Óscar Mota e Raquel Varela recordaram a história da LISNAVE numa conferência evocativa dos 50 anos da empresa
Parque Expo'98

“A LISNAVE foi o maior êxito internacional da indústria portuguesa e não acho que isto seja um exagero”, admitiu Óscar Mota, engenheiro naval e antigo administrador dos estaleiros de Viana do Castelo, da LISNAVE e da SETNAVE, entre outros cargos, durante uma recente conferência evocativa dos 50 anos da empresa promovida pela Academia de Marinha.

Óscar Mota recordou que os estaleiros da LISNAVE foram, durante alguns anos, os maiores estaleiros de reparação naval do mundo “e dos mais rentáveis”, mas sobre os quais “desabaram simultaneamente o primeiro choque petrolífero (1973/74) e as perturbações sociais nacionais do pós-25 de Abril”.

Entre alguns factos que recordou à audiência, na qual esteve presente Vasco Manuel de Mello, filho de José Manuel de Mello, o industrial falecido em 2009 e que esteve indissociavelmente ligado à criação da empresa, o engenheiro naval mencionou os 81 navios, 71 dos quais estrangeiros, reparados logo no primeiro ano de existência dos estaleiros, em 1967, e que foram reveladores do seu sucesso imediato.

Lembrou igualmente a opção de não seguir pela via da construção de navios e somente pela reparação, quando a questão se colocou, admitindo que “a LISNAVE deve ter tido uma má experiência” e acrescentando ter assistido à subsidiarização à construção naval, “algo que não fazia sentido porque a maioria dos recursos ia logo para a importação” do enorme volume de material necessário. “Pelo que a decisão de não construir foi a mais correcta”, admitiu.

A outra interveniente foi a historiadora do trabalho Raquel Varela, professora universitária e investigadora com trabalho publicado, que estudou as relações laborais na LISNAVE no âmbito de uma análise ao trabalho na indústria naval, do pós-guerra aos nossos dias. Na ocasião, fez uma dissertação sobre a história social da empresa, assumido que “para compreender as relações laborais em Portugal é preciso saber o que aconteceu na LISNAVE”.

A investigadora identificou a LISNAVE com “um projecto falhado das classes dominantes portuguesas” que quis impulsionar o desenvolvimento do país com recurso às então colónias e ao trabalho barato que tal proporcionava e ao progresso tecnológico. Um projecto que devia ligar a LISNAVE, Angola e Sines e que não viria a vingar, não só por causa do processo de descolonização, mas também devido à reestruturação produtiva que o país conheceu depois de 1974.

Uma reconversão que direccionou apoios estatais até então indirectamente concedidos a este tipo de indústria, referiu a investigadora, já não para a reparação naval, mas para o sector financeiro, as novas privatizações do final dos anos 1980 e início da década seguinte e a indústria automóvel. Raquel Varela considerou igualmente que “o argumento de que não temos indústria naval por causa da concorrência da Ásia esconde outra realidade substancial que é nos termos indústrias onde o Estado decide que vamos ter indústria”.

 



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