Previsão de investimento, segundo António Sarmento, presidente da Direcção da Wavec
Wavec

É já daqui a dois dias que começa mais um seminário da Wavec Offshore Renewables, a associação privada sem fins lucrativos lançada por António Sarmento em 2003 para promover as energias renováveis oceânicas, e que decorre dias 26 e 27 de Outubro, em Lisboa.

Dedicado ao tema «O Azul e as Renováveis Amanhã, a Aposta no Crescimento Através da Colaboração entre Finlândia e Portugal», o evento visa discutir as estratégias da economia azul e as tecnologias susceptíveis de gerarem sinergias entre as empresas dedicadas às energias renováveis marinhas e outros sectores.

Este ano, é organizado com o apoio da Embaixada da Finlândia em Lisboa, o Centro de Tecnologia de Máquinas de Turku, a Tekes (Agência de Financiamento de Inovação da Finlândia) e o Ministério Finlandês da Economia e do Emprego, e constituirá uma oportunidade para identificar “propostas concretas de colaboração entre empresas e entidades finlandesas e portuguesas”, conforme anunciou a Wavec.

Segundo António Sarmento, fundador e presidente da Direcção da Wavec, a presença da Finlândia neste seminário justifica-se não só pela actividade do país no âmbito das energias renováveis marinhas, mas também pela ligação que tem com Portugal nessa matéria. Há uma empresa que tem testado a sua tecnologia em Portugal desde há anos”, refere António Sarmento a propósito da AW-Energy Oy e da sua tecnologia WaveRoller, que representou um investimento aproximado de 20 milhões de euros.

 

Inovações são mais indústria do que energia

 

O seminário servirá igualmente para António Sarmento partilhar com a audiência e a opinião pública em geral, uma ideia relativa à política energética. Para o fundador da Wavec, existe um equívoco, que não é exclusivo de Portugal, e que consiste em “pensar que o desenvolvimento das tecnologias energéticas deve ser um processo chefiado, defendido e apoiado pelos responsáveis pela energia”.

Sem deixar de reconhecer o papel que os responsáveis pela política energética devem ter no seu desenvolvimento, António Sarmento preferiria que o processo fosse coordenado dentro de um quadro económico e industrial. De acordo este responsável, as inovações no sector da energia, designadamente, nas renováveis marinhas, “são desenvolvimentos tecnológicos e com carácter económico e é essa componente, mais do que a energética, que pode gerar retorno a mais curto prazo”.

António Sarmento sustenta a sua tese no facto de “toda a tecnologia desenvolvida neste domínio poder ter uma aplicação directa e indirecta noutros sectores, como a aquicultura, as pescas, entre outros” e não apenas na energia.

Desta forma, poderíamos criar “uma cadeia de fornecimento com uma tecnologia que está a ser desenvolvida, com potencial para mais valor acrescentado, capacidade para empregar mais gente e mais qualificada, capacidade para subir mais alto na cadeia de fornecimento e maior capacidade de exportação”, refere, concluindo que “essencialmente, estamos a falar de política industrial e não tanto de política energética a curto prazo”.

Para o presidente da Direcção da Wavec, “hoje, o preço que pagamos pela energia resulta de decisões tomadas há 10 anos e as decisões que tomarmos hoje relativas à energia terão impacto daqui outros 10; mas terão que ser tomadas considerando o mercado daqui a 10 anos”. E para a realidade actual não exclui responsabilidades do sistema energético, ou seja, da política energética seguida.

António Sarmento considera que “temos um défice tarifário excessivamente alto porque não houve a percepção de que estas tecnologias têm uma componente que, numa fase inicial, é essencialmente industrial”. “Estivemos a sobrecarregar demasiado o sub-sistema de energia eléctrica”, afirma, adiantando que “se não compreendermos isto, não vamos ter capacidade de atrair investimento nesta área para Portugal porque não conseguimos colocar em cima da mesa os apoios públicos necessários”.

 

1.250 milhões até 2030 para termos uma indústria

 

E quais são as necessidades financeiras do sector? Falando das energias renováveis marinhas, com pouca expressão em termos de produção para o mercado, António Sarmento recorda que, desde 2000, os projectos foram objecto de investimentos da ordem dos 147 milhões de euros, dos quais 17 milhões foram investimento público nacional e 47 milhões foram gastos em Portugal.

Em relação ao futuro, António Sarmento prevê que até 2020 sejam realizados investimentos de 170 milhões de euros, “se os projectos do Windfloat Atlantico e do WaveRoller forem concretizados – e só isso dá 160 milhões”. No caso do Windfloat Atlântico, está previsto um parque de 125 megawatts, em Viana do Castelo, “e só isso serão cerca de 145 milhões de euros”. No caso do WaveRoller, serão 20 milhões de euros. E para além disto, talvez “mais 10 milhões de euros de investimento noutros projectos”, refere.

E se quisermos desenvolver “uma indústria apoiada nesta área, até 2030 teremos necessidade de atrair cerca de 1.250 milhões de euros de financiamento”, maioritariamente privado. Este é o “valor necessário para colocar no mar 400 megawatts até 2030”, admite o fundador da Wavec. “Não digo que tenhamos necessidade de colocar isso, mas é a ordem de grandeza que precisamos se queremos ter aqui uma indústria que possa ser exportadora”, acrescenta. “É um cenário em que devemos pensar”, afirma.

“Não acho que seja idílico pensar nisto, mas é desafiador, porque obriga a ter capacidade de atrair investimento e de remunerar a energia acima do valor de mercado, por tarifário ou por fundos estruturais”, admite António Sarmento. “Até que as empresas ganhem dinheiro com isto vai demorar muito tempo e têm o risco do investimento que fazem, que tem duas componentes, a tecnológica e a de mercado”, considera.

Um dos riscos de mercado admitido resulta do papel que pode vir a ter a energia solar fotovoltaica. “Está em valores muito baixos, sobretudo em países equatoriais, e pode competir com as energias renováveis marinhas”, refere. No entanto, acredita que face ao desenvolvimento da economia do mar, existe uma boa oportunidade para estas últimas. “Pode vir a ser mais barato produzir energia no mar do que transportá-la de terra para o mar”, reconhece.

Se a energia fotovoltaica esmagar este mercado, entre as empresas de energias renováveis marinhas, “o investimento perde-se”, refere António Sarmento. “Já para as empresas da cadeia de valor, o investimento não se perde, ou não se perde tanto”, acrescenta. Se não esmagar, existem melhores condições para as energias renováveis evoluírem em termos de indústria.

Outra condição importante que se deve verificar para que os 1.250 milhões de euros possam gerar uma indústria é a própria tecnologia, desde que evolua “suficientemente bem em termos de fiabilidade”.



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