Para um país que importa cerca de 60% do peixe que consome, são grandes os desafios que se lhe colocam.
pescas

José Apolinário, secretário de Estado das Pescas, acredita que o principal desafio das pescas é o de “assegurar a sustentabilidade da actividade, mantendo condições de rentabilidade para a frota envolvida, em particular para a pequena pesca e aumentar o rendimento dos pescadores”. E há ainda que investir mais no conhecimento científico, principalmente na área da gestão das pescas. É por isso que “serão incentivados os projectos que envolvam as instituições científicas e os profissionais da pesca e dada prioridade à recolha de dados, avaliação do estado das populações e selectividade das artes”.

O secretário de Estado das Pescas acredita convictamente que a capacidade de realizar investigação aplicada às áreas produtivas da pesca e da aquacultura, que constitua uma mais-valia para o sector, é também um desafio importante, facilitando projectos do sector produtivo ou das universidades/institutos que envolvam, de forma articulada, ambas as valências e sobretudo transferindo conhecimento para o sector produtivo. Área que está ligada à da formação. É essencial que esta seja adequada aos profissionais do sector das pescas. Mas não só. Também de novos negócios associados, como o da aquacultura.

1) Uma nova governança para as pescas, quer em Portugal, quer em Bruxelas. Acreditamos que o actual Governo, com uma orgânica diferente na nossa tutela, com a nomeação de um secretário de Estado exclusivo para a Pesca, reivindicação antiga do sector, pretende justamente iniciar uma nova dinâmica para as pescas.

2) Precisamos de repensar a modernização da frota, criando uma dinâmica interna de apoios, colmatando a ausência de qualquer apoio comunitário para a pesca, na vertente renovação, que vigora desde 2006 e que vai durar até 2020. É a única actividade industrial que na UE não beneficia de apoios para a sua renovação.

Quando questões de habitabilidade e segurança das tripulações, assim como as condições higieno-sanitárias para manipulação e conservação do pescado, são hoje prioritárias, pergunta-se por que não apostar na renovação da frota, cujo envelhecimento se está a verificar por imperativo de Bruxelas. Não se constrói um navio novo há mais de 10 anos e por vontade de Bruxelas pelo menos até 2020. Repito que uma nova construção não significa um aumento da capacidade de pesca, porque esta é sempre por substituição de unidade activa existente.

3) A formação profissional tem de estar ao serviço das necessidades do sector, identificando as suas carências e permitindo que a progressão na carreira dos profissionais oriundos da via profissional se faça em moldes diferentes, evitando demasiado tempo de retenção escolar. Por outro lado, é necessário agilizar a entrada na profissão, uma vez que a mesma carece de certificação específica, que em nossa opinião é injustificável, mas que constrange gravemente o início da carreira do candidato a marítimo. Tanto mais que na pesca industrial se praticam salários acima da média dos verificados em terra, o que poderia constituir um incentivo para a entrada na profissão.

4) Necessitamos de uma investigação científica nas pescas dotada dos meios necessários para a produção de pareceres científicos sobre o estado dos recursos que evoluem nas nossas águas, única forma de fazermos uma gestão correcta dos mesmos e de podermos fundamentadamente contraditar propostas apresentadas pela Comissão.

5) Por último, a PCP – Política Comum de Pesca. Tem-se centrado na visão estritamente ambiental, ignorando a economia, o emprego e o abastecimento do mercado comunitário, com produção segura em termos de sustentabilidade e sanitária. É necessária uma nova abordagem na visão externa da PCP, procurando novas oportunidades em pesqueiros externos e melhorando as existentes. O nível de exigência a que a indústria da pesca está sujeita exige uma correspondente exigência para com o abastecimento do mercado, pois muitas importações são originárias de países terceiros, que não cumprem as mesmas regras de sustentabilidade ambiental, fiscal e social, e donde nos chegam exemplos de casos extremos, como o da existência de trabalho escravo a bordo. Com esta realidade, mas com as fronteiras abertas, só porque somos deficitários em produtos da pesca, é muito difícil conseguirmos ser competitivos.

6) Alterar as práticas negociais da Comissão Europeia e as suas consequências. É o caso da falta de ambição para reequilibrar as quotas que cabem aos países da União Europeia na NAFO, onde Portugal tem a maior frota europeia, com 13 navios, e alguns países terceiros não conseguem capturar as quotas que lhes cabem. É o caso dos acordos bilaterais de pescas entre a União Europeia e países terceiros, onde as condições acordadas em termos de exigências comerciais e laborais sobre as embarcações são frequentemente dissuasoras do efectivo aproveitamento dos recursos. É ainda o caso das quotas de bacalhau que a Noruega se comprometeu a ceder enquanto contrapartida pelo acesso ao mercado comunitário, e das quais a Comissão Europeia tem ilegitimamente prescindido no contexto das trocas anuais entre a União e a Noruega, embora os dois assuntos (contrapartidas permanentes e trocas anuais) sejam fundamentalmente distintos – note-se que Portugal é um mercado que importa cerca de 1 milhão de euros por dia em pescado da Noruega.

7) Conseguir lidar com a pressão da indústria da extracção de hidrocarbonetos. Esta consegue frequentemente reservar consideráveis áreas marítimas para as suas operações de prospecção e exploração de gás e petróleo, o que se tem manifestado como um problema cada vez maior na NAFO. É necessário encontrar modelos de gestão e partilha do espaço, compatíveis com as várias utilizações que, com tendência crescente, competirão pelo espaço marítimo.



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