mar, tendo decrescido a sua abundância para as frotas cabo-verdianas que ainda usam muito capital humano. Em busca de rendimento, as populações locais vêem-se forçadas a trabalhar na praia, retirando areia do mar para a depois vender ao sector da construção civil. Além de transformar as praias em desertos de pedras, a falta de areia no mar provoca infiltrações de água salina nos cursos de água interiores, provocando a infertilidade dos solos.

O documentário tem estreado a nível global: Melbourne, Seul, Bruxelas e agora em Lisboa, em colaboração com a PONG-Pesca.

A equipa do filme optou por recorrer ao crowdfunding para financiar o documentário, tendo conseguido 10 mil libras para a filmagem do filme e envolvendo desde logo a comunidade global no projecto.



Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

«Foi Portugal que deu ao Mar a dimensão que tem hoje.»
António E. Cançado
«Num sentimento de febre de ser para além doutro Oceano»
Fernando Pessoa
Da minha língua vê-se o mar. Da minha língua ouve-se o seu rumor, como da de outros se ouvirá o da floresta ou o silêncio do deserto.
Vergílio Ferreira
Só a alma sabe falar com o mar
Fiama Hasse Pais Brandão
Há mar e mar, há ir e voltar ... e é exactamente no voltar que está o génio.
Paráfrase a Alexandre O’Neill