ERC atribui 1,2 milhões de euros a projecto de Joaquim Alves Gaspar
Joaquim Alves Gaspar

O Conselho Europeu de Investigação (ERC, de European Research Council) atribuiu uma bolsa de 1,2 milhões de euros a Joaquim Alves Gaspar para apoiar o projecto de investigação «The Medieval and Early Modern Nautical Chart: Birth, Evolution and Use», que se “propõe desenvolver uma série de questões fundamentais e em aberto na História da Cartografia”, conforme se refere num comunicado da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL).

Com este valor, Joaquim Alves Gaspar, oficial da Armada reformado e membro integrado do Centro Interuniversitário de História das Ciências e da Tecnologia (CIUHCT), vai recrutar uma equipa formada por ele próprio, Henrique Leitão, presidente do Departamento de História e Filosofia das Ciências da FCUL e senior researcher deste projecto, e por quatro investigadores (dois pós-doutorais e dois doutorandos) a selecionar por concurso internacional. Vai ainda recrutar um gestor de projecto, realizar missões ao estrangeiro e adquirir equipamento.

Ao longo de cinco anos, este será o único apoio financeiro do projecto, complementado pelo apoio em equipamento prestado pela FCUL. A bolsa é ainda a primeira atribuída pela ERC a uma investigação na área da História da Cartografia (o projecto concorreu na secção History of the Human Past) e a um projecto da FCUL. É um apoio de um valor “que considero generoso” e vai ao encontro das necessidades do investigador, segundo nos confidenciou o próprio. Em entrevista ao site da FCUL, afirmou que nestas candidaturas a taxa global de aprovação é de 11%.

Na prática, a investigação vai incidir sobre a origem, evolução e utilização das cartas náuticas da época medieval e do período pré-moderno com recurso a técnicas inovadoras, como a análise cartométrica, a modelação numérica e a análise multiespectral das cartas, além dos métodos tradicionais de investigação histórica. Ao nosso jornal, Joaquim Alves Gaspar admitiu que vai analisar dezenas de cartas de ambas as épocas. No caso da época medieval, serão sobretudo italianas e catalãs. No caso do período pré-moderno, interessarão essencialmente cartas portuguesas e espanholas.

A análise cartométrica servirá para conhecer a geometria das cartas, permitindo saber quais eram os processos de construção e o rigor com que eram feitas. A modelação numérica, assente em modelos matemáticos propostos pelo investigador e com base em fontes textuais, incide sobre informações usadas na época, como os rumos, as distâncias e as latitudes, e permite simular a construção das cartas. A análise multiespectral permitirá saber se o pergaminho é um palimpsesto, “saber o que está por baixo da sujidade, se foi usado anteriormente, se tem marcas de uso”, explicou-nos o investigador.

Entre as cartas a analisar, poderão estar os planisférios de Cantino e de Juan de la Cosa, a carta náutica pisana (a mais antiga conhecida) e a carta mais antiga conhecida com linhas de geomagnetismo (desenhada pelo cartógrafo português Luis Teixeira, em 1585). A propósito da importância das cartas náuticas, o investigador admitiu que as que sobreviveram são, sobretudo, mais luxuosas, destinadas a servir como objectos decorativos de personalidades importantes, mas com conteúdos semelhantes aos das originais.

Questionado sobre os motivos das distorções geográficas das cartas náuticas, admitiu-nos que se ficam a dever aos métodos da sua construção, em especial os efeitos da declinação magnética (diferença entre o norte magnético e o norte geográfico do planeta, decorrente do eixo de rotação da Terra), e não à intenção de falsificar a representação geográfica (tese seguida por alguns historiadores, que admitem distorções intencionais para enganar rivais relativamente à localização de certas paragens, mas que o investigador não segue).

Com a sua investigação, Joaquim Alves Gaspar, de 67 anos e com os últimos dez dedicados à investigação, quer “colocar a História de Portugal na linha da frente da investigação histórica internacional”, na linha do que tem sido prosseguido pelo CIUHCT, conforme referiu ao site da FCUL. Embora tenha previsto começar o projecto no início de 2017, admite que procedimentos burocráticos associados possam retardar um pouco esse timing.



Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

«Foi Portugal que deu ao Mar a dimensão que tem hoje.»
António E. Cançado
«Num sentimento de febre de ser para além doutro Oceano»
Fernando Pessoa
Da minha língua vê-se o mar. Da minha língua ouve-se o seu rumor, como da de outros se ouvirá o da floresta ou o silêncio do deserto.
Vergílio Ferreira
Só a alma sabe falar com o mar
Fiama Hasse Pais Brandão
Há mar e mar, há ir e voltar ... e é exactamente no voltar que está o génio.
Paráfrase a Alexandre O’Neill