Num artigo publicado no Expresso, o antigo chefe da EMEPC acredita numa avaliação favorável da ONU sobre as pretensões portuguesas relativamente à extensão da plataforma continental e insta Portugal a conhecer os seus recursos marinhos sob pena de perder terreno para outros países
Aldino Santos de Campos

Um dos principais responsáveis pela proposta de extensão da plataforma continental portuguesa que está em análise nas Nações Unidas acredita num parecer que favoreça as pretensões nacionais, conforme se infere de um extenso artigo que assinou na última edição impressa do jornal Expresso. E desafia o país a conhecer os seus recursos marinhos potenciais para retirar benefícios económicos e estratégicos de uma decisão favorável das Nações Unidas.

Aldino Santos de Campos, que chefiou a Estrutura de Missão para Extensão da Plataforma Continental (EMPEC) entre 2012 e 2016 e desde 2017 integra a Comissão de Limites da Plataforma Continental (CLPC) das Nações Unidas até 2022 (embora sem intervenção directa no processo português), escreve que a proposta nacional actualmente em avaliação por parte desta Comissão deve estar concluída “num futuro próximo, previsivelmente no início da década de 20, com a publicação de recomendações favoráveis sobre a proposta”.

Depois de esclarecer que o que está em causa na proposta é a atribuição de soberania exclusiva “sobre os recursos vivos e não vivos do solo e subsolo contíguo à parte emersa do Estado costeiro, até ao limite exterior da sua plataforma continental” – que Portugal pretende alargar -, Aldino Santos de Campos lembra que essa soberania “não é de cariz territorial”, mas antes “um direito de soberania exclusiva sobre um objecto específico: os recursos existentes no solo e subsolo da plataforma continental”.

No caso português, questionando-se sobre de que recursos e ordem de grandeza estamos a falar, o articulista reconhece que “à data actual, é difícil estimar economicamente o valor desses recursos sem que as actuais reservas inferidas sejam efectivamente demonstradas, através dos métodos prospectivos adequados, para que possam efectivamente ser consideradas reservas económicas e estratégicas”.

Face à importância cada vez maior atribuída aos recursos marinhos num “mundo de dimensão física finita” e considerando o nosso planeta como um sistema fechado em que “toda a superfície terrestre conterá a totalidade dos recursos existentes”, Aldino Santos de Campos recorda que, tal como Portugal, “grande parte dos Estados costeiros já submeteu, ou tenciona submeter, as suas propostas de extensão da plataforma continental além das 200 milhas náuticas”.

A própria União Europeia tem um projecto comum aos (ainda) 28 Estados membros, entre si divididos entre Estados interiores, “Estados costeiros limitados em termos de área marítima, impossibilitados de estender a sua plataforma continental” e os Estados do arco Atlântico. A própria Polónia, país com tradições continentais, submeteu um pedido Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (AIFM) para “prospecção de nódulos polimetálicos numa área de 100 blocos de 10X10 quilómetros quadrados”, situada na “vizinhança imediata da plataforma continental estendida a sul dos Açores”, lembra o articulista. Que não esquece as potências emergentes, como a Rússia ou a China nesta contenda.

Nesse sentido, embora consciente de que “há ainda um longo caminho a percorrer, nomeadamente em virtude das actuais limitações de capacidade tecnológica instalada”, o antigo responsável da EMEPC defende que devemos assumir “o compromisso de conhecer o que é nosso para que o país possa aproveitar os seus recursos marinhos em prol de uma estratégia de afirmação enquanto potência marítima”.

Porque “ao travarmos ou adiarmos este acesso ao conhecimento, estamos a abrir espaço para que outros o façam e se coloquem em posição de vantagem face a Portugal, num campo em que podemos e devemos ser nós a darás cartas”, concluiu Aldino Santos de Campos.

 



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