Em carta à APSS e IMT, comunicada à Comunidade Portuária de Setúbal, a ministra do Mar apela à resolução das disfunções no porto de Setúbal relacionadas com a precaridade laboral dos estivadores. Ambas as entidades admitiram ao nosso jornal que seguem as orientações da tutela. Entretanto, o SEAL revelou um navio com destino ao porto de Setúbal não mencionado na JUP II, mas que segundo a APSS já estará com a escala inserida naquele sistema
Sindicato dos Estivadores e da Actividade Logística

A ministra do Mar terá escrito uma carta ao Instituto da Mobilidade e Transportes (IMT) e à Administração dos Portos de Setúbal e Sesimbra (APSS) pressionando estas entidades a corrigirem as disfunções  verificadas no porto de Setúbal, aludindo à paralisação laboral dos estivadores naquele porto. A ambas a ministra diz que devem “de forma coordenada e urgente, avaliar a situação existente e implementar e propor, quer à tutela quer a outras entidades competentes, medidas de correcção das disfunções identificadas”.

A notícia foi ontem revelada pela TSF, que terá tido acesso ao documento, e pela Rádio Renascença (que menciona o acesso da agência LUSA a carta). Um documento que desde logo foi citado por vários meios de comunicação e do qual terá sido dado conhecimento à Comunidade Portuária de Setúbal, refere a Rádio Renascença.

Nessa carta, diz a Rádio Renascença, Ana Paula Vitorino dirige-se ao IMT, “na qualidade de entidade responsável pelo licenciamento das empresas de trabalho portuário”, sugerindo que “deve proceder a uma avaliação contínua do bom e regular funcionamento das empresas de trabalho portuário, verificando se a todo o momento estão reunidos os requisitos de actividade de que depende o licenciamento destas empresas, sob pena de caducidade do mesmo, propondo, se for caso disso, a alteração dos requisitos a aplicar”.

A ministra do Mar dirigiu-se também à APSS, recordando que “sempre que a administração portuária entender que não está a ser garantido, a todos os momentos, o escrupuloso cumprimento da legislação laboral aplicável deverá comunicar os factos às autoridades competentes, nomeadamente à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT)”, conforme citação da carta feita pela Rádio Renascença.

Todavia, depois de algum tempo sem tomar posição directa sobre o conflito laboral, cuja resolução tem remetido para as empresas de trabalho portuário e para os trabalhadores da estiva, Ana Paula Vitorino aproveita a carta para lembrar o peso constitucional do direito à greve, da liberdade sindical, do direito ao trabalho e do direito à liberdade de filiação sindical, que o Sindicato dos Estivadores e da Actividade Logística (SEAL) tem acusado as empresas de violar em conluio com a própria ministra do Mar.

E, numa procura de equilíbrio que alguns meios de comunicação classificam de aproximação à posição dos estivadores, a ministra do Mar defende “alterações na estrutura das relações de trabalho existentes no porto de Setúbal, entre os empregadores portuários e os trabalhadores que constituem o contingente de mão-de-obra, que contemple a redução da precariedade e que ao mesmo tempo permita a sustentabilidade económica das empresas”.

Ana Paula Vitorino defende ainda “a redução do número de trabalhadores precários actualmente existentes nas empresas que operam no porto de Setúbal, o que só será possível com recurso à negociação e ao fim de todas as situações que impliquem a paragem da actividade, seja no período normal de trabalho ou no recurso ao trabalho suplementar”, segundo a carta citada pela Rádio Renascença.

Ou seja, à semelhança do SEAL, Ana Paula Vitorino defende alterações a uma situação com anos de existência, que é a da precaridade da maioria dos estivadores que trabalham no porto de Setúbal, e valoriza o direito à greve à liberdade de filiação sindical, mas considera que tais alterações devem considerar a sustentabilidade económica das empresas e dependerão sempre de negociações que, tal como reclama a Operestiva, a empresa de trabalho portuário de Setúbal, só poderão decorrer num contexto sem paralisação laboral.

Sobre este assunto, procurámos uma reacção da APSS, que nos esclareceu que “recebeu a carta da Sra. Ministra do Mar, e está em consonância com todas as orientações aí produzidas”.

E de acordo com o entendimento da APSS, essas orientações são comunicar às autoridades competentes, designadamente à ACT, sempre que “a administração portuária entender que não está a ser garantido, a todos os momentos, o escrupuloso cumprimento da legislação laboral aplicável”, manter, juntamente com o IMT, “as condições necessárias para garantir o regular funcionamento do Porto de Setúbal sem que este regular funcionamento ponha em causa direitos e deveres elementares” e “garantir as condições logísticas e operacionais para assegurar que possa ser concretizado em condições e de segurança, devendo ainda promover a protecção de instalações e cargas em depósito”, tal como é referido na carta da ministra do Mar.

Fizemos o mesmo junto do IMT, que nos esclareceu que “tem vindo a desenvolver as suas obrigações referentes às Empresas de Trabalho Portuário (ETPs), designadamente ao dimensionamento da bolsa de trabalhadores temporários das ETPs que operam no Porto de Setúbal” e que “está a implementar as orientações da carta da Senhora Ministra do Mar, de 19 de Novembro, conjuntamente com a APSS, no quadro de uma avaliação contínua do bom e regular funcionamento das empresas de trabalho portuário”.

Quem reagiu à carta da ministra foi o SEAL, em comunicação publicada no seu blogue «O Estivador», com conhecimento dado ao Primeiro Ministro, à ministra do Mar, ao ministro do Trabalho e Segurança Social, ao ministro da Economia e aos grupos YILPORT, ETE e SOUSA.

Nessa reacção, o SEAL saúda as declarações da ministra do Mar, “quando diz que está ao lado dos estivadores precários de Setúbal”, e exorta Ana Paula Vitorino a ser “coerente com essa posição já amanhã, estando presente na portaria do terminal RoRo do porto de Setúbal, onde alguns patrões se preparam para utilizar mercenários precários que terão contratado para substituir os estivadores eventuais de décadas, que a senhora Ministra afirma agora defender”. Uma referência à presença na operação de embarque de 2 mil veículos da Autoeuropa prevista para amanhã, naquele porto, num navio ro-ro que vem de Espanha.

O SEAL sugere também à ministra do Mar que “se afaste da posição do patronato portuário, nomeadamente no coro que lhes faz de só aceitar mediar as negociações caso o SEAL levante a sua greve às horas extraordinárias, confundindo o plano do protesto dos eventuais de Setúbal com a greve nacional do SEAL”.

Embora admita estar pronto para ir para mesa de negociações relativamente ao porto de Setúbal “sem quaisquer condições, não obstante o quadro de agressões aos trabalhadores que se tem vindo a avolumar”, o SEAL  mantém válidas as condições apresentadas em 27 de Setembro à ministra do Mar para “suspender o pré-aviso de greve ao trabalho suplementar, o único que actualmente se encontra em vigor”, numa alusão a situações que considera existirem noutros portos do país.

 

Um navio fantasma?

 

Entretanto, na Terça-feira, o SEAL, no seu blogue «O Estivador», dava conta de que estaria prevista “a chegada de um navio Ro-Ro, de transporte de veículos automóveis, na próxima Quinta-feira, a partir das 06h, ao porto de Setúbal”, facto que a APSS estaria a omitir. No blogue, o SEAL procura demonstrar a sua posição com a reprodução de um documento de posicionamento do navio Paglia (Marine Traffic) e de outro, da JUP II (Janela Única Portuária) da APSS, que não refere a escala do navio no porto de Setúbal.

A este propósito, o SEAL refere que “se todos os estivadores precários do porto de Setúbal estão indisponíveis para trabalhar, conforme têm reiteradamente afirmado, somos obrigados a presumir que alguém estará mais interessado em contratar escravos alternativos do que em debater as razões do conflito e negociar as formas de o ultrapassar”.

O nosso jornal confrontou a APSS com a informação avançada pelo SEAL. Em resposta ao nosso pedido, a APSS esclareceu-nos ontem à tarde que “a inserção da escala dos navios na JUP é feita pelo respectivo agente de navegação” e que naquele momento (inferimos que cerca das 16H17 de ontem, hora a que recebemos a resposta), estava “anunciada na JUP II a escala do navio PAGLIA (Navigomes), com ETA 22/ às 06:00h”.

Ontem à noite, a SIC Notícias dava conta de que o navio, que vem de Espanha, traz cerca de mil carros a bordo e que tentará embarcar mais veículos da Autoeuropa no porto de Setúbal até ao limite da sua capacidade, que é de 3 mil. Trata-se de uma operação de 16 horas de duração, referia a estação televisiva, adiantando que os estivadores deverão tentar impedi-la. A notícia referia ainda que estava previsto o reforço dos efectivos policiais da PSP, porventura, para assegurar a realização da operação

 



Um comentário em “APSS e IMT admitem sintonia com a ministra do Mar”

  1. ORLANDO TEMES DE OLIVEIRA diz:

    Boa…. Temos a Srª Ministra sempre atenta aos problemas…..

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